A Câmara dos Deputados dos Estados Unidos aprovou o impeachment do presidente Donald Trump por abuso de poder com 230 votos a favor e 197 contra, depois de sete horas de debates no plenário. Trump torna-se, com isso, o terceiro líder americano a ser a julgado pelo Senado, a próxima etapa desse processo. Os anteriores foram Andrew Johnson, em 1868, e Bill Clinton, em 1998. Richard Nixon renunciou em 1974 antes da votação.
Uma segunda votação deu-se em seguida, referente à acusação de obstrução dos trabalhos de investigação do Congresso, e terminou com 229 votos a favor e 198 contra, com 3 abstenções e uma ausência.
Candidato à reeleição pelo Partido Republicano em 2020, Trump é acusado pela Câmara dos crimes de abuso de poder e de obstrução dos trabalhos do Congresso. O primeiro tem como base as pressões dele sobre o presidente da Ucrânia, Vladimir Zelensky, para investigar a presença do filho de seu potencial adversário eleitoral, Joe Biden, no conselho de uma empresa envolvida em corrupção. O segundo se refere ao veto de Trump ao depoimento de seus colaboradores no inquérito em andamento.
Em um documento de 658 páginas que oficializou o processo de impeachment, o Comitê Judiciário da Câmara concluiu que o presidente “traiu a nação ao abusar das funções de seu posto”. O caso será encaminhado por representantes da Câmara ainda nesta semana para o Senado, onde será julgado sob o comando do presidente da Corte Suprema, John Roberts. Trump, porém, continuará a exercer a Presidência dos Estados Unidos enquanto o julgamento não for concluído no Senado, que tenderá a inocentá-lo.
Jesus diante de Pilatos
Ao longo de mais de seis horas de debates na Câmara, os deputados republicanos insistiram em desqualificar e alongar o processo. “A América está sendo ferida gravemente por esta traição, por este impeachment injusto e armado que trouxe sobre nós os mesmos socialistas que ameaçam a vida de fetos, os direitos dos conservadores previstos pela Primeira Emenda [da Constituição]”, exagerou o deputado Clay Higgins, da Louisiana. “É um flagrante abuso de poder e um vergonhoso processo travestido de justiça que vai prejudicar a reputação de todos os responsáveis por gerações”, reclamou Tom McClintock, da Califórnia.
O republicano Barry Loudermilk foi ainda mais longe ao alegar que, diante de Pôncio Pilatos, Jesus Cristo teve mais direito do que os conferidos pelos democratas a Trump no processo de impeachment. “Antes de você dar esse histórico voto hoje, uma semana antes do Natal, quero que tenha isso em mente: Quando Jesus foi acusado falsamente de traição, Pôncio Pilatos deu a Jesus a oportunidade de enfrentar seus acusadores.”
Os democratas, porém, sustentaram a coerência das acusações, amparadas em provas materiais e testemunhos. “Donald Trump usou o enorme poder da Presidência para pressionar uma nação estrangeira a manchar [a reputação] de seu potencial opositor político”, disse o deputado Steve Cohen, do Tennessee. Mas foi a presidente da Câmara, a democrata Nancy Pelosi, a responsável por conduzir o processo, quem abriu a “triste” sessão”.
“A visão dos nossos fundadores sobre uma república está sob ameaça de ações da Casa Branca. Se não agirmos agora, nós estaremos abandonando o nosso dever. É trágico que as ações imprudentes do presidente tornem o impeachment necessário. Ele não nos deixou escolha”, declarou Pelosi, que abriu o processo formal de impeachment há dois meses.
Enquanto a sessão transcorria, auxiliares da Casa Branca distribuíram nos gabinetes dos deputados um cartão de Natal enviado por Trump e uma cópia de sua carta a Pelosi, entregue na véspera da votação, segundo o jornal The New York Times. Na missiva, o presidente americano desfiou impropérios contra sua rival democrata e o processo de impeachment.
“Isto não é nada além de uma tentativa de golpe partidária e ilegal que, com base em recente sentimento, irá fracassar durante a votação. A história vai julgar você duramente se prosseguir nesta charada do impeachment”, escreveu Trump.
Agora o presidente deve enfrentar julgamento no Senado que determinará ou não sua condenação e consequente remoção do cargo.
O Senado é controlado pelos colegas republicanos de Trump, que em sua maioria defendem o presidente. Uma maioria de dois terços dos presentes na Casa composta por 100 parlamentares é necessária para que o magnata seja condenado, o que implica que cerca de 20 dos 53 senadores republicanos precisariam votar contra o presidente para que ele fosse impedido de continuar no cargo.