O ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal (STF) Celso de Mello disse a VEJA nesta terça-feira, 7, que os discursos do presidente Jair Bolsonaro em Brasília e São Paulo “revelam a triste figura e a distorcida mente autocrática de um político medíocre e sem noção dos limites éticos e constitucionais que devem pautar a conduta de um verdadeiro chefe de Estado que seja capaz de respeitar o dogma fundamental da separação de poderes”. Bolsonaro disse nesta tarde na Avenida Paulista que não vai mais admitir interferências do STF e a realização de eleições sem a adoção do voto impresso, ainda que a medida tenha sido barrada pela Câmara dos Deputados. O presidente ainda ameaçou desrespeitar decisões do ministro Alexandre de Moraes, que se tornou a principal pedra no sapato do presidente na Corte.
“Na realidade, Bolsonaro é um político que não está, como jamais esteve, à altura do cargo que exerce, pois lhe faltam estatura presidencial e senso de estadista! Com esses discursos ofensivos e transgressores da autonomia institucional do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal, incompatíveis com os padrões mais elevados da Constituição democrática que nos rege, Bolsonaro degradou-se, ainda mais, em sua condição política de Presidente da República e despojou-se de toda respeitabilidade que imaginava possuir”, acrescentou o ex-decano do STF.
Procurado por VEJA para comentar as manifestações beligerantes do presidente neste Sete de Setembro, Celso de Mello afirmou que a conduta de Bolsonaro “revela a figura sombria de um governante que não se envergonha de desrespeitar e vilipendiar o sentido essencial das instituições da República”.
“É preciso repelir, por isso mesmo, os ensaios autocráticos e os gestos e impulsos de subversão da institucionalidade praticados por aqueles que exercem o poder! Há que se ter sempre presente a grave advertência do saudoso e eminente Ministro Aliomar Baleeiro, do Supremo Tribunal Federal, em manifestação que recordava ao nosso País que, enquanto houver cidadãos dispostos a submeter-se e a curvar-se ao arbítrio e à prepotência do poder , sempre haverá vocação de ditadores”, frisou Celso de Mello.
“Daí a significativa e vital importância do Poder Judiciário cujos magistrados saberão agir com independência e liberdade decisória, dispensando tutela efetiva aos direitos básicos da cidadania ! A resposta do povo brasileiro aos discursos deste Sete de Setembro de 2021, indignos da importância da data nacional que celebramos , só pode ser uma: as tentações autoritárias e as práticas governamentais abusivas que degradam e deslegitimam o sentido democrático das instituições e a sacralidade da Constituição traduzem justa razão para a cidadania , valendo-se dos meios legítimos proporcionados pela Constituição da República, insurgir-se , por intermédio dos Poderes Legislativo e Judiciário, contra os excessos governamentais e o arbítrio dos governantes indignos”, completou.
No dia 29 deste mês, o plenário do Supremo vai decidir se mantém ou não a decisão de Celso de Mello que obrigou que o presidente prestasse depoimento presencial no âmbito do inquérito que investiga a interferência indevida do mandatário na Polícia Federal. Com a aposentadoria de Celso, o caso foi redistribuído para Alexandre de Moraes. O processo é um dos casos que mais atormentam o chefe do Executivo, ao lado do inquérito das fake news e da investigação que se debruça sobre as ameaças ao regime democrático feitas pela estridente militância digital bolsonarista.