Enredada em escândalos de corrupção e em uma dívida bilionária com o Fundo Monetário Internacional (FMI), a Ucrânia elegeu no domingo 21 um comediante — é isso mesmo — para a Presidência. Vladimir Zelensky, de 41 anos, se lançou no páreo apenas quatro meses antes do pleito, quando tudo o que se sabia sobre ele era que havia participado de uma série de grande sucesso na TV ucraniana, Servo do Povo: encarnava então um professor de história que caíra no gosto da população depois que um vídeo de sua autoria viralizou nas redes sociais — e acabou virando presidente. A vida imitou a arte a seu jeito, com Zelensky conquistando o comando do país do Leste Europeu, com 73% dos votos. A realidade, porém, será duríssima para o novato que fez campanha sem sair às ruas e usando e abusando das redes, como um certo alguém.
Sem um plano claro de governo, ele terá de enfrentar várias batalhas para tirar seu país da crise econômica que vem ceifando empregos. A missão será especialmente difícil pela falta de alicerces políticos de Zelensky. Ele se candidatou pelo partido que criou (nome: Servo do Povo, como o do programa humorístico) e enfrentará um Parlamento de maioria opositora, incluindo aí o primeiro-ministro, alinhado com o antecessor de Zelensky, o bilionário Petro Poroshenko. Os ventos soprarão contra pelo menos até outubro, quando haverá eleição legislativa. “Como em outros países, o voto em Zelensky revela insatisfação com a política tradicional”, diz a cientista política ucraniana Oxana Shevel. Poroshenko foi ungido como expressão do mesmo sentimento, mas não renovou nada.
Zelensky, que será empossado em junho, precisará tomar decisões geopolíticas muito rápidas. Em 2014, a Ucrânia perdeu a Crimeia para a Rússia e a região continua em pé de guerra, com tropas dos dois países de prontidão e um saldo de 13 000 mortos. Enquanto uma negociação ali parece incontornável, Zelensky terá de fazer costuras com o Ocidente. “A Ucrânia escolheu o caminho de integração à Otan e à União Europeia”, afirmou o recém-eleito. Como se diz por aí, falta combinar com os russos.
Publicado em VEJA de 1º de maio de 2019, edição nº 2632
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