Convenção republicana começa com programa de governo vago
Presidente Donald Trump teve candidatura à reeleição confirmada já no primeiro dos quatro dias do evento, que acontece na Carolina do Norte
Em meio a desafios, incluindo a pandemia da Covid-19, a convenção republicana começou nesta segunda-feira, 24, já confirmando a candidatura do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump à reeleição. Tentando dar a volta por cima nas pesquisas de opinião, Trump deve usar o evento partidário para captar toda a atenção e atacar seu adversário, o democrata Joe Biden.
Sem surpresa, os 330 delegados do Partido Republicano reunidos em Charlotte, na Carolina do Norte, indicaram o presidente como seu candidato à eleição de 3 de novembro no primeiro dia da convenção. Apesar da pandemia, a votação foi feita presencialmente, com presença também de uma pequena plateia, que teve que respeitar normas de distanciamento social.
Um a um, os representantes republicanos de cada um dos 50 estados americanos, começando em ordem alfabética pelo Alabama, demonstraram apoio ao presidente. Recebido a gritos de “mais quatro anos”, Trump discursou aos delegados e disse que poderiam ser “mais 12 anos”. A lei americana, no entanto, permite apenas uma reeleição, fazendo com que um presidente fique no máximo oito anos no poder.
Na quinta-feira, com um discurso no jardim da Casa Branca, o presidente aceitará oficialmente – pela segunda vez – a indicação do partido. Mas antes ele já terá discursado em cada dia do evento, quando habitualmente os candidatos falam ao público apenas no ato de encerramento.
O possível discurso na Casa Branca gerou críticas, inclusive de membros do Partido Republicano, pelo fato de romper com a tradição de separar as ações do governo das ações de campanha.
ASSINE VEJA
Clique e AssineA 70 dias da eleição, o republicano segue atrás do ex-vice-presidente Biden, candidato do Partido Democrata, nas pesquisas. Análises iniciais apontam que o presidente será derrotado em vários estados cruciais, mas Trump ainda espera uma virada e uma vitória surpresa, como aconteceu em 2016.
Além da formalização da candidatura de Trump e de seu vice, Mike Pence, o evento de quatro dias de duração também tem objetivo de defender o governo do 45° presidente da história dos Estados Unidos, muito questionado pela gestão da pandemia de Covid-19 e que não pode contar mais com o que sua campanha apresentava como seu principal ativo e eventual trunfo: a boa saúde da economia. Os Estados Unidos somam mais de 5,7 milhões de casos, incluindo 176.694 mortes.
A pandemia causou a maior contração em 73 anos, desde que o governo começou a manter registros, encolhendo a uma taxa anual de 32,9% entre abril e junho. O declínio é três vezes maior do que o recorde anterior de 10%, estabelecido em 1958.
Durante a votação, Pence, vice-presidente dos EUA e candidato na chapa com Trump, tomou a palavra, dizendo que “os Estados Unidos precisam de mais quatro anos de Donald Trump na Casa Branca”. “A escolha nesta eleição nunca foi mais clara, e nunca houve tanto em jogo”, acrescentou.
Diferentemente da Convenção Democrata, totalmente virtual e que terminou na quinta-feira passada com o discurso de Biden, a Convenção Republicana planeja alguns eventos ao vivo com plateias presenciais, mas sem deixar de ser um evento familiar para o presidente. Entre os principais oradores do evento republicano estão Melania, esposa do presidente, e seus quatro filhos adultos: Donald Jr, Eric, Tiffany e Ivanka.
“Vamos mostrar o impacto que o governo Trump-Pence teve sobre as pessoas reais”, declarou ao canal Fox News a assessora Kellyanne Conway. “Ouvirão o presidente diretamente”, completou a conselheira, que teve um papel central na campanha de 2016 e que no domingo 23 anunciou que deixará a Casa Branca até o fim do mês para dedicar-se à família.
Uma das “pessoas reais” será Tany Weinreis, gerente de um café em Montana que recebeu um empréstimo federal para enfrentar as consequências da pandemia em seu negócio. A convenção também reservou espaço para vários oradores afro-americanos, incluindo Tim Scott, o único senador republicano negro, em uma tentativa de chegar a uma comunidade majoritariamente hostil ao partido de Trump.
A presença de Scott, no entanto, pode não render frutos entre eleitores negros. Entre os convidados também está o casal branco notório por ter apontado armas no final de junho a manifestantes antirracismo do movimento Black Lives Matter em Saint Louis. A informação foi confirmada por conselheiros de Trump ao Washington Post na semana passada.
Programa de governo
O discurso de Trump também é muito aguardado, quando deve falar sobre seu programa para os próximos quatro anos. Questionado no domingo sobre o tema pela emissora Fox News, Trump foi bastante evasivo mais uma vez.
“Eu reforçaria aquilo que já fiz e faria coisas novas”, respondeu, quando perguntado sobre o que faria diferente se fosse reeleito.
A tática foi compartilhada por outras autoridades republicanas presentes no evento, que disseram que a ideia é espalhar uma mensagem com foto na postura de “lei e ordem” apresentada pelo presidente, com falas sobre direitos de posse de armas e cortes de impostos.
A campanha de Trump divulgou uma promessa, dentro de uma série de objetivos vagos, de “criar 10 milhões de novos empregos em 10 meses”, sem especificar ao certo como pretende fazer isso.
Em teleconferência do Oriente Médio, onde está para uma visita de cinco dias, o secretário de Estado Mike Pompeo deve ressaltar os avanços diplomáticos registrados durante a administração Trump, um discurso incomum neste tipo de evento.
Muitos acreditam que o presidente retomará rapidamente a sua retórica habitual, que polariza ao invés de unir, para delírio da plateia.
“Sou o único que separa o sonho americano da anarquia total, da loucura e do caos”, afirmou na sexta-feira, quando declarou que uma vitória democrata seria nefasta em termos de ordem pública, de controle da imigração e de equilíbrio das finanças públicas.
Trump, de 74 anos, tenta diminuir Biden, de 77, pela idade. Se vencedor na corrida eleitoral, o democrata seria o presidente mais velho da história americana. Em entrevistas recentes, Trump chegou a afirmar que o adversário possuía problemas de memória, desafiando o ex-vice-presidente a um teste com médicos.
Segundo John A. Tures, professor de Ciências Políticas da LaGrange College, nos EUA, Trump poderia melhorar sua imagem caso adotasse um tom mais moderado, mas, ao invés disso, deve continuar falando para sua base já consolidada.
“Se moderasse o tom, se aproximasse de adversários e daqueles que não concordam com ele dentro do próprio partido, poderia mudar sua imagem. Ele não deve fazer isso”, disse. “Ao invés disso, ele irá fazer todos os tipos de propagandas negativas, dizendo que Biden e Harris são muito liberais. Sua campanha pode, através de intermediários, dizer que Biden e Harris são muito conservadores, para confundir eleitores”, disse o especialista, citando Kamala Harris, companheira na chapa com Biden pelo Partido Democrata.
Os democratas, por sua vez, tentam mostrar Trump como uma figura incompetente e sem apreço às leis e à história do país.
Em outro contraste entre os eventos dos dois partidos, ex-presidentes e candidatos presidenciais republicanos não irão discursar. Não há planos para falas de George W. Bush ou do candidato republicano na eleição de 2012, Mitt Romney. Do lado democrata, figuras importantes do partido, como o ex-presidente Barack Obama e sua esposa, Michelle, participaram entre figuras do alto escalão político.