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Terror em 2018: ataques jihadistas no Ocidente caíram com derrota do EI

Cresce a preocupação com o terror da extrema direita, fomentado pelo populismo, desigualdade e insatisfação com as elites e instituições

Por Julia Braun Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 20 dez 2018, 09h04 - Publicado em 20 dez 2018, 08h00

No último dia 12, um homem armado invadiu o mercado de Natal de Estrasburgo, na França,  atirando contra os visitantes enquanto gritava a frase “Allahu Akbar” (Alá é o Maior, em árabe). Radicalizado na prisão, esse francês de 29 anos matou cinco pessoas, feriu outras 10 feridas e deixou o país consternado.

Ataques terroristas como o de Estrasburgo, planejados por simpatizantes de grupos radicais na Europa, foram menos registrados 2018 do que em anos anteriores. Marcado pela consolidação da derrota do Estado Islâmico (EI) no Iraque e na Síria, o ano que chega ao fim dá um pequeno sinal de otimismo na luta contra o terrorismo global, segundo especialistas consultados por VEJA.

Os jihadistas do Exército Islâmico têm se mostrado cada vez mais fracos para encomendar ataques e até para seduzir e radicalizar indivíduos mundo afora. A impressão geral é que, consequentemente, o número de atentados, principalmente no Ocidente, caiu em relação aos últimos anos.

Porém, ainda que os atos de terror patrocinados pelo Exército Islâmico tenham diminuído, a violência promovida pelos extremistas ainda causa medo e deixa muitas vítimas.

“Não é um cenário ruim”, diz Alex Wilner, professor especializado em Terrorismo da Universidade Carleton, de Ottawa, no Canadá. “Ainda há muita violência. Mas houve, em 2018, uma diminuição no terrorismo jihadista globalmente, quando comparado aos últimos anos”.

A queda no número de ataques patrocinados por grupos terroristas já é uma tendência observada desde o ano passado. Em 2017, segundo dados do Departamento de Estado americano, houve uma redução de 23% em relação ao total de atentados registrado em 2016. O número de vítimas também caiu 27,1%na mesma comparação.

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A diminuição no terrorismo islâmico observada nos últimos anos é consequência direta da derrota parcial do Exército Islâmico em seus principais redutos. Uma queda semelhante foi observada em 2011 e 2012 e atribuída por especialistas, entre outros fatores, à perda de força da Al Qaeda após a morte de seu líder máximo, Osama Bin Laden.

Por mais que ataques organizados por grupos ou simpatizantes de organizações extremistas islâmicas tenham sido menos frequentes na Europa e nos Estados Unidos em 2018, atentados sofisticados, usando homens-bomba e atiradores, ainda deixam muitos mortos no Oriente.

“Há menos ataques jihadistas, mas eles ainda são muito fatais”, afirma Wilner. “A vasta maioria dos atentados letais acontece no Oriente Médio e em parte do norte da África”.

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Derrota do EI

No final de 2017, o governo do Iraque anunciou sua vitória militar sobre o grupo terrorista. Em 2018, os jihadistas também perderam o controle de seu último reduto na Síria, a aldeia de Tlul al Safa, entre Damasco e a província de Suwayda.

Sírios participam do funeral de uma das vítimas dos ataques suicidas reivindicados pelo Estado Islâmico no sul de Suwayda – 26/07/2018 (Sana/AFP)

Apesar de as lideranças locais falarem em derrota total do Estado Islâmico nas duas nações, os terroristas ainda possuem recrutas que realizam ataques bastante violentos no Oriente Médio e incursões para retomar alguns de seus antigos territórios. O atentado de 25 de julho, que deixou ao menos 258 mortos em vilarejos da região de Suwayda, foi o  mais fatal do ano.

Ainda assim, a organização, que cresceu entre 2014 e 2015, tem cada vez menos força para patrocinar, encomendar ou motivar atentados internacionais.

“O Exército Islâmico é uma sombra do que costumava ser”, afirma Max Abrahms, professor da Universidade Northeastern e estudioso do tema. “Não controla quase nenhum território, e o número total de seus membros foi reduzido para uma pequena fração do que já foi”.

Para o especialista, o poder estratégico do Estado Islâmico foi superestimado ao longo dos últimos anos. Em seu livro, “Rules for Rebels: The Science of Victory in Militant History” (“Regras para os rebeldes: A ciência da vitória na história militante”, em tradução livre para o português), Abrahms afirma que o grupo pecou ao escolher civis como os principais alvos de seus atentados.

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Dessa forma, o Exército Islâmico atraiu grande antipatia dos cidadãos sírios e iraquianos, assim como da comunidade internacional, que ampliou seus esforços para derrotá-los. Para o professor, a tendência dos terroristas se gabarem de seus feitos nas redes sociais e fazer muita propaganda sobre suas intenções também aumentou a urgência das maiores potências mundiais em destruí-los.

“A propaganda do Exército Islâmico diminuiu muito, enquanto grupos mais moderados, que se expõem menos, estão crescendo”, afirma Abrahms, para quem a tendência é de os atentados promovidos ou motivados pelo grupo jihadista no Ocidente diminuírem ainda mais daqui para a frente.

Para especialistas, a queda no número de ataques também pode estar diretamente relacionada a uma melhoria nos esquemas de  segurança e nos esforços de contraterrorismo de alguns dos países alvos, principalmente dos Estados Unidos e dos europeus.

“A segurança em aeroportos melhorou de forma dramática, e a tecnologia de drones permite que ataques contra líderes militantes possam ser feitas com precisão nunca antes imaginada”, diz o professor da Universidade Northeastern.

Afeganistão

Entre os dez atentados terroristas que deixaram mais vítimas em 2018, seis aconteceram no Afeganistão, segundo levantamento feito por VEJA. A reportagem levou em conta a definição de terrorismo usada pela maioria dos especialistas, que consideram como ato de terror qualquer ataque, com objetivos políticos, realizado por um ator não estatal contra um alvo civil.

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Desde a invasão americana no país, em 2001, o Afeganistão nunca esteve tão inseguro. O Talibã controla atualmente mais parcelas de seu território do que em qualquer momento desde que foi expulso do poder, há 17 anos.

Seus ataques têm se tornado maiores, mais fatais e atingem cada vez mais áreas da nação. Uma das principais razões para isso é que o governo afegão, que agora administra a segurança do país de forma independente, é fraco e conta com parcos recursos militares e de inteligência.

Apesar de ainda receberem apoio das tropas da missão conjunta da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) e dos Estados Unidos, as forças de segurança locais são claramente mais débeis do que o Talibã em algumas partes do país.

O grupo terrorista também tem grande apoio no país e um longo histórico de relacionamento com o afegão comum. Além disso, o Afeganistão viu sua produção de ópio crescer 88% em 2017, e a droga é uma das principais fontes de renda da organização.

“O Talibã é muito mais do que uma organização terrorista. Ele representa uma grande parte da nação ,em termos de língua, planos e religião”, afirma Alex Wilner, da Universidade Carleton.

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O aumento da violência também está relacionado ao crescimento da presença do Estado Islâmico no país. O grupo muitas vezes disputa poder com os talibãs e ocupa as mesmas áreas, adicionando mais tensão ao cenário já hostil do Afeganistão.

Extrema-direita

Enquanto o mundo parece estar mais preparado para lidar com as ameaças do terrorismo islâmico, cresce o medo em relação à ascensão de grupos de extrema direita, principalmente nos Estados Unidos e na Europa.

No final de outubro, um homem de 46 anos ingressou em uma sinagoga em Pittsburgh, no estado americano da Pensilvânia, atirou contra os fiéis e matou 11 pessoas. Robert Bowers, o atirador, está sendo processado pela Justiça dos Estados Unidos  por uso de arma de fogo e crime de ódio – ele fizera uma série de declarações antissemitas antes de iniciar o ataque e mesmo depois de ser preso.

Poucos dias antes, um republicano fanático fora preso por enviar 12 pacotes-bomba para proeminentes figuras do Partido Democrata e outros apoiadores da legenda pelo correio. Cesar Sayoc Jr., de 56 anos, já tinha ficha criminal, inclusive por ameaçar cometer um atentado “pior do que o 11 de setembro” contra uma companhia de eletricidade na Flórida.

Nos Estados Unidos, foram registradas cinco ocorrências envolvendo a extrema direita entre 2007 e 2011. O número cresceu para 14, em 2012, e continuou estável até 2016. Mas saltou para 31 ataques em 2017. Em 2018, a prisão de terroristas de vertentes conservadoras pelo FBI também cresceu, segundo a imprensa americana.

A Europol, agência de inteligência da União Europeia, registrou quase o dobro de prisões de terroristas de extrema direita em 2017, quando comparado a anos anteriores.

Alemães protestam contra estrangeiros em Chemnitz, Alemanha – 27/08/2018 (Jan Woitas/AFP)

A tendência, segundo especialistas, está sendo motivada pelos enormes fluxos de imigrantes que chegam ao continente. Mas essa mudança também é fomentada por uma mistura perigosa de política populista, desigualdade econômica-social e insatisfação com as elites e instituições liberais.

Em agosto, centenas de cidadãos de extrema-direita saíram às ruas da cidade de Chemnitz, no leste da Alemanha, para “caçar imigrantes” e vingar a morte de um cidadão alemão de origem cubana que fora esfaqueado supostamente por um sírio e um iraquiano durante confronto.

A marcha neonazista de 6.000 pessoas foi considerada como um dos piores episódios de violência da extrema-direita em décadas na Alemanha e disparou mais uma vez o alerta mundial para o crescimento da hostilidade e da força desses grupos.

Os ataques comandados pelos terroristas da extrema direita, segundo Alex Wilner, são normalmente organizados pelos chamados “lobos solitários” – homens e mulheres que se radicalizaram e agem por conta própria. Na maioria das vezes, os extremistas usam armas de fogo ou provocam incêndios contra seus alvos.

Os grupos organizados costumam agir de forma doméstica e, pelo que se sabe até agora, raramente coordenam ataques internacionais. Ainda assim, grupos xenofóbicos, antissemitas, racistas e de outras vertentes estão se proliferando nas redes sociais e se tornando mais poderosos e sofisticados nas ruas, segundo analistas.

“Os movimentos de extrema-direita estão crescendo e eu não vejo esse tipo de extremismo e violência diminuindo tão cedo”, prevê Max Abrahms, da Universidade Northeastern.

E 2019?

É difícil fazer previsões quando se trata de terrorismo. Mas especialistas acreditam que, ao contrário da crescente violência de extrema direita, o número de ataques terroristas islâmicos tende a cair em 2019, pelo menos enquanto o Estado Islâmico se mantiver debilitado.

A superioridade dos governos do Iraque e da Síria frente aos jihadistas e a capacidade deles de consolidar suas vitórias, contudo, preocupam. A dificuldade desses Estados em manter a infraestrutura dos países funcionando, de incentivar a geração de empregos e de cessar a violência geral pode levar a um novo ressurgimento do próprio Estado Islâmico e de outros grupos.

Ao mesmo tempo, o crescimento do uso de tecnologias avançadas pelos extremistas pode tornar as batalhas no Oriente Médio ainda mais difíceis e perigosas. “Os terroristas estão aprendendo com as mudanças de tática das forças internacionais e aplicando-as em seu favor”, diz Wilner.

Já há registros do aumento de atentados com drones por grupos militantes na Síria e no Iraque. A Al Qaeda e o Estado Islâmico também se valem desses mecanismos há pelo menos uma década, além das armas químicas, em seus ataques.

O uso das novas táticas pode, portanto, dificultar os esforços do contraterrorismo mundial, principalmente nos redutos dos terroristas no Oriente Médio e na África.

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