Em última entrevista como alta comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet criticou nesta quinta-feira, 25, ataques reiterados do presidente Jair Bolsonaro às urnas eletrônicas e ao Judiciário.
Questionada sobre a situação no Brasil, a ex-presidente chilena disse que “que me parece mais preocupante é que o presidente peça a seus simpatizantes que protestem contra as instituições judiciais”.
“Podemos não concordar com decisões tomadas pelos outros Poderes e afirmar isto se for necessário, mas é preciso respeitá-los”, continuou durante entrevista à imprensa em Genebra. “Não podemos fazer coisas que possam aumentar a violência ou o ódio contra as instituições democráticas, que devem ser respeitadas e reforçadas. Não devemos tentar miná-las com discursos políticos.”
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Segundo ela, o Alto Comissariado também está monitorando e analisando os discursos de ódio presentes durante o processo eleitoral no Brasil.
Durante resposta, a chefe de direitos humanos da ONU também relembrou o caso do assassinato de Marcelo Arruda, tesoureiro do PT em Foz do Iguaçu, pelo policial bolsonarista Jorge Guranho, em julho.
“Quando você é um candidato, ou um presidente que é candidato, você tem que ser muito cuidadoso para garantir que as pessoas se sintam seguras para ir votar. Eu sei, por exemplo, que em julho um policial apoiador de Bolsonaro matou um apoiador de Lula”, citou. “Casos como esse não deveriam acontecer, e quando um líder usa uma linguagem que pode ser utilizada em uma direção errada, isso é muito ruim”.
Bachelet, de 70 anos, anunciou em julho que não tentaria mais um mandato de quatro anos à frente da agência da ONU por desejar voltar ao Chile e ficar com sua família, depois de uma longa carreira na política e em órgãos internacionais. O mandato dela termina em 31 de agosto, e seu sucessor, que deve assumir em setembro, ainda não foi anunciado.
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Além das falas desta quinta-feira, a alta comissária já se envolveu em outras polêmicas com Bolsonaro. Em 2019, o presidente brasileiro chegou a atacá-la diretamente em uma publicação nas redes sociais em 2019. Na ocasião, ele criticou o pai de Bachelet, o general de brigada da Força Aérea Alberto Bachelet Martínez, que se opôs ao golpe de 1973 que derrubou o presidente socialista Salvador Allende e foi preso e torturado pela ditadura do general Augusto Pinochet.
Em resposta, ela disse sentir “pena pelo Brasil” ao recordar a defesa que Bolsonaro fez da ditadura Pinochet, na qual justificou a morte do pai da socialista pelo regime.
“Se há uma pessoa que diz que em seu país nunca houve ditadura, que não houve tortura, bem, que diz que a morte de meu pai por tortura permitiu que (o Chile) não fosse outra Cuba, a verdade é que me dá pena pelo Brasil”, disse Bachelet em entrevista à Televisão Nacional do Chile (TVN).
Em agosto deste ano, Bolsonaro também chegou a comparar Bachelet com figuras como o cubano Fidel Castro e o norte-coreano Kim Jong-un.
Na intenção de atacar Lula e destacar a relação de seus governos com lideranças de esquerda na América Latina e no mundo, Bolsonaro colocou em um mesmo balaio ditadores autocratas e presidentes democraticamente eleitos, como a própria Bachelet, o ex-presidente do Paraguai, Fernando Lugo, e o ex-presidente do Uruguai, José Mujica.