Meia hora depois de os portões serem fechados, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) divulgou o tema da prova de redação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) de 2018: “Manipulação do comportamento do usuário pelo controle de dados na Internet”.
A redação é sempre uma das provas mais difíceis do Enem porque, além da verificação do domínio de uso escrito da língua portuguesa, são avaliados também o raciocínio e a capacidade de argumentação do estudante. Opiniões políticas e ideológicas nem sempre são bem-vindos na construção do texto, exceto se tiverem uma sustentação conceitual bastante sólida.
Nos últimos anos, o Enem deixou de lado os temas com possibilidade de resultar em expressões político-ideológicas e preferiu questões desafiadoras para a sociedade atual. No ano passado, o tema escolhido foi “Desafios para a formação educacional de surdos no Brasil”. Foram incluídos quatro textos para apoiar os estudantes: dados sobre alunos surdos no Brasil, um trecho da Constituição sobre o ensino universal , a adoção da língua de sinais como o segundo idioma do país e dados do Ministério Público do Trabalho sobre a exclusão dos surdos.
Em 2016, o tema proposto foi “Caminhos para combater a intolerância religiosa no Brasil” e, no ano anterior, “A persistência da violência contra a mulher na sociedade brasileira”.
A escritora e jornalista Arlete Salvador, autora do livro “Como escrever para o Enem”, afirma que, de forma geral, a prova do Enem é excepcional para a medição do grau de conhecimento do estudante. Mas sempre é difícil e exaustiva. “Não há como chutar nem como apostar na sorte. Se o estudante não tiver conhecimento amplo e preparo além dos livros escolares, terá dificuldades”, afirmou.
A redação é a tarefa mais difícil da prova, em sua opinião, porque tem o objetivo de mesurar a competência do estudante no uso da língua, sua capacidade de argumentação, a estrutura lógica e a fundamentação em um texto de até 30 linhas. Por isso, Salvador sempre recomenda que seja esta a primeira tarefa a ser executada no dia da prova.
Os temas propostos são, geralmente, engessados e não se abrem para a criatividade, lembra ela. O texto terá obrigatoriamente de seguir a sequência lógica da introdução, desenvolvimento (posicionamento sobre o tema e argumentação, com elementos de ligação) e conclusão.
Para Arlete Salvador, os temas das redações anteriores foram mais indutores da posição a ser assumida pelo estudante. Desta vez, a questão sobre a manipulação dos usuários pelo controle de dados da internet abriu a possibilidade para o estudante concordar ou discordar do enunciado e mesmo para discorrer sobre os benefícios e desvantagens trazidos pelo controle de dados.
Qualquer que seja a linha a ser seguida, importante é adequar-se bem aos requisitos que serão avaliados. A capacidade gramatical vai além da escrita correta em português e abrange também a lógica do texto. Ater-se ao tema, com posicionamento claro e argumentação técnica, é sempre um desafio, segundo Salvador. “Divagar para outro tema é um erro muito comum.”
O encadeamento de ideias de forma coerente e coesa também é avaliado. A proposta de intervenção social, ou seja, o que o estudante propõe como solução para o tema, está entre os quesitos observados atentamente pelos avaliadores. Por fim, completar as 30 linhas nem sempre é uma meta alcançada pelo estudante. Não cumpri-la certamente reduzirá ou até anulará a sua nota.
Segundo o professor de redação do Anglo, Aníbal Telles, o tema escolhido para este é difícil, porém “atualíssimo”. Traz um inevitável componente político porque envolve a influência do “big data” sobre os usuários da internet para votar em determinados candidatos, comprar certos bens. Os estudantes do Anglo e de outras escolas do país foram expostos às discussões dessa questão ao longo do ano. Mas pode ser ter sido omitido por muitas instituições de ensino.
“Esse tema exige um repertório mais elitista”, afirmou Telles. “Fiquei surpreso por não ter surgido um tema relacionado a alguma minoria, como nos últimos anos, em que foram tratadas as questões da mulher, da religião e dos surdos”, completou.
Os locais de prova do primeiro dia do Enem foram abertos às 12h deste domingo. Os estudantes puderam ingressar nas salas até as 13h (horário de Brasília), quando começaram a ser aplicados os procedimentos de segurança. As provas começaram às 13h30. Os estudantes terão um período de 5h30 para realizar as provas de linguagem, ciências humanas e redação.
A adoção do horário de verão neste domingo causou preocupação nos organizadores sobre a perda da prova por estudantes atrasados. Houve reiterados apelos do INEP para a maior atenção com o horário. Os estados do Norte e do Nordeste terão horários diferentes de abertura e fechamento dos portões porque não estarão sujeitos ao horário de verão.