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Deputados britânicos aprovam controversa lei que modifica acordo do Brexit

Apesar de ameaças legais de Bruxelas, projeto que altera aplicação de tarifas e controles alfandegários agora segue à câmara alta do Parlamento

Por Caio Saad Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 29 set 2020, 18h24

A câmara baixa do Parlamento do Reino Unido aprovou nesta terça-feira o polêmico projeto apresentado pelo governo do primeiro-ministro Boris Johnson que modifica as disposições do acordo do Brexit assinado com Bruxelas, apesar de ameaças de ações legais e de agitações dentro do próprio Partido Conservador. 

A “lei do mercado interno”, que modifica a aplicação de tarifas e controles alfandegários na Irlanda do Norte, foi aprovada por 340 votos a 256 e agora segue à Câmara dos Lordes, a câmara alta do Parlamento, onde não deve sofrer reveses, mesmo com o reconhecimento por parte de ministros de que o projeto viola a lei internacional. 

Após uma agitação inicial dentro do partido de Johnson, incluindo críticas de  todos os ex-primeiros-ministros vivos – John Major, Tony Blair, Gordon Brown, David Cameron e Theresa May –, uma possível rebelião foi contida pela concessão de dar ao Parlamento a palavra sobre o uso de poderes.

O projeto tem objetivo de proteger o livre comércio entre os quatro países do Reino Unido – Inglaterra, Escócia, País de Gales e Irlanda do Norte – assim que o período de transição do Brexit acabar. O regulamento prevê que, embora a província seja parte do Reino Unido, ficará sob as regras do mercado comum e do código aduaneiro europeu. O objetivo é manter a frágil paz na fronteira entre Dublin, que faz parte da União Europeia, e Belfast, que não faz. Na prática, o projeto de Johnson autoriza que o Reino Unido anule unilateralmente partes do pacto, modificando a aplicação de tarifas e controles alfandegários na Irlanda do Norte previsto no acordo ratificado com a UE.

Johnson afirma que o Reino Unido irá abandonar as negociações, que chegam perto do prazo final de 31 de dezembro, caso nenhum acordo seja firmado até meados de outubro. O governo insiste que as cláusulas presentes no projeto que modifica o Acordo de Retirada da União Europeia, assinado em janeiro, só serão usadas se uma solução fronteiriça com a UE não for alcançada. 

Um dos arquitetos do Brexit, o premiê reitera frequentemente que um rompimento abrupto com a UE seria “bom” para o país prosperar porque daria “liberdade para fechar acordos comerciais com todos os países do mundo” Para especialistas, no entanto, pode ser o caso contrário.

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“Esse cenário significará outro grande golpe para a economia britânica, que está se recuperando do maior choque que se tem memória”, diz Jonathan Portes, professor de Economia da King’s College London. A economia britânica encolheu um recorde de 20% no segundo trimestre e segue 12% menor do que em fevereiro, antes de a pandemia atingir o país.

No início do mês, o país fechou com o Japão seu primeiro acordo comercial da era pós-Brexit. Apesar dos possíveis 19,5 bilhões de dólares em novos negócios envolvidos, opositores afirmam que o valor representa uma parte ínfima do que o país pode perder se não alcançar um acordo com o bloco europeu até o fim do ano. Os 37,74 bilhões de dólares estão muito abaixo dos quase 895 bilhões em comércio com a União Europeia.

Sem um acordo comercial com a UE, os consumidores britânicos, muitos com menor poder aquisitivo por conta da pandemia, teriam de pagar preços mais altos nos supermercados, já que o Reino Unido importa grande parte de seus alimentos.

A ameaça feita à Europa pode ser um blefe projetado para extrair concessões máximas da UE, enquanto ao mesmo tempo agrada um parcela doméstica. Entretanto, o foco do Reino Unido na divergência, como propósito e motivo pelo qual o Brexit foi votado, pode afastar a UE de um compromisso, tornando mais difícil uma zona de entendimento comum nas negociações.

“Os Estados-membros e instituições da UE só irão aceitar um acordo que salvaguarde seus interesses. Isso será mais difícil que nunca, visto que a confiança sofreu outro golpe após as afirmações recentes do governo britânico”, analisa Fabian Zuleeg, chefe-executivo do European Policy Centre, sediado em Bruxelas. “No fim, ninguém sabe o plano do governo britânico. Talvez Boris Johnson nem mesmo tenha um plano, mas esteja testando para ver o que pode conseguir”. 

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Um estudo da universidade London School of Economics, publicado na quarta-feira 23 revela que o custo de um Brexit sem acordo para a economia do Reino Unido pode ser de duas a três vezes pior do que o impacto da pandemia de coronavírus.

A análise feita pelo Departamento de Economia da universidade, em parceria com a iniciativa UK in a Changing Europe (Reino Unido em uma Europa em Mudança), sugere que um Brexit sem acordo comercial com a União Europeia causará perdas equivalentes a 8% do Produto Interno Bruto (PIB) do país a longo prazo.

O valor, semelhante à previsão do próprio governo em 2018 de 7,6%, corresponde a 160 bilhões de libras na cotação atual (mais de 1 trilhão de reais), ou 2.400 libras (17.000 reais) por habitante.

Enquanto isso, a última previsão do Banco da Inglaterra sobre o impacto da Covid-19 mostra uma redução de 1,7% do PIB britânico até 2022. Isso equivale a 40 bilhões de libras (282 bilhões de reais), ou 600 libras (4.200 reais) por pessoa.

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O estudo também ressalta que os danos a longo prazo incluem a deterioração da reputação do país em relação aos negócios, com atrasos devido a encargos administrativos nos portos, restrições às viagens e turismo, à imigração e livre circulação de mão-de-obra.

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