Líderes da Commonwealth, grupo de países com raízes no antigo Império Britânico, devem passar por cima do Reino Unido e inserir a pauta de reparações relacionadas ao tráfico transatlântico de escravos durante uma cúpula em Samoa, que vai até o sábado, 26. O encontro reunirá representantes de 56 nações que ainda têm em rei Charles III seu chefe simbólico.
O debate sobre reparações pela escravidão tem ganhado força nos últimos anos, e a Commonwealth intensificou apelos para que o Reino Unido se desculpe e faça pagamentos de trilhões de libras em resposta ao seu papel histórico no tráfico de escravos.
Polêmica
O primeiro-ministro do Reino Unido, Keir Starmer, que participará da cúpula ao lado do rei, alegou que a questão das reparações não está na agenda do encontro. Ele enfatizou a importância de olhar para o futuro durante sua visita à Samoa, não o passado, destacando que muitos países da Commonwealth enfrentam desafios urgentes, como as mudanças climáticas.
No entanto, um rascunho do comunicado da cúpula, divulgado à emissora britânica BBC, revelou que os líderes estão dispostos a discutir o tema de justiça reparatória.
“Chefes, observando os apelos para discussões sobre justiça reparatória em relação ao comércio transatlântico de africanos escravizados e à escravidão de bens móveis, concordaram que chegou a hora de uma conversa significativa, verdadeira e respeitosa para forjar um futuro comum baseado na equidade”, disse o texto.
O rascunho indica que os líderes da Commonwealth desempenhariam “um papel ativo em promover conversas inclusivas abordando esses danos” e que concordaram em “priorizar pesquisas adicionais e mais aprofundadas sobre o comércio transatlântico de africanos escravizados que encorajem e apoiem o caminho a seguir”.
O documento ainda pode ser alterado.
Tráfico de escravos
Entre 1640 e 1807, a Grã-Bretanha escravizou cerca de 3,1 milhões de africanos, despachando-os a colônias ao redor do mundo. Muitas dessas pessoas foram enviadas ao Caribe para trabalhar nas lucrativas plantações de cana-de-açúcar, gerando riqueza para seus proprietários.
Sucessivos governos britânicos resistiram a pedidos por um pedido de desculpas formal ou por reparações. A justiça pela escravidão pode vir de muitas formas, incluindo transferências financeiras, alívio de dívidas, um pedido oficial de perdão, programas educacionais, construção de museus, apoio econômico e assistência à saúde pública.
Um relatório da Universidade das Índias Ocidentais revelou recentemente que o Reino Unido deve mais de 18 trilhões de libras (mais de R$ 132 trilhões) em reparações relacionadas à escravidão em 14 países caribenhos.
Nos últimos anos, a monarquia britânica tem adotado um tom mais conciliatório ao abordar os horrores da escravidão. Durante sua visita ao Quênia em novembro, Charles expressou tristeza e “profundo arrependimento” pelos “erros do passado”. Na cúpula anterior da Commonwealth, em Ruanda, ele destacou a necessidade de “encontrar novas maneiras de reconhecer nosso passado”.
Antes da cúpula, o rei se encontrou com moradores de Samoa envolvidos em projetos de reflorestamento e participou de uma cerimônia onde foi homenageado. A rainha Camilla também esteve presente em eventos paralelos, como o fórum feminino da Commonwealth.