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Racismo ainda é obstáculo para conquista de direitos civis nos EUA

Legado de Martin Luther King não foi suficiente para que o país superasse a desigualdade racial e social e as injustiças no sistema judicial

Por Julia Braun Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 4 abr 2018, 14h00

O legado de Martin Luther King ainda permanece vivo para a maioria dos americanos. Porém, 50 anos após seu assassinato, suas palavras ainda são incômodas e mais relevantes do que nunca em um país – e mundo – que permanece extremamente dividido por questões raciais e sociais.

King condenava três grandes males americanos: o racismo, o militarismo e a exploração econômica. Sua receita para a mudança incluía uma “redistribuição radical do poder econômico e político” para promover a justiça racial e social.

Mas os Estados Unidos ainda estão longe de superar esses obstáculos. Após dois governos de Barack Obama, o primeiro presidente negro do país, a eleição de Donald Trump e a aplicação de suas políticas conservadoras, anti-imigração e de cunho militar representaram para muitos um retrocesso em muitas dessas questões.

“As estatísticas vêm nos mostrando como os afro-americanos ainda vivem em constante desigualdade quando se trata de saúde, segurança e educação, além de em desvantagem em oportunidades econômicas”, diz Alejandra Y. Castillo, CEO da YWCA USA, organização que luta contra o racismo e o machismo no país. “Mesmo 50 anos após a luta de Martin Luther King por direitos civis e econômicos, essa discussão ainda é de extrema importância não só para os negros, mas para todo o país. ”

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Um estudo recente do Census Bureau americano mostra que a desvantagem em relação a oportunidades econômicas no país é tão grande, que mesmo meninos negros nascidos em famílias ricas e nos bairros americanos mais desenvolvidos ainda recebem salários mais baixos e tendem a ter condições socioeconômicas piores em sua vida adulta.

A discussão sobre o racismo no país ganhou força nos últimos anos em razão do crescimento de movimentos e protestos contra violência policial, encarceramento em massa da população negra e a constante descriminação institucional e estrutural do governo e sociedade americana.

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“Houve um grande progresso na direção da igualdade racial nos Estados Unidos desde 1968”, afirma Esmeralda Simmons, diretora executiva do Centro para a Lei e Justiça Social, em Nova York. Porém, segundo a ativista, os direitos civis que foram tão dificilmente conquistados durante 300 anos de resistência e pelos movimentos das décadas de 50 e 60 foram reduzidos durante as últimas décadas.

A anulação em 2013 de parte do Ato de Direitos do Voto, aprovado em 1965 graças aos esforços de Luther King, tem prejudicado o acesso às urnas. A legislação estipulava que Estados com históricos de discriminação racial eram obrigados a submeter à aprovação federal qualquer mudança em suas regras eleitoral.

Em quase metade do país, estão em vigor novas leis que exigem a apresentação de documento com foto no dia da eleição, o que cria obstáculos para negros e pobres votarem. Os pleitos também não acontecem no domingo, como no Brasil, mas em dias de trabalho normal. Quem quiser votar, tem que conciliar a ida aos postos de votação com o emprego.

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A realidade para as mulheres negras é ainda mais difícil, já que são desproporcionalmente afetadas tanto pelo racismo como pela desigualdade de gênero. Uma mulher afro-americana hoje, por exemplo, tem 3 ou vezes mais chances de morrer por complicações na gravidez ou no parto do que uma branca, segundo a YWCA USA.

Violência policial e encarceramento

O recente assassinato do jovem negro Stephon Clark – que foi baleado oito vezes pela polícia de Sacramento, Califórnia, enquanto estava no quintal da casa de sua avó – e o fracasso dos promotores estaduais e federais em condenar Baton Rouge, policial de Louisiana que em 2016 matou Alton Sterling mesmo após imobilizá-lo no chão, evidenciam a brutalidade policial nos bairros de comunidades negras.

O caso de Clark foi o mais recente de uma série de mortes de homens negros pela polícia, que provocaram protestos por todo os Estados Unidos e alimentaram um debate nacional sobre preconceitos no sistema de justiça e sobre a crença americana que conecta raça e criminalidade.

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“Há essa ideia equivocada de que as comunidades negras são particularmente perigosas e que mais policiais são necessários nessas regiões. Quando há mais policiamento é inevitável haver mais prisões, mais conflitos”, diz Vincent Southerland, diretor executivo do Centro para Raça, Desigualdade e Lei da Universidade de Nova York.

Segundo a entidade Sentencing Project, que defende mudanças no sistema criminal americano, de forma geral, homens negros têm seis vezes mais chances de serem presos do que os brancos. Os afro-americanos são apenas 13% da população americana, porém de acordo com o Departamento de Justiça, representam 37% da população carcerária.

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Sandra Sterling, tia de Alton Sterling, lamenta durante enterro de seu sobrinho em Baton Rouge, Lousiana, nos Estados Unidos
Sandra Sterling, tia de Alton Sterling, lamenta durante enterro em Lousiana- 15/07/2016 (Jonathan Bachman/Reuters)

Histórico racista e de luta

Para muitos especialistas, os Estados Unidos nasceram racistas, devido ao seu passado escravagista.

“O racismo e escravidão eram aspectos centrais da cultura americana quando este país foi formado em 1776”, diz Esmeralda Simmons. “E continuam a desempenhar um papel importante em todas as esferas de nossa sociedade e da vida de nossos cidadãos. ”

“Quando as ideias racistas foram disseminadas para apoiar o sistema de desigualdade e escravidão, elas ganharam vida própria e cresceram a partir daí”, afirma o ativista Vincent Southerland.

A descriminação estrutural e apoiada pelas grandes instituições do país impulsiona o crescimento de movimentos racistas e de supremacia branca. O episódio registrado em Charlottesville, na Virgínia, em agosto do ano passado, quando manifestantes racistas e antirracistas se enfrentaram, deixando três mortos e dezenas de feridos, é consequência direta dessa disseminação.

Se Martin Luther King pudesse observar os Estados Unidos de hoje, com certeza reconheceria o progresso conquistado em matéria de direitos civis pelo país, como a legalização do casamento homossexual e a eleição de um presidente negro. Porém, estaria certo de que é preciso continuar pressionando e de que ainda há muito para avançar.

“Se King ainda estivesse vivo, veria que o caminho pela frente ainda é longo e tortuoso”, diz Alejandra Castillo, da YWCA USA. “O processo para erradicar e eliminar o racismo é contínuo, por isso devemos permanecer lutando.”

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