Parlamento cubano aprova nova Constituição que reconhece mercado
O projeto será submetido a referendo em 24 de fevereiro
O Parlamento cubano aprovou neste sábado, 22, o projeto consensual de uma nova Constituição, que reconhece o papel do mercado e da propriedade privada, sem renunciar ao comunismo como meta, e que será submetido a referendo em fevereiro.
O novo texto constitucional foi aprovado por unanimidade em uma sessão ordinária da Assembleia Nacional fechada à imprensa internacional, na presença do presidente Miguel Díaz-Canel e de seu antecessor, Raúl Castro, segundo edição on-line do jornal oficial Granma.
“Esta Constituição é uma expressão genuína do caráter democrático e participativo do nosso povo porque nasce dele, reúne seus sentimentos”, disse o secretário do Conselho de Estado, Homero Acosta, ao destacar o trabalho de consenso realizado pela comissão redatora.
Na sexta-feira, durante uma longa jornada, os parlamentares receberam uma explicação sobre as mudanças estratégicas, mas “sem retrocessos”, introduzidas ao texto original, após um processo de discussão popular, realizado entre agosto e novembro, com quase 9 milhões de pessoas.
O projeto será submetido a referendo em 24 de fevereiro.
Destino comunista
O texto restitui o comunismo como meta da sociedade cubana – o mesmo tinha sido eliminado no projeto inicial -, e o Partido Comunista de Cuba (PCC) como “força política” dirigente, que “orienta os esforços comuns na construção do socialismo e no avanço para a sociedade comunista”.
Esta restituição irritou a oposição, que começou a convocar a “um maciço e sonoro NÃO” para “fazer fracassar” a nova Constituição.
“Dizer que ‘só no socialismo e no comunismo o ser humano alcança sua dignidade plena’ é uma ofensa à inteligência e uma total cegueira aos 60 anos” da revolução, destacou a dissidente União Patriótica de Cuba (Unpacu), em texto.
Mercado e propriedade privada
Mais de 591.000 cubanos trabalham por “conta própria”, o que representa 13% da força de trabalho. O projeto estabelece as bases para integrar diferentes atores econômicos, ao reconhecer o papel do mercado na economia socialista e a propriedade privada, assim como o investimento externo, como elementos complementares para o desenvolvimento do país.
Trata-se de um modelo “autóctone”, no qual o Estado socialista mantém “as rédeas da economia”, disse Acosta.
Em uma sociedade até agora igualitária, a nova Constituição permitirá a geração de riqueza privada, que será regulamentada mediante um rígido sistema fiscal, mas evitará mediante leis a concentração da propriedade.
Cuba está aberta a abrigar milionários, sobretudo a partir da assinatura recente de um acordo que permite aos jogadores de beisebol cubanos que moram fora da ilha firmarem contratos com as Grandes Ligas dos Estados Unidos pela primeira vez em 60 anos.
Solução salomônica
Quanto ao tema do casamento entre pessoas de mesmo sexo, ao qual o projeto original abria o caminho, e que se deparou com o repúdio da população, a comissão de redação encontrou uma fórmula salomônica.
Agora reformulado no artigo 82 (antes era o 68), o texto reconhece o casamento “como uma instituição social e jurídica” e não como “a união entre duas pessoas”, que substituiria o termo vigente “entre um homem e uma mulher”.
Esta fórmula “dá resposta a todos”, afirmou Acosta.
Para a deputada Mariela Castro, filha de Raúl Castro e principal promotora da iniciativa a favor das minorias sexuais, “não há retrocessos”, pois a nova escrita ampara “as uniões de fato, sem atá-las a gênero algum”.
O tema do casamento homossexual fica agora nas mãos do Código da Família, cuja reforma, segundo Mariela, deverá “garantir o casamento (…) como uma instituição plural e inclusiva”, e será levada a referendo em no máximo dois anos.
Mandato presidencial
Outro artigo que encontrou oposição é o que limita o mandato presidencial a dois períodos de cinco anos, em caso de reeleição, e a uma idade máxima de 60 anos para iniciá-lo.
Fidel Castro foi presidente dos Conselhos de Estado e de Ministros entre 1976 e 2008. Seu irmão, Raúl, chefe de Estado entre 2008 e 2018, foi quem propôs limitar o mandato.
No entanto, um número considerável de opiniões recolhidas aponta a permitir a reeleição enquanto tiver apoio popular, sem limite de idade.
Por fim, a eleição do governante se mantém como é, ou seja, é eleito pelo Parlamento, mas ele ou ela será presidente da República por dois mandatos de cinco anos, se for reeleito ou reeleita. Será criada, ainda, a figura do primeiro-ministro.