Faltando 11 semanas para as eleições presidenciais dos Estados Unidos, os dois principais nomes da corrida, a vice-presidente democrata, Kamala Harris (recém-confirmada como candidata oficial do partido), e o republicano Donald Trump estão empatados tecnicamente nas pesquisas de opinião e devem disputar voto a voto a vitória nas urnas, tal qual aconteceu em 2020. Com uma diferença: a presença de um terceiro candidato, sem chance nenhuma de ganhar, mas com grande capacidade de atrapalhar o jogo. É Robert Francis Kennedy Jr., 70 anos, sem partido, bem-apessoado e bronzeado advogado de Malibu, onde se concentram os ricaços da Califórnia.
Figura controvertida, o advogado faz questão de propagandear em discursos e entrevistas tanto o sobrenome famoso de um clã historicamente democrata quanto teorias conspiratórias pregadas no ideário do trumpismo. É nesse cenário que ele se mexe para cavar espaço entre eleitores nas duas frentes. Mas agora parece disposto a desistir – por um preço.
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Nesta sexta-feira, 23, Kennedy Jr. entrou com a papelada para retirar o nome das cédulas presidenciais no estado do Arizona, de acordo com o secretário de Estado local, Adrian Fontes. Isso logo antes de um evento em que ele faria discurso à nação no estado que pode ser uma das chaves para decidir a corrida pela Casa Branca, pululante de eleitores indecisos que podem ser puxado para um lado ou para o outro.
Não parece ter sido uma decisão em vão. Na quarta-feira 21, um Super PAC (Comitês de Ação Política, na sigla em inglês) de apoio a Kennedy, organização de simpatizantes destinada a levantar fundos para campanhas eleitorais, afirmou à agência de notícias Reuters que o candidato independente flerta com Trump por um acordo, no qual ele desistiria da corrida e apoiaria o rival republicano em troca de um cargo em seu governo, caso vença as eleições.
Estancar o sangramento de votos
Trump afirmou à emissora americana CNN nesta semana que “certamente estaria aberto” a abrir espaço para Kennedy em sua administração neste cenário. Seria uma aposta para garantir que o independente não “roube” votos que poderiam ir para o republicano. A maioria das pesquisas o coloca com cerca de 10% das intenções de voto — a melhor performance de um candidato independente em décadas.
Candidatos independentes como ele não têm nenhuma chance de emperrar a engrenagem da máquina eleitoral dos partidos tradicionais, mas são capazes de causar soluços e imprevistos, ainda mais em uma eleição como a deste ano, que deve ser decidida por margem muito estreita de delegados no Colégio Eleitoral.
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Ao longo da história, outsiders já mostraram que podem ser um fator de risco para os políticos tradicionais. Na disputada eleição de 2000, Ralph Nader, do Partido Verde, amealhou 3 milhões de votos que fizeram muita falta ao democrata Al Gore e contribuíram para a vitória do republicano George W. Bush. Anos antes, em 1992, outro azarão, o bilionário conservador Ross Perot, sacudiu a tranquilidade das legendas mais conhecidas ao atrair 19% do eleitorado, boa parte insatisfeita com a conjuntura econômica da época, e fortalecer o democrata Bill Clinton.
As polêmicas de Kennedy
RFK Jr., como gosta de ser chamado (reeditando as iniciais pelas quais o pai era conhecido), é filho do senador Robert Kennedy, alvejado fatalmente em uma primária democrata quando tentava se candidatar à Casa Branca em 1968, e sobrinho do ex-presidente John Kennedy, assassinado a tiros em 1963.
Candidato a ser agora a terceira via, como toda a família, foi democrata de carteirinha. Vestiu essa camisa até 2023 e se projetou no início dos anos 2000 como advogado ambientalista, chegando a ser cotado para ocupar a direção de órgãos do governo na área.
Ao longo da última década, porém, tornou-se mais conhecido pelo vigoroso discurso contra a vacinação infantil, que, replicando teorias amalucadas, insiste em associá-la a doenças como autismo. A lista de sandices inclui ainda duvidar da relação entre HIV e aids e associar o tratamento da água que o público consome a disfunções sexuais. E, claro, ele faz parte da turma de céticos contumazes que vê o dedo da CIA nos assassinatos do pai e do tio.
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Durante a pandemia, não perdeu chance de disparar bizarrices a respeito da origem do vírus da covid-19, dos supostos males da vacina e do lockdown. “Até na Alemanha de Hitler as pessoas podiam cruzar os Alpes e se refugiar na Suíça e se esconder no sótão, como Anne Frank. Hoje os mecanismos em vigor nos impedem de fugir. Ninguém consegue se esconder”, proclamou em uma manifestação antivacinas em Washington.
Por essas e outras, chegou a ser temporariamente banido de redes sociais. Em 2021, lançou um livro demonizando o médico Anthony Fauci, conselheiro da Casa Branca no combate à pandemia que diversas vezes entrou em choque com Trump. Por suas posições, Kennedy foi solenemente renegado pela família, que recentemente fez questão de se encontrar em peso com Biden para manifestar seu apoio.