Islamabad, 30 abr (EFE).- A morte do líder da rede terrorista Al Qaeda, Osama bin Laden, por tropas americanas, abalou as relações entre Estados Unidos e Paquistão e aprofundou a crise institucional que abala o único país islâmico com armas atômicas.
O líder da Al Qaeda estava escondido em uma casa na cidade de Abbottabad, a três horas da capital paquistanesa, Islamabad, quando foi surpreendido por 23 membros da unidade de elite da Marinha dos EUA. Eles entraram no país, a partir do Afeganistão, em dois helicópteros sem serem detectados pelos radares paquistaneses em uma operação que terminou com a morte de Bin Laden e seu corpo sepultado no mar.
No entanto, ao ficar de fora da operação, o governo do Paquistão reagiu com indignação pela falta de confiança dos americanos. Enquanto isso, as suspeitas de Washington sobre o aliado aumentaram pelo fato de Bin Laden ter vivido durante anos a cerca de cem quilômetros de Islamabad e perto da principal academia de cadetes do exército do país islâmico.
‘As relações entre Washington e Islamabad nunca voltarão a ser as mesmas, embora ambas as partes estejam em processo de revisão’, disse à Agência Efe Amina Khan, do ‘think tank’ Instituto Paquistanês de Estudos Estratégicos. Na mesma linha, a líder do Grupo de Crise Internacional do país, Samina Ahmed, declarou: ‘O Paquistão sentiu sua soberania ser atacada e o incidente elevou a tensão com os EUA como poucas vezes antes’.
As duas analistas concordam que a eliminação de Bin Laden foi um dos fatores mais importantes para a deterioração das relações entre os países, mas não o único. ‘Em fevereiro já tinha acontecido o incidente de Raymond Davis (espião americano detido por causar da morte de três pessoas na cidade de Lahore) e depois a morte de 24 soldados paquistaneses pela Otan’, lembrou Khan.
O ataque de vários helicópteros da missão da Aliança Atlântica no Afeganistão matou acidentalmente os militares paquistaneses em um posto de fronteira em novembro, o que abalou ainda mais as instáveis relações com Washington. ‘O exército paquistanês aproveitou a ofensa para tomar medidas concretas, como o fim do abastecimento para a Otan e evacuação da base militar de Shamsi’, afirmou Khan.
Apesar das divergências, a operação contra Bin Laden teve, para alguns analistas, um efeito de coesão entre as forças armadas e o governo paquistanês, que reagiram de forma uníssona em seus protestos diante a Casa Branca. ‘É inegável uma brecha entre os poderes civil e militar, mas ela não pode ser atribuída à morte de Bin Laden, e sim ao processo de transição democrática no país’, afirmou Samina Ahmed.
O momento de maior tensão entre os dois países ocorreu no final de 2011, por causa do escândalo provocado por uma suposta nota secreta que o presidente paquistanês, Asif Ali Zardari, teria enviado ao Pentágono avisando sobre um possível golpe de Estado no Paquistão. A nota, cuja existência não está provada, chegou supostamente através do então embaixador do Paquistão em Washington, Hussain Haqqani, uma semana depois da operação contra Bin Laden.
Segundo a imprensa, que chamou o assunto de ‘memogate’, a morte do líder da Al Qaeda despertou rumores de que poderia causar um golpe de Estado. A falha nos sistemas de segurança do país também gerou desconfiança em diversos setores do país sobre os serviços de inteligência e o Exército.
Além disso, o fato de um dos homens mais procurados do mundo passar despercebido se voltou contra a espionagem e os militares, que, segundo Amina Khan, ‘tentaram encobrir o debate com protestos pela violação de soberania por parte dos EUA’. Com isso, as complicadas relações do poder civil com o militar, que governou o Paquistão durante mais da metade de sua história, continuaram pesando sobre o país e debilitaram a já instável posição do Executivo e do presidente Zardari. EFE