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Claudio de Moura Castro: o lobby dos mestres e doutores

A pressão da comunidade científica impede a formação adequada

Por Claudio de Moura Castro
Atualizado em 13 set 2019, 10h34 - Publicado em 13 set 2019, 06h30

Nos anos 1960, o Brasil empreendeu um grande programa para criar seus cursos de doutoramento. Julgava-se que, naquele tempo, não havia nem maturidade institucional nem massa crítica de professores qualificados, e algo precisava ser feito. Ainda que o país se inspirasse no modelo americano, op­tou-se por um invento local: os mestrados acadêmicos. Era uma incoerência, pois no modelo original — dos Estados Unidos — todos são profissionais. Obtida a maturidade, os mestrados se metamorfoseariam em doutoramentos. Era uma orientação prudente.

Mas houve um acidente de percurso. Em vez de serem eliminados, os mestrados foram mantidos. A eles, os doutoramentos foram sobrepostos, como sequência obrigatória. Terminamos com uma formação mais demorada, pois o doutoramento é precedido por três anos de mestrado. É um óbvio desperdício de recursos dos cofres públicos.

Antes de falar do pior, voltemos ao uso das palavras. Desde o período medieval, o doutor é um diploma acadêmico. De origem, eram os doutores em teologia ou filosofia (daí o ph.D., Philosophiae Doctor). Já o mestre sempre foi associado às profissões. Seus antepassados são os mestres de obras ou os mestres de ofício. Assim sendo, o doutor é um acadêmico. E o mestre, um profissional, o que configura um pleonasmo.

“Jogam-se no mercado profissionais preparados para outra coisa”

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A expansão e o sucesso da pós-graduação brasileira fortaleceram o lobby dos mestres e doutores — que têm muita voz nas decisões da Capes, a fundação do Ministério da Educação que zela pelo aprimoramento de mestrandos e doutorandos. Com isso, de um miasma concebido para desaparecer, o mestrado acadêmico transformou-se em rocha sólida. E, o que é pior, obstruiu a criação de um mestrado verdadeiramente profissional. Os mestrados chamados profissionalizantes, uma concessão da academia, de fato, não o são. Continuam exigindo tese (um contrassenso para quem não vai ser pesquisador) e um montão de ph.Ds. São ignoradas a experiência e as obras práticas dos professores. Quando a pós-­graduação foi gestada, a prioridade era preparar professores e pesquisadores. Isso acontecia, no início dos 1980, quando eu era diretor-geral da Capes. Mas hoje apenas uma proporção limitada dos mestres e doutores se dirige à vida acadêmica. Jogam-se no mercado profissionais preparados para outra coisa.

Passam-se os anos e a Capes não consegue vencer as resistências da “comunidade científica”. Nem se acaba com os mestrados acadêmicos nem se abre espaço para os profissionais. Diante disso, as escolas de negócios acharam outra solução. Em vez de lutarem quixotescamente contra a legislação vigente, criaram os masters of business administration (MBAs) — cursos fiéis à profissionalização buscada e inspirados na experiência internacional. São mestrados (profissionais) tal como existem alhures. Mas usando as palavras inglesas, deixam de ser cursos controlados pela legislação brasileira. Não passam de diplomas de fantasia, tão distantes do enquadramento legal como o curso de violão do vizinho. E, como formam para o mercado, pouco importa que não gerem diplomas oficiais. Fico feliz de ver que a língua inglesa resolveu um problema em que nossos dirigentes falharam.

Publicado em VEJA de 18 de setembro de 2019, edição nº 2652

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