Dez anos depois das alegações finais da acusação e da defesa, o ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu, individualmente, arquivar a ação em que a Procuradoria-Geral da República (PGR) pedia a condenação do deputado federal Flaviano Melo (MDB-AC) pela acusação de desvio de dinheiro público.
A decisão do ministro relator, tomada na sexta-feira (13), e publicada na noite desta terça-feira (17), apontou que não havia “justa causa” para a continuidade do processo. Segundo o ministro, faltavam elementos mínimos para comprovar que o acusado tenha cometido o crime atribuído.
Ainda cabe recurso da PGR, que ainda não foi notificada da decisão. A procuradora-geral, Raquel Dodge, havia pedido em dezembro passado prioridade para julgamento alertando risco de o processo atingir a prescrição – marco temporal a partir do qual o acusado já não pode ser punido.
A acusação é de que o deputado federal participou, com funcionários do Banco de Brasil, de um esquema de gestão fraudulenta para desviar recursos públicos quando era governador do Acre, entre 1988 e 1990. O caso chegou ao Supremo em 2007, depois de ele tomar posse no primeiro dos três mandatos consecutivos na Câmara dos Deputados.
Procurado na segunda-feira, 16, o advogado de Flaviano Melo, César Augusto Baptista de Carvalho disse que não tinha conhecimento da decisão. Questionado nesta terça-feira pela reportagem sobre o motivo de ter levado dez anos para tomar a decisão, o ministro Celso de Mello não respondeu e indicou a leitura das trinta páginas do documento que assinou na sexta-feira.
Decisão
O ministro argumenta em sua decisão que a denúncia não aponta individualmente qual teria sido a conduta criminosa individual do réu no processo e que o simples fato de que ele era governador não justifica a abertura de ação penal. Além disso, afirmou que a acusação não mostra uma relação causa e efeito entre a conduta atribuída a Flaviano Melo e o resultado dela decorrente.
Celso de Mello afirmou, ainda, que a jurisprudência do Supremo permite ao ministro relator arquivar uma ação penal nessas circunstâncias. “As razões ora invocadas autorizam, desde logo, a extinção deste procedimento penal, quer em face da inépcia da denúncia, quer em razão da ausência de justa causa, configurada esta, preponderantemente, pela insuficiência de dados reveladores da autoria dos fatos delituosos cuja prática foi atribuída ao ora acusado”, concluiu o ministro.
Raquel Dodge, que havia alertado em dezembro de 2017 a proximidade da prescrição, ainda deverá se manifestar sobre a decisão do ministro relator, podendo recorrer ou concordar com o arquivamento. Nos anos em que o processo esteve sob a relatoria de Celso de Mello, três procuradores-gerais da República pediram de prioridade de julgamento – Roberto Gurgel, em 2010, e Rodrigo Janot, em 2013, além de Raquel Dodge, agora.
Janot já havia apontado risco de prescrição, e a atual procuradora-geral destacou, em 4 de dezembro de 2017, que “a prescrição da pretensão punitiva estatal é iminente, mesmo ao se considerar a pena máxima em abstrato prevista para os delitos imputados (12 anos). Sobressai, assim, a necessidade de julgamento da ação penal ora em trâmite nesta Corte”.
Após o pedido de prioridade e o alerta de prescrição enviados por Raquel Dodge, o gabinete do ministro informou, em 12 de dezembro de 2017, que Celso de Mello estava “concluindo a revisão do relatório, já elaborado, devendo liberá-lo nos próximos dias”.
Segundo o gabinete, o julgamento final do processo deveria ocorrer “no máximo em março de 2018” e “inexiste, no caso, risco de prescrição penal, que somente ocorrerá no final de junho de 2018”.
Na semana passada, o gabinete afirmou que “o relatório da AP 435 está sendo liberado para o revisor”. Afirmou também que “o prazo prescricional encontra-se rigorosamente observado e o julgamento ocorrerá dentro do prazo da lei, sem qualquer possibilidade de incidência de prescrição penal”.
Lava Jato
No âmbito da Lava Jato, Celso de Mello é o ministro revisor dos processos no Supremo Tribunal Federal contra políticos com foro privilegiado, com a atribuição de analisar o voto do ministro relator, Edson Fachin, antes de cada caso poder ser liberado para julgamento.
Celso de Mello recebeu no início de fevereiro as duas primeiras ações penais liberadas por Fachin: contra a senadora e presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann (PR), e contra o deputado federal Nelson Meurer (PP-PR). Na semana passada, o gabinete de Celso de Mello disse que o caso do deputado deve ser liberado “nos próximos dias”. Até o fechamento dessa matéria, isso não havia ocorrido.