O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) retomou na tarde desta quarta-feira, 28, a análise de uma ação da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o indulto de Natal concedido pelo presidente Michel Temer (MDB) em dezembro de 2017. Entre os pontos do decreto de Temer, que teve seu alcance limitado pelo ministro Luís Roberto Barroso em março, os ministros avaliam se condenados por corrupção e crimes contra a administração pública podem estar entre os beneficiados pelo indulto. Com os votos de apenas dois ministros, o relator, Barroso, e Alexandre de Moraes, o placar está em 1 a 1. A sessão foi suspensa e será retomada nesta quinta-feira, 29.
O indulto editado pelo presidente abrange condenados a até doze anos de prisão e que, até 25 de dezembro de 2016, tivessem cumprido um quinto da pena, desde que não fossem reincidentes. Antes, para os crimes cometidos sem grave ameaça ou violência, era preciso cumprir um quarto da pena no caso dos que não eram reincidentes.
Primeiro a votar na sessão desta quarta-feira, Luís Roberto Barroso defendeu que sejam excluídos do benefício crimes de corrupção ativa, corrupção passiva, concussão, peculato, tráfico de influência, os praticados contra o sistema financeiro nacional, os previstos na Lei de Licitações, os crimes de lavagem de dinheiro e ocultação de bens, os previstos na Lei de Organizações Criminosas e a associação criminosa – todos figuram entre as principais acusações envolvendo políticos.
Em seu voto, ele afirmou que o indulto só pode ser justificado a partir do descongestionamento das penitenciárias e por seu caráter humanitário. Para o ministro, condenados por corrupção não se encaixam em nenhuma das prerrogativas.
“[O indulto a corruptos] não tem nenhum impacto relevante no encarceramento porque o número de pessoas presas por corrupção é mínimo, bem abaixo de 1%, e evidentemente não tem caráter humanitário perdoar a pena abstratamente de um tipo de crime praticado que não tem qualquer relação com qualquer benemerência com aqueles cuja condição pessoal justifica o abrandamento da pena”, afirmou.
Para Barroso, “beneficiar corruptos, corruptores e peculatários com o cumprimento de prazo brevíssimo da pena, 20% apenas, o que em algum casos é percentual menor que a propina recebida, é clara afronta ao mandamento constitucional. Não se trata de moralismo, mas de um mínimo senso comum ético”.
O ministro declarou ainda que “a corrupção é um crime violento praticado por gente perigosa” e que a leniência com este delito fez do Brasil “um país feio e desonesto”.
“É um equívoco supor que não seja assim. Mata na fila do SUS, na falta de leitos, nas estradas que não têm manutenção. A corrupção destrói vidas que não são educadas adequadamente por deficiências nas escolas. O fato de o corrupto não ver nos olhos a vítima que ele produz não o torna menos perigoso. A crença de que a corrupção não é um crime grave e violento e que os corruptos não são perigosos nos trouxe até aqui, a esse quadro sombrio em que recessão, corrupção e criminalidade elevadíssima nos atrasam na história e nos retém como um país de renda média, que não consegue furar o cerco”, disse ele.
Luís Roberto Barroso também considera que o indulto não deve se aplicar às penas de multa em processos de corrupção. “Indultar a pena de multa de pessoas que desviaram milhões não tem fins humanitários”, disse.
O segundo a votar foi Alexandre de Moraes, que foi ministro da Justiça do governo Temer entre maio de 2016 e fevereiro de 2017. Ele discordou da posição de Barroso por considerar que o indulto é ato privativo do presidente da República e argumentou que, como o decreto de Temer está dentro das “opções constitucionalmente previstas”, não cabe ao STF “reescrevê-lo”. Conforme a Constituição, só não podem ser indultados crimes hediondos, de terrorismo, de tortura e tráfico de drogas.
“Não compete ao STF reescrever o decreto de indulto, pois ou o presidente da República extrapolou o limite de sua competência constitucional ou o presidente, mesmo não que o STF não concorde, atendeu às exigências constitucionais e não podemos nós substituir uma opção válida por outra que nos parece mais constitucional, mais justa”, disse Moraes.
O ministro citou o indulto de Natal de 2016, que teve sua participação como ministro da Justiça, e lembrou que, naquela ocasião, excluiu condenados por crimes de corrupção e contra a administração pública entre os beneficiados. Alexandre de Moraes disse que essa é a “melhor opção” para ele, mas que ele não foi nem é presidente.
“Não importa se é esse presidente da República, não importa por mais graves que sejam as acusações contra esse presidente, não é possível enfraquecer a instituição Presidência da República. Ao entrar com a ação, o Ministério público se autoconcede o que quer negar ao presidente da República, que é a possibilidade de transação penal sem a participação do Judiciário”, afirmou.
O ministro afirmou que se ficasse comprovado desvio de finalidade no indulto de Michel Temer, isto é, que o presidente quis beneficiar diretamente alguém, caberia revisão pelo STF. Ele citou, no entanto, que a própria PGR, autora da ação contra o decreto, não fala nessa possibilidade.
Moraes ainda disse que “não é verdade” que 21 presos da Operação Lava Jato seriam beneficiados pela manutenção do indulto natalino, conforme declarou o procurador Deltan Dellagnol, coordenador da força-tarefa do Ministério Público Federal (MPF) no Paraná.
Após o voto de Alexandre de Moraes, o presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, suspendeu a sessão, que será retomada amanhã com o voto do ministro Edson Fachin. Além dele e de Toffoli, votarão Rosa Weber, Cármen Lúcia, Luiz Fux, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello e Celso de Mello. Gilmar, Lewandowski, Marco Aurélio e Mello demonstraram que seguirão a posição de Moraes.