Como Renan Calheiros planeja substituir o Centrão de Lira no governo Lula
Senador articula bloco para favorecer governabilidade ao presidente eleito e critica tramitação de PEC por entender que ela fortalece barganhas
Um dos parlamentares mais próximos do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, o senador Renan Calheiros (MDB-AL) trabalha na construção de uma frente de partidos que possa dar sustentação política ao governo sem a necessidade de apelar ao Centrão, capitaneado por seu inimigo político Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara. Segundo os planos de Renan, um grupo que reúna MDB, União Brasil e PSD, além das siglas que se aliaram à campanha de Lula, pode fazer frente ao grupo de Lira, a começar pelas eleições ao comando do Legislativo, em fevereiro. Renan falou a VEJA por telefone na noite desta terça-feira, 8, véspera da reunião entre o presidente eleito e Lira, em Brasília, na qual Lula sinalizou apoio à tramitação da PEC da Transição. O emedebista critica a medida por fortalecer exatamente o poder de barganha do Centrão e do presidente da Câmara junto ao novo governo. Leia abaixo:
Há como o novo governo fugir da influência do Centrão capitaneado por Arthur Lira? Apresentamos a setores do PT e conversamos entre algumas pessoas a possibilidade de fazer um bloco do MDB com União Brasil e constituir uma frente ampla no Senado que largaria com 51 senadores e, na Câmara, 312 deputados. Uma frente com conteúdo programático, institucional, diferente dessa relação do Centrão com Bolsonaro. Seria uma oportunidade para mostrar algo diferente, mais contemporâneo. Isso isolaria, nesse primeiro momento, esses setores que flertaram com o fascismo. É uma coisa que não tem sentido, na semana seguinte à eleição, fazer uma PEC, entregar a Arthur Lira.
Essa alternativa política é viável? Essa coisa da sustentação política é complexa, muitas vezes você não tem uma força alternativa para substituir outra. Mas isso não é uma mera substituição, é um formato de governabilidade com fundamento político, programático, que envolveria o MDB e o União Brasil e esses outros partidos que já estão próximos do PT, já estiveram na campanha. Poderia caber ao PSD indicar o presidente do Senado, não haveria problema algum. Estamos querendo colaborar com essa concertação. E poderia caber a alguns desses outros partidos o candidato à presidência da Câmara, viabilíssimo com uma frente a sustentar sua candidatura.
Há chance de o PT apoiar a reeleição de Arthur Lira? Acho que há dissidências, provavelmente há setores do PT que querem isso. A convergência maior é da turma que se beneficia do orçamento secreto. Isso não pode continuar, não precisa o Supremo acabar, a Câmara acabar, o governo acabar. Acabado está, porque é inconstitucional.
Em relação à PEC da Transição, ela favorece o Centrão? Coube a mim mostrar que não é caminho único a PEC, pelo contrário. Nenhum argumento era favorável à priorização da PEC. Nada justificava, a não ser aqueles argumentos do Ciro Nogueira, de que a PEC deixaria o Congresso como acessório do Tribunal de Contas, o fim do mundo. Por que essa pressa? Lula vai tomar posse em janeiro, tem que resolver isso agora? Isso deve ter algum outro interesse político embutido na questão. Claro que favorece, porque PEC tem uma tramitação diferenciada. É uma coisa mais complicada e delicada.
Defensores da PEC dizem que uma Medida Provisória traria menos segurança jurídica. Pelo contrário, por isso a consulta ao TCU. O TCU já autorizou a mesma coisa em várias circunstâncias. Os argumentos em defesa da PEC foram deixando de existir. Você pode escolher a PEC, é realmente um caminho, coube a nós mostrar que tinha alternativa.
Haveria alguma outra alternativa fora PEC e MP? Precisa refazer o orçamento, o orçamento hoje é uma ruína. Muitas coisas serão resolvidas no orçamento com suplementação de recursos, na lógica da proposta que foi enviada ao Congresso. Não precisa ser tudo resolvido como PEC ou Medida Provisória. Só tem uma argumentação sustentável nisso: precisamos ajudar o Centrão a negociar alguma coisa na PEC para garantir a tramitação e negociar a reeleição do comando da Casa.