Mais de uma década depois de ter sido condenado por Sergio Moro, um doleiro preso e sentenciado no escândalo do Banestado quer pegar carona na atual má fase do ex-magistrado e na sucessão de mensagens de procuradores da Lava-Jato que levaram o Supremo Tribunal Federal (STF) a reduzir a pó os processos contra o ex-presidente Lula para ter o mesmo benefício, anular seu passivo judicial e derrubar até a delação premiada que fechou com o ex-juiz de Curitiba. Famoso, antes de figurar nas páginas policiais, por namorar modelos e atrizes, Hélio Laniado apresentou ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), em Porto Alegre, um pedido de revisão criminal, tipo de ação que tenta anular uma condenação definitiva sob a alegação de que fatos novos mostrariam que ela foi ilegal e injusta.
Os fatos novos listados por Laniado na ação judicial, a que VEJA teve acesso, são supostos indícios de que Moro e o ex-procurador Deltan Dallagnol o perseguiram no caso Banestado, prejudicaram suas chances de defesa e, após a delação, preferiram destinar a maior parte dos valores a serem pagos na colaboração premiada para os cofres dos Estados Unidos, e não para o Brasil. O doleiro utiliza as mensagens reveladas pelo The Intercept Brasil, que com veículos como VEJA analisaram milhares de diálogos que mostraram que Moro e a extinta força-tarefa da Lava-Jato atuaram com parcialidade contra alvos no petrolão, para afirmar que desde o Banestado o então juiz e os procuradores perseguiam réus e atuavam “ativamente” e “em conluio” para condenar de antemão os investigados.
Laniado foi acusado pelo Ministério Público, do lado de três operadores do mercado financeiro, de ter movimentado mais de 1 bilhão de dólares em contas bancárias mantidas no exterior e sem controle por autoridades públicas. Ele foi preso em 2005 na República Tcheca, fechou delação premiada e depois de ter cumprido pena de quatro anos e pagado cerca de 7 milhões de reais de multa, quer agora que a Justiça anule o seu caso – incluindo a delação – sob o argumento de que Sergio Moro não agiu com imparcialidade ao julgar seu caso.
A principal tese da defesa do doleiro é a de que Moro e os procuradores do MP, entre eles Dallagnol, agiram deliberadamente para beneficiar os Estados Unidos com a maior parte dos valores a serem pagos pelo delator por nutrirem uma suposta relação de amizade com autoridades como o então procurador americano Adam Kaufmann. Embora o acordo de colaboração de Laniado previsse que, como delator, ele deveria atuar para repatriar ao Brasil todos os recursos alvos de investigação, o MP brasileiro teria barrado, na versão dos advogados de Laniado, o envio integral do dinheiro de volta ao Brasil, preferindo ficar com apenas um terço dos valores. “Existia um evidente interesse dos procuradores brasileiros e do ex-juiz Sergio Fernando Moro em favorecer os cofres públicos norte-americanos. As autoridades brasileiras renunciaram a valores mantidos no exterior, em detrimento inclusive da República Federativa”, diz trecho do recurso do doleiro ao TRF4.
A VEJA, Moro disse que o caso de Laniado é o de “mais um condenado por crimes de colarinho branco que inventa uma história mirabolante para escapar da Justiça”. Em nota, Dallagnol afirmou que não participou da investigação, elaboração da denúncia, prisão e acordo de colaboração e que só entrou no caso após a dissolução da força-tarefa Banestado. “A notícia da revisão criminal representa mais um episódio que é fruto de um sistema de Justiça ineficaz na luta contra a corrupção e a lavagem de dinheiro no Brasil. Delatores que confessaram seus crimes querem anular acordos e recuperar o dinheiro que devolveram aos cofres públicos diante da impunidade dos demais criminosos que decidiram não cooperar”, declarou o ex-procurador.