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Por que a Constituinte convocada por Maduro é antidemocrática?

O anúncio afasta ainda mais a Venezuela de uma saída negociada para a profunda crise política, social e econômica

Por Nathalia Watkins e Julia Braun
Atualizado em 2 Maio 2017, 21h10 - Publicado em 2 Maio 2017, 16h46

O presidente da Venezuela Nicolás Maduro convocou na segunda-feira uma Assembleia Nacional Constituinte composta pela classe trabalhadora e pelas comunas socialistas. O anúncio foi o prelúdio de uma ação que deve reduzir ainda mais os poderes do Legislativo venezuelano e pode, potencialmente, atrasar ou anular as próximas eleições.

A opinião é compartilhada por Jorge Rosell, ex-juiz da Suprema Corte de Justiça na Venezuela. O magistrado se aposentou antes do tempo, em 2000, depois de convocada a Assembleia Constituinte de 1999 pelo então presidente Hugo Chávez. “Pelo caminho obscuro que a Justiça tomava, soube que não poderia fazer parte”, disse a VEJA nesta terça-feira.

Não à toa, o presidente da Assembleia Nacional, Julio Borges, afirmou nesta terça-feira que o anúncio de Maduro representa a “aniquilação” da democracia. “Se trata de uma Constituinte para matar a Constituição”, disse.

Entenda por que a iniciativa do presidente Nicolás Maduro é  um golpe para a democracia da Venezuela:

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Uma constituinte comunal e trabalhadora não está prevista na Constituição

Os artigos 347, 348 e 349 da atual Carta Magna não preveem uma Constituinte comunal ou trabalhadora, como defendeu Maduro. A lei venezuelana somente se refere a uma Assembleia Nacional Constituinte e diz que  “o povo da Venezuela é o depositário do poder constituinte original”.

A defesa da vontade popular foi o argumento genérico usado pelo presidente para burlar a Constituição que seu mentor, Hugo Chávez, reescreveu.

“O presidente pode pedir ao Conselho Nacional Eleitoral que convoque um referendo para decidir se o povo quer ou não uma Constituinte. Todo o resto é abuso de autoridade por parte do Executivo”, diz Rosell. Ao determinar quem seriam os votantes, Maduro liquida com o voto universal, o que tampouco está previsto na Carta Magna.

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Os 500 constituintes não serão eleitos de forma universal e secreta

A determinação sobre os constituintes eleitos tampouco compete ao Executivo. Segundo Maduro, os 500 constituintes não serão eleitos de forma universal e secreta. Em uma flagrante violação à Constituição, Maduro disse que os representantes serão escolhidos de forma indireta, tal como ocorreu em regimes autoritários como da ex-União Soviética e de Cuba.

Segundo o presidente, 250 dos participantes da Constituinte serão escolhidos por grupos setoriais específicos, como pensionistas, trabalhadores, camponeses, jovens e indígenas, favoráveis ao governo. Os outros 250 serão elegidos “em um sistema por territórios com caráter municipal, local”. Neste cenário, aumentam os mecanismos de controle do governo sobre a população, como a manipulação dos benefícios sociais, por exemplo.

A dita Assembleia não seria “popular”, portanto. Pelo contrário, será formada por setores específicos da população, o que viola o princípio do voto universal

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A Constituinte pode limitar ainda mais os poderes do Legislativo

A Constituinte terá interesse especial em reformar o funcionamento e as atribuições do Parlamento, segundo o que disse o próprio presidente: “Precisamos transformar o Estado, principalmente essa Assembleia Nacional podre”, afirmou Maduro durante seu discurso de segunda.

Além disso, o presidente advertiu que a Assembleia Nacional não poderá se opor as decisões tomadas dentro da Assembleia Constituinte. “Querem diálogo? Poder Constituinte! Querem eleições? Poder Constituinte!”, provocou Maduro.

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Ainda não se sabe se haverá referendo

O presidente tem o poder de convocar a Assembleia Nacional Constituinte, assim como Assembleia Nacional. Mas, é necessário realizar um referendo sobre a iniciativa antes de aprová-la.

Todos os cidadãos devem participar desta consulta popular. Porém, até agora, Maduro não tocou no assunto nem fez qualquer menção a uma votação para aprovar a realização da Constituinte.

O comando da Assembleia respaldará o governo

O Conselho Nacional Eleitoral (CNE) é quem deve estabelecer os fundamentos e bases da Constituinte, e não o Executivo. Apesar disso, Maduro  nomeou o ex-deputado e ex-vice-presidente oficialista Elías Jaua como líder desta Assembleia Nacional. Caso o presidente cumpra o Artigo 347 e o Conselho Nacional Eleitoral  (CNE) comande o processo futuramente, a imparcialidade da Assembleia também deve ser prejudicada, já que o órgão é tomado por chavistas.

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Pode atrasar ou acabar com as eleições

A Constituinte pode provocar um atraso ainda maior das eleições regionais que estavam marcadas para dezembro de 2016 e adiar as eleições municipais previstas para o final deste ano. Além disso, como é CNE quem deve comandar o processo, as eleições presidenciais de 2018 também podem ser adiadas, ou até mesmo canceladas, dependendo das decisões tomadas na Assembleia.

“O presidente quer atrasar todo o calendário eleitoral, que já está com as eleições para governadores atrasadas. Maduro quer evitar as eleições para prefeitos e, possivelmente, as presidenciais de 2018. Os chavistas estão desesperados e, por isso, apelam para todo tipo de descalabro”, diz o ex-juiz.

Ainda não sabemos as verdadeiras intenções de Maduro

Além de diminuir o poder do Legislativo e cancelar as próximas eleições, a Constituinte pode assegurar muitos outros poderes ao poder Executivo e, portanto, a Nicolás Maduro. Ainda não sabemos as verdadeiras intenções do presidente com a Assembleia, mas ele poderia atribuir a si mesmo poder de abolir outras instituições políticas do país ou de controlar os outros poderes.

Há rumores de que ele possa usar a nova Carta Magna para perpetuar-se no poder ou mesmo para livrar-se de problemas jurídicos que lhe dirão respeito, uma vez que deixe o poder.

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