Em meio ao imbróglio envolvendo a aquisição de viaturas blindadas de uma empresa de Israel, o Exército ainda evita dar a licitação como descartada e espera obter o aval do governo brasileiro para concluir o processo.
Os estudos sobre a troca dos blindados brasileiros começaram em 2017. O modelo atual é de uma tecnologia da Segunda Guerra Mundial e chegou ao país na década de 1970. Em 2022, foi lançada uma pesquisa de mercado, e em agosto de 2023 saiu o edital para a renovação da frota. No final de abril deste ano, foi anunciado que a empresa israelense Elbit Systems ficou na primeira colocação do certame – companhias da República Tcheca, França e China ficaram nas classificações seguintes.
Deu-se, então, uma ofensiva capitaneada por Celso Amorim, ex-ministro das Relações Exteriores que, como assessor especial da Presidência, é uma espécie de guru de Lula em questões diplomáticas. Com o recrudescimento da guerra entre Israel e o Hamas, condenada pelo governo brasileiro por ter deixado milhares de civis mortos, a ordem dada no fim de agosto foi para que o negócio não seguisse adiante. A licitação prevê a compra de 36 blindados, a um custo total de 1 bilhão de reais.
Durante um discurso num evento com empresários no início do mês, o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, reclamou do veto e afirmou que há “ranços ideológicos” que afetam as Forças Armadas. “A questão diplomática interfere na Defesa. Houve agora uma concorrência, uma licitação, venceram os judeus, o povo de Israel. Mas por questão da guerra, do Hamas, (…), por questões ideológicas nós não podemos aprovar”, disse.
Processo sigiloso e oferta ‘agressiva’
Apesar da trava imposta pelo governo federal, militares deram sequência até a última instância da licitação. Um oficial que acompanha as tratativas de perto disse que o impasse é algo “paralelo” e que, internamente, o trabalho segue para a concretização da compra.
No início de outubro o Comando de Logística do Exército encaminhou toda a documentação – centenas de milhares de páginas – para o Estado Maior, que é o responsável por dar a assinatura final ao ato. A expectativa é que a análise seja concluída em novembro. “Dando ok, não há porque não assinar”, afirma esse militar.
O Exército se debruçou sobre mais de 300 critérios das quatro empresas finalistas – cada um deles é analisado por um grupo de especialistas, e tem de ser avalizado por um acordo entre todos. Como o processo é sigiloso, incluindo as cláusulas contratuais das empresas, as reuniões mantiveram os militares isolados e proibidos de ingressar nas salas com celular, relógio digital, tablet ou computador.
Os negociadores afirmaram que a proposta da empresa israelense foi a mais “agressiva”. A companhia, dizem, ofereceu armamentos secundários – uma metralhadora para a defesa da viatura – como uma espécie de “brinde”, baixou o preço e o prazo de entrega, concordou em enviar dois blindados para serem feitos testes por seis meses antes do pagamento e em instalar fábricas para que parte da produção se dê em solo nacional.
Por ordem do Planalto, porém, a compra ainda não poderá ser chancelada. O Ministério da Defesa chegou a fazer uma consulta ao Tribunal de Contas da União (TCU) questionando se poderia, então, dar andamento à segunda empresa colocada, que é da República Tcheca. A resposta foi negativa.