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Ser Educacional ganha força no Sul e Sudeste com aquisição da Laureate

CEO do grupo nordestino avaliado em R$ 2,1 bilhão e que se tornou o quarto maior em alunos do Brasil fala com exclusividade a VEJA sobre a negociação

Por Felipe Mendes 14 set 2020, 19h34
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  • O sol já havia se posto no último domingo 13, quando o Grupo Ser Educacional, conhecido por sua larga atuação no Norte e no Nordeste, anunciou a aquisição dos ativos da americana Laureate no Brasil. Com a combinação dos negócios, a Ser torna-se a quarta maior empresa do ramo educacional do país, com cerca de 450.000 alunos. Os valores envolvidos giram em torno de 4 bilhões de reais e incluem o pagamento em caixa de 1,7 bilhão de reais pela companhia de Recife (PE), o recebimento de dívida líquida de 623 milhões de reais e a entrega de 44% das ações da nova empresa — que será listada em uma bolsa de valores dos Estados Unidos — para a Laureate. Para Jânyo Diniz, CEO do grupo, a compra da detentora de marcas consolidadas como Anhembi Morumbi e FMU colocará a Ser Educacional no mesmo patamar de Cogna (ex-Kroton) e YDUQS, a antiga Estácio. “Nos momentos de crise, sempre há oportunidades de fusões e aquisições. Mas, agora, a competição passa a ser mais acirrada e a concentração de grandes ativos tende a ser menor”, diz ele. Embora a YDUQS tente se postular no certame, mesmo com a negociação com a Ser já anunciada, há poucas evidências de que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) aprovaria uma eventual compra por parte da dona da Estácio, devido a sua maior participação de mercado.

    Como surgiu essa oportunidade para combinar os negócios da Ser Educacional com a Laureate no Brasil? A Laureate anunciou recentemente desinvestimentos numa série de ativos. Na última semana, ela se desfez de uma instituição nos Estados Unidos e da operação que detinha no Chile. Antes disso, anunciou a venda de sua operação na Austrália. E, agora, nós estamos fazendo a incorporação dos ativos da Laureate no Brasil. Talvez a pandemia tenha até acelerado essa movimentação por parte dela.

    Já existia um bom relacionamento com os executivos da Laureate no Brasil? Nós começamos o relacionamento com a Laureate há pouco mais de dois anos, quando iniciamos a discussão para a compra da operação da Uninorte, em Manaus. Isso fez com que nos aproximássemos bastante e tivéssemos um relacionamento mais forte, o que foi importante no decorrer desta nova negociação. A Laureate abriu, de acordo com sua estratégia, um processo competitivo durante esse período de pandemia. E nos postulamos à posição de comprador dos ativos da companhia no país. Nas últimas semanas, o processo se acelerou em função da due dilligence efetuada por parte da Laureate.

    Além de pagar 1,7 bilhão de reais e assumir as dívidas da Laureate, o acordo prevê que a combinação dos negócios tenha listagem em uma bolsa de valores dos EUA. Por que isso? Antes de qualquer coisa, é importante dizer que a listagem da empresa no Brasil continua exatamente como funciona hoje. O que acontece é que a Ser continuará listada aqui, mas também irá emitir ADRs nos Estados Unidos. Ainda não definimos se será na bolsa de valores de Nova York, a Nyse, ou se será na Nasdaq. Temos tempo para avaliar qual seria a melhor estratégia.

    Nos últimos anos, o setor educacional passou por uma série de fusões e aquisições. Com a pandemia, novas oportunidades para a consolidação do mercado aparecem. Esse movimento tende a se intensificar agora? Eu acredito que sim. O período de isolamento está sendo particularmente mais difícil para as instituições de ensino. As redes menores e aquelas que não fizeram um planejamento de caixa adequado acabam sofrendo mais. Nos momentos de crise, sempre há oportunidades de fusões e aquisições. Mas, agora, a competição passa a ser mais acirrada e a concentração de grandes ativos tende a ser menor. Como as companhias começam a ficar grandes demais, há um limite para aquisição no mercado em função do nível de consolidação por regiões, o que pode gerar problemas com o Cade. Como a Cogna, a YDUQS e a própria Ser estão se tornando grupos robustos, a possibilidade de aquisições entre eles começa a ser limitada. Mas, o processo de consolidação deve continuar, sim, principalmente em relação a redes menores.

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    Além da forte presença física em regiões estratégicas do país, a Laureate investiu muito para ampliar sua capacidade de ensino a distância nos últimos anos. Esse foi um dos motivos que levou o Grupo Ser Educacional a considerar os ativos? Sem dúvida. A competição no Brasil é local. Ainda não temos marcas nacionais fortes, com exceção de uma ou duas marcas de nicho, que atendem a uma quantidade pequena da população. O nosso objetivo é expandir a atuação das nossas marcas. Todas elas devem ser competidoras nacionais, mas sendo muito relevantes em cada região onde atuam. A Laureate investiu bastante no ensino a distância, mas, dado o tamanho que ela tem, com base de aproximadamente 267.000 alunos, ainda há espaço para crescimento. Hoje, cerca de 50.000 pessoas estão matriculadas em seus cursos à distância. E, com a pandemia, esse tipo de ensino vai se acelerar. No fim, essa incorporação dos ativos da Laureate nos ajuda a criar a quarta maior instituição de ensino brasileiro em número de alunos e nos dá presença nacional, sendo importante para uma complementariedade regional que é bastante significativa. Enquanto a Laureate é muito forte no Sul e no Sudeste, nós temos grande presença no Norte e no Nordeste.

    Devido às limitações impostas para se evitar o contágio por Covid-19, as instituições de ensino se encontraram num cenário desafiador. Como tem sido esse momento para a Ser? O momento é, particularmente, difícil para as instituições educacionais. Com a pandemia, houve uma mudança no modelo de ensino, ainda que de forma temporária. E, mais importante, houve uma mudança na forma de se trabalhar. A maioria da população brasileira começou a trabalhar em home office. Com isso, as pessoas perceberam que também poderiam estudar em casa. Nesse período, nós fizemos algumas mudanças estratégicas, acelerando alguns produtos digitais que lançaríamos só no ano que vem. Nós desenvolvemos cursos que podem ser finalizados em tempo menor, com duração de 12 a 48 meses. A população mais jovem que está chegando às faculdades hoje é formada por pessoas que acabam mudando de emprego, de profissão e de função rapidamente. Para que essa transição aconteça da melhor forma possível, é necessário se preparar e adquirir novas habilidades e competências, o que só acontece com estudo. O aluno pode fazer, por exemplo, um curso de gestão financeira e outro de gestão de RH ao mesmo tempo em dois anos e escolher qual caminho que quer priorizar na reta final. Esse é um dos exemplos. A mudança de entendimento no modelo de trabalho e de educação durante a pandemia acelerou bastante e fez com que conseguíssemos antecipar alguns produtos com relativo sucesso.

    Como conter a evasão escolar em um momento tão conturbado como o que estamos vivendo? Antes de tudo, é importante separar a evasão do ensino presencial para o ensino a distância. No ensino presencial, uma parte dos alunos sai por problemas financeiros e a outra por problemas de aprendizado ou por ter escolhido o curso errado. No caso do ensino a distância existe outro componente, um pouco mais complexo, que é a capacidade de dedicação e disciplina do aluno. O aluno brasileiro não tem a disciplina e a dedicação para estudar sozinho na maior parte do tempo. Ele é um aluno que cresceu aprendendo a ser incentivado pelo professor a estudar na véspera da prova. E o EAD exige um tempo de dedicação de, pelo menos, 10 a 15 horas de estudo semanal individual. Isso é relativamente difícil. O isolamento mudou um pouco esse paradigma, porque as pessoas começaram a trabalhar em casa e tiveram um pouco mais de disciplina. Isso pode antecipar o crescimento do EAD.

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    E como será a educação no futuro? Imagino que o modelo de educação no futuro será híbrido, em que aquelas disciplinas mais teóricas sejam feitas de forma remota, e as aulas práticas sejam feitas de forma presencial. Além disso, o desenvolvimento da inteligência artificial se tornará cada vez mais presente. Hoje, já é permitido com que equipamentos, hardwares e softwares sejam capazes de ampliar o potencial de aprendizagem. Ao atrelar a tecnologia aos métodos de ensino, você cria trilhas de ensino individuais, permitindo com que se acelere ou diminua o ritmo para que o aprendizado seja feito da forma mais adequada possível. No futuro, o uso da tecnologia será intensivo tanto dentro como fora da sala de aula.

    O Fies, programa de financiamento estudantil do país, foi praticamente abandonado. Qual é a importância dele, sobretudo num momento delicado como este, para manter o índice de novos alunos no ensino superior brasileiro? O Fies no Brasil praticamente acabou. As poucas vagas que existem hoje não são preenchidas devido às diversas travas e burocracias colocadas no processo. No mundo inteiro, o ensino superior cresce se houver financiamento ou se a economia estiver indo relativamente bem. O Brasil é um país com uma das menores taxas de penetração do ensino superior para os alunos de idade universitária, entre 18 e 24 anos. Programas de financiamento são alternativas para isso. O que nós queremos é que o país saia desta pandemia sem uma crise financeira maior para que os alunos continuem nas escolas. Se houver uma evasão, uma fuga no ensino superior, vamos sentir isso daqui a alguns anos. Nenhum país se desenvolve se não tiver uma mão de obra qualificada e produtiva. E a qualificação da mão de obra só é feita por meio da educação.

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