Falando em conjunto com o líder da Argentina, Alberto Fernández, na Casa Rosada, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) disse nesta segunda-feira, 23, que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) do Brasil pode ajudar no financiamento de um gasoduto argentino, ampliando a cooperação dos dois países no campo energético.
O governo argentino busca recursos para concluir a construção do gasoduto que poderá ligar o campo de Vaca Muerta, um dos maiores do mundo, até a divisa com o Rio Grande do Sul. Em dezembro, já após a vitória de Lula nas eleições, autoridades argentinas chegaram a anunciar que o BNDES financiaria até US$ 689 milhões (cerca de R$ 3,5 bilhões) para o projeto.
Na ocasião, o banco, à época ainda no governo de Jair Bolsonaro (PL), emitiu uma nota negando a operação. Com a mudança de governo, no entanto, a expectativa em torno da possível participação do banco no projeto é diferente. Isso acontece, em parte, pelo histórico recente dos governos do PT na utilização do banco para financiar obras em países na América Latina e na África.
“O BNDES tinha muito mais recursos para financiar que o Banco Mundial. Tínhamos orgulho quando podíamos financiar obras em um país da América do Sul, porque é isso que os países maiores devem fazer com os que tem menos condições”, afirmou Lula, acrescentando “ter certeza” de que os empresários brasileiros têm interesse no gasoduto argentino, bem como em outros produtos, como fertilizantes.
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“Se há interesse dos empresários, e há interesse do governo, e temos um banco de desenvolvimento para isso, vamos criar as condições para o financiamento para ajudar o gasoduto [da Argentina]”, completou o presidente brasileiro, sob uma salva de palmas.
O petista alegou que, durante a crise econômica mundial de 2008, se não fossem o BNDES e os bancos públicos, “a economia brasileira teria quebrado”. De acordo com Lula, o Brasil foi “o último país a entrar em crise e o primeiro a sair” devido ao financiamento de R$ 500 milhões para o crescimento econômico.
Já o presidente da Argentina, Fernández, afirmou que a Argentina “deveria ter inveja” do BNDES.
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Segundo Lula, o Brasil seria, por vezes, criticado e subestimado “por pura ignorância” por aqueles que acreditam não haver recursos suficientes para estender linhas de financiamento de engenharia para outros países. Ele declarou que não ache apenas possível, mas “necessário”, que uma nação do tamanho do Brasil ajude seus parceiros.
“É isso que vamos fazer, dentro das possibilidades econômicas do nosso país”, garantiu.
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O gasoduto de Vaca Muerta
A obra que pode marcar o retorno do BNDES a projetos internacionais é uma das mais ambiciosas da Argentina. Trata-se de um gasoduto para transportar gás natural produzido no campo de Vaca Muerta, localizado na Província de Neuquén, a oeste da Patagônia, até os principais mercados consumidores.
Estimativas apontam que esta seja a segunda maior jazida de gás de xisto do mundo e a quarta de petróleo não-convencional, aquele que demanda mais energia para a sua extração. Usualmente, para que seja extraído da terra são usadas técnicas como o fraturamento hidráulico, ou “fracking”, a injeção de uma mistura de água e areia que quebra as rochas nas quais o óleo está preso, facilitando sua retirada. A técnica é alvo de críticas de ambientalistas e povos originários por supostamente comprometer reservas de água e causar instabilidades geológicas onde é aplicada.
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O principal trecho da obra é o que leva o gás até Buenos Aires, mas um segundo trecho está previsto para chegar até a Província de Santa Fé, perto da fronteira com o Brasil. Para o Brasil, o plano é trazer gás ao país, diminuindo a dependência em relação a outras fontes do produto, como a Bolívia.
Em 2021, o gás natural era a segunda maior fonte de oferta de energia no Brasil, respondendo por 12,8%, atrás apenas das fontes hidráulicas, que correspondiam a 56,8%.
A possível entrada do BNDES em um novo empreendimento internacional é vista com ambiguidade, em parte, porque durante a Operação Lava Jato os financiamentos feitos pelo banco a países estrangeiros foram alvo de investigações, e porque alguns acreditam que o Brasil não deveria emprestar dinheiro para projetos fora do país, devido a possíveis calotes.