Homens com os rostos cobertos, mulheres e crianças se dividiram nesta quarta-feira, 20, em dez caminhões da operação de retirada dos moradores do povoado de Baghuz, o último reduto do Estado Islâmico no leste da Síria. A remoção dos civis deu-se em paralelo à ofensiva final das Forças Democráticas Síria (FDS), a aliança curdo-árabe, na localidade.
O porta-voz das FDS, Moustafa Bali, afirmou que jihadistas podem ter embarcado nos caminhões, entre os civis. Mas todos estarão sujeitos a revistas e interrogatórios ao chegarem a uma das zonas de recepção das FDS.
Unidades especiais foram montadas para retirar os moradores, muitos dos quais ainda resistem a deixar o povoado. A primeira leva foi justamente a que embarcou nesta quarta-feira nos dez caminhões. “Após vários dias de tentativas, conseguimos retirar um primeiro grupo hoje”, disse o porta-voz. “O número deles ainda não é conhecido.”
Os jihadistas de linha dura, que seriam centenas, continuam entrincheirados em um pequeno bolsão de 500 metros quadrados em Baghuz, na província de Deir Ezzor, perto da fronteira com o Iraque. Apoiadas pela coalizão internacional liderada por Washington, as FDS têm o objetivo de acabar com eles. Porém, mulheres e crianças, principalmente de famílias seguidoras do Estado Islâmico, permanecem ao lado dos jihadistas.
Com a operação de retirada de civis, as FDS desaceleraram seus ataques e acusam os jihadistas de usar os remanescentes como “escudos humanos”. “Acreditávamos que todos os civis tinham partido, (…) mas não nos surpreendeu ver que havia pessoas escondidas”, disse outro porta-voz das FDS, Adnane Afrine. “Tratam-se de familiares do Estado islâmico, mas nós os consideramos civis”, ressaltou.
Na terça-feira 19, depois de uma pausa de vários dias, dezenas de civis e combatentes do Estado Islâmico, especialmente estrangeiros, se entregaram às FDS.
Desde o início de dezembro passado, cerca de 40.000 pessoas, principalmente familiares de jihadistas, fugiram de Baghuz, segundo o Observatório Sírio de Direitos Humanos (OSDH). De acordo com o diretor desse organismo sediado em Londres, Rami Abdel Rahman, há “negociações” em andamento entre as FDS e o Estado Islâmico sobre a “rendição” dos jihadistas entrincheirados.
Rahman, porém, disse que “acordo tem contornos ainda vagos”. Os líderes das FDS negaram haver conversas.
Os combatentes do Estado Islâmico controlam apenas algumas casas de Baghuz. Estão escondidos em túneis, no meio de um mar de minas instaladas por eles para impedir o avanço das FDS. Segundo Moustefa Bali, os jihadistas têm apenas duas opções: “Se renderem ou morrerem em combate”.
Em 2014, o Estado Islâmico conquistou vastos territórios da Síria e do Iraque e proclamou a fundação de um “califado” na região. Os jihadistas estabeleceram sua própria administração, executaram e torturaram aqueles que não respeitaram suas leis e fomentaram ataques no exterior.
Nas últimas semanas, as forças curdas prenderam centenas de jihadistas estrangeiros membros do Estado Islâmico, que geram agora um problema enorme para os seus países de origem. Várias nações se recusam a repatriá-los, apesar dos apelos nesse sentido das forças da coalizão, por temor de eles trazerem riscos para a segurança nacional.
Civis de países ocidentais e que aderiram ao Estado Islâmico já estão sofrendo a retirada de suas nacionalidades e tendem a vagar como apátridas. Nesta quarta-feira, Bangladesh negou acolhimento a Shamima Begum, britânica de 19 anos que, há cinco abandonou seu país para se casar com um jihadista holandês na Síria. O Reino Unido pretende retirar sua cidadania, e Bangladesh seria uma opção por ser o país de origem de sua família.
O secretário de Estado americano, Mike Pompeo, disse nesta quarta-feira que a jovem Hoda Muthana, nascida no Estado do Alabama, “não é uma cidadã americana e não será admitida nos Estados Unidos”. Ela se uniu ao Estado Islâmico em 2015.
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, pediu recentemente às potências europeias para que repatriem seus cidadãos na Síria. Mas Paris, Londres, Berlim e Bruxelas disseram que este tema não estava em suas agendas.
A batalha anti-EI representa hoje a principal frente da guerra na Síria, que já fez mais de 360.000 mortos e milhões de deslocados e refugiados desde 2011.