O Tribunal de Justiça da União Europeia definiu nesta quarta-feira, 29, que os governos de todos os 27 Estados membros do bloco podem proibir seus funcionários públicos de usarem símbolos religiosos, como o hijab, véu islâmico que cobre a cabeça.
O objetivo da decisão é impor um “ambiente administrativo totalmente neutro”, segundo a corte, ao sublinhar que as restrições ao vestuário devem ser aplicadas igualmente a todos, independentemente da crença religiosa.
“Tal regra não é discriminatória se for aplicada de forma geral e indiscriminada a todos os funcionários da administração, e se limitar ao estritamente necessário”, afirmou o comunicado do tribunal.
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O caso em questão
A corte tomou a decisão em conexão ao caso de uma funcionária pública muçulmana no município de Ans, no leste da Bélgica, que foi proibida por seus superiores de usar o hijab no trabalho. Documentos judiciais indicaram que sua função envolvia pouco contato com o público.
A funcionária prestou uma queixa a um tribunal local, alegando que foi vítima de preconceito e que o seu direito à liberdade religiosa foi infringido. Ela também apresentou várias fotografias de colegas de trabalho usando, por exemplo, brincos com pingente de cruz, ou festas de Natal no escritório, como prova de que ela só teria sido visada porque era muçulmana.
O tribunal inferior observou que, embora “sinais discretos” de crença religiosa fossem “tolerados”, “sinais evidentes” de convicção religiosa poderiam ser proibidos. Então, o caso parou no Tribunal de Justiça da União Europeia.
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Controvérsia
A notícia da decisão, apesar de frisar a proibição “indiscriminada” de símbolos religiosos, gerou preocupações em alguns setores. A Femyso, uma rede pan-europeia que representa mais de 30 organizações muçulmanas, afirmou que o parecer do tribunal tem potencial para infringir a liberdade de religião e de expressão.
“Apesar de serem disfarçadas pela neutralidade, as proibições de símbolos religiosos invariavelmente visam o lenço de cabeça [hijab]”, disse a organização, citando um artigo de 2022 da Open Society Foundations que argumentava que os banimentos se baseiam em discursos islamofóbicos.
“As mulheres muçulmanas já enfrentam discriminação interseccional por múltiplos motivos, e tal decisão corre o risco de legitimar a sua remoção da vida pública”, completou o comunicado.
A organização humanitária Human Rights Watch, principal crítica da decisão, afirmou que a corte se baseou na lógica errada.
“As mulheres muçulmanas não deveriam ter de escolher entre a sua fé e os seus empregos”, disse uma porta-voz da ONG, Hillary Margolis. “As objeções de um cliente a funcionários que usam trajes religiosos não deveriam vir acima dos direitos dos funcionários”.
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Em 2021, o mesmo tribunal definiu que empresas do setor privado podem limitar a expressão de crenças religiosas, políticas ou filosóficas quando houvesse “necessidade genuína” de “apresentar uma imagem neutra perante os clientes ou de prevenir disputas sociais”. Um ano depois, a corte afirmou que essas proibições não constituem “discriminação direta”, desde que sejam aplicadas igualmente a todos os funcionários.