De segunda a segunda, o labirinto de corredores que compõem a Cidade Velha, epicentro de Jerusalém, fervilha de comerciantes, turistas e peregrinos – muçulmanos, cristãos e judeus – que ali chegam para visitar os pontos sagrados da metrópole milenar.
Porém passados 48 dias desde os atentados cometidos pelo Hamas contra Israel, em 7 de outubro, e a subsequente guerra contra a Faixa de Gaza, a Cidade Sagrada encontra-se vazia e sob a sombra de ataques terroristas.
O último deles, ocorrido em 16 de novembro num posto de controle em Jerusalém Oriental, de maioria palestina, resultou na morte de três terroristas e deixou oito policiais feridos.
Ao longo da semana, reportagem de VEJA percorreu as principais pontos de interesse da cidade, e encontrou todos eles vazios e sob forte vigília.
Os turistas das três religiões sumiram não só de Jerusalém como também de toda Israel, impactando gravemente a economia.
Mas é na Cidade Sagrada que os impactos são sentidos mais fortemente.
A tensão entre palestinos e judeus é palpável e pode ser sentida no rosto tenso dos poucos moradores que se aventuram a circular pelos corredores da Cidade Velha.
“Os acontecimentos de 7 de outubro foram pavorosos”, afirmou Omar Basam, enfermeiro morador da cidade. “Não me parece uma rodada habitual de escaramuças, como acontece de tempos em tempos. Essa é uma guerra existencial”, acrescentou.
A intrincada parte antiga de Jerusalém é dividida em quatro bairros, cada um com uma religião dominante – judeu, armeno, muçulmano e cristão.
Barbeiro no Bairro Muçulmano, Muhammad Abu é um dos poucos que mantém as portas abertas desde os atentados.
Localizado na quadra entre o Portão de Herodes e o Portão de Damasco, seu salão está às moscas. Resta, então, passar o dia interagindo com amigos pelas redes sociais.
“Desde os atentados, a polícia faz batidas o tempo inteiro. Se alguém está fora de casa depois das 18 horas, eles mandam entrar”, diz.
Há também postos de controle em cada entrada do Bairro Muçulmano, onde quatro policiais fortemente armados checam a identidade de cada pedestre enquanto revistam bolsos e mochilas.
No Bairro Armeno, comerciantes avisam que não vão conseguir se manter por muito tempo caso a situação perdure.
“Nas últimas semanas, tudo ficou deserto. Nós, comerciantes, passamos o dia sentados, à espera de alguém”, diz o armêno Ragop Sevam.
“Nós, os armenos, ficamos no meio desses dois lados da guerra. Fico devastado pelo que está acontecendo em Gaza. Mas também tenho muitos amigos em Israel e sofro muito por eles”, diz Sevam.
Os árabes cristãos de Jerusalém também vivem momentos de angústia com o conflito, principalmente com a aproximação do Natal, quando cristãos do mundo inteiro se dirigem à região.
Ranna (ela preferiu não dar o sobrenome), proprietária de uma loja próxima ao Portão de Jaffa, uma das oito entradas da muralha que cerca a Cidade Velha, afirma que vários estabelecimentos vizinhos faliram desde 7 de outubro.
“E muitos amigos que trabalham em hoteis de Jerusalém já foram demitidos”, lamenta ela, que afirma nunca ter passado por uma crise tão forte.
Principal via de comercial de Jerusalém Oriental, a rua Salah al-Din também viu os muitos pedestres que ali fazem suas compras sumirem.
A razão é simples: em 6 de novembro, um ataque terrorista resultou na morte a facadas da policial Rose Elisheva, de origem americana, em frente à delegacia em que trabalhava.
Ainda que esteja sob máxima tensão e tenha enfrentado dois atentados terroristas desde 7 de outubro, Jerusalém não assistiu a nenhuma demonstração ou protesto violento, como costuma acontecer quando a situação esquenta nessa esquina do globo.
Primeiro porque o patrulhamento ostentivo reprime qualquer ato publico, mesmo antes dele começar. É o que acontece às sextas-feiras, quando seguidores da fé islâmica se reúnem para rezar na Mesquita Al-Aqsa. A entrada ali, porém, está proibida desde o início da guerra.
Em segundo lugar, há intensa mobilização de entidades civis e de políticos.
Logo após os ataques do Hamas, o prefeito de Jerusalém, Moshe Lion, instou os rabinos a denunciar o assédio que trabalhadores árabes estavam sofrendo na cidade como uma violação da Torá, o livro sagrado judeu.
Lion também logo endereçou as reclamações de que os serviços de limpeza e manutenção estavam sendo negligenciados devido ao medo de violência contra funcionários municipais.
Até aqui, Jerusalém pôde evitar uma conflagração maior. Só não se sabe até quando.