Diante da primeira grande manifestação do novo governo de Javier Milei, presidente da Argentina, nesta quarta-feira, 20, a cidade de Buenos Aires foi blindada em vários pontos-chave e o governo implementou uma operação para controlar o acesso ao centro da capital.
Uma cerca foi erguida ao redor da Casa Rosada, enquanto um maior contingente de policiais foi despachado para as estações ferroviárias Retiro e Constitución. Também há operações na Plaza de Mayo, no Congresso e Avenida de Mayo.
Ao longo do dia, viralizaram nas redes sociais vídeos de batidas policiais em ônibus e trens com destino a Buenos Aires. Passageiros filmaram as autoridades de segurança parando os transportes e embarcando nos veículos, em busca de paus ou bandeiras, sinais de possíveis manifestantes que se dirigiam à marcha.
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Na Plaza Constitución, por exemplo, uma fila de policiais plantou-se em frente às catracas de saída dos trens da Roca, de acordo com o jornal argentino Clarín. No Retiro, foram observadas cenas de revistas de passageiros.
“Existem controles preventivos nas estações ferroviárias e nas diferentes entradas da cidade”, confirmou o porta-voz presidencial, Manuel Adorni, durante coletiva de imprensa.
Protocolo anti-piquetes
Não será apenas o primeiro grande protesto da gestão Milei, mas nesta quarta-feira o governo também estreia seu chamado protocolo anti-piquetes, anunciado pela ministra da Segurança e ex-candidata presidencial, Patricia Bullrich.
O governo anunciou na segunda-feira 18 que os manifestantes que participarem de atos que bloqueiem ruas e rodovias terão seus benefícios de assistência social cortados. A declaração da ministra do Capital Humano, Sandra Pettovello, ocorre depois do gabinete já ter anunciado que o bloqueio de vias levaria a “sanções severas”.
“Os únicos que não irão receber [programas sociais] são os que vão a protestos e bloqueiam a rua”, alertou Pettovello em discurso.
“Informamos que todos aqueles que tenham promovido, instigado, organizado ou participado dos bloqueios perderão o diálogo com o Ministério do Capital Humano”, acrescentou a chefe da pasta que absorveu as anteriores de Educação, Cultura, Trabalho e Desenvolvimento Social. “Quem bloqueia não recebe”, concluiu.
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As organizações de esquerda, como o Polo Obrero, que encabeçam o ato desta quarta não se intimidaram, e mantiveram a marcha até a Plaza de Mayo, uma homenagem aos 39 mortos nos protestos de 19 e 20 de dezembro de 2001, ano da pior crise econômica e social que o país já teve. O grupo estima entre 30 e 40 mil participantes, e disse que contará com o apoio de advogados e líderes de direitos humanos para evitar prisões.
Risco sério
A ameaça a respeito de cortes de benefícios não é coisa pouca. Na Argentina, uma multidão de pessoas tem acesso a uma ampla gama de programas sociais, vitais para manter o tecido social da nação: nos últimos dez anos, a taxa de pobreza no país saltou 15 pontos percentuais, levando mais de 40% da população a essa condição, segundo o Indec, instituto de estatísticas do país.
Os subsídios do governo, direta ou indiretamente (via deduções de imposto), chegam a 95% das crianças e jovens com menos de 17 anos. Para se ter noção, em 2022, o Estado pagou 79% do custo da luz e 71% do gás a todos os conectados à rede. Esses gastos, responsáveis por manter o tecido social de um país acossado pela pobreza, abatem 2,5% do PIB anualmente, e representam 82% do déficit fiscal.