O Brasil possui hoje uma das maiores taxas nominais do mundo na comparação entre as quarenta principais economias. Atualmente o Brasil é o segundo país com a maior nominal, em 13,75%, perdendo apenas para a Argentina, onde a taxa é de 75%. A taxa nesse patamar não é um evento inédito. Os juros no Brasil são historicamente altos, e há diversas razões para isso.
Uma das principais é a inflação, que já foi um problema crônico no país. “Não faz muito tempo que o Brasil saiu do histórico de hiperinflação comparado a outros países, como Estados Unidos e Europa que não vivenciavam isso há 40 anos”, diz Gustavo Cruz, estrategista da RB Investimentos. Por isso, a inércia inflacionária é um problema recorrente por aqui, que altera as perspectivas e aumenta a pressão sobre a inflação e os juros. Além disso, o especialista lembra que o BC sofreu uma grande interferência – não faz muito tempo – durante gestão da ex-presidente Dilma e o resultado foi desastroso para a economia.
Medidas econômicas erradas tomadas em gestões passadas ecoam no futuro e os seus efeitos, como a inflação, demoram a ser dissipados. Para controlar a inflação, o Banco Central (BC) aumenta a taxa básica de juros, a Selic, que por sua vez influencia os juros cobrados pelos bancos em empréstimos e financiamentos. A Selic em 13,7% é o principal motivo dos ataques de presidente Lula ao BC, mas além da inflação e da condução da política monetária, há fatores estruturais e crônicos que pressionam os juros pra cima.
O estrategista-chefe e sócio da Nomos, Rodrigo Correa, explica que a questão dos juros no Brasil se relaciona com as necessidades de financiamento do Estado, que tem um histórico de governos gastadores, incluindo políticas de aumento de gastos sociais expressivas. “Temos um histórico de populistas (praticamente todos os presidentes desde a redemocratização, a exceção de Michel Temer) que se fizeram às custas de mais gastos principalmente no último ano de governo, sem exceção. Os governos do PT têm claramente políticas de aumento de gastos sociais muito expressivas – aumento de salário mínimo, aumento do funcionalismo público, entre outros”, diz. A exemplo disso, o governo conseguiu recentemente a aprovação da PEC da Transição para financiar o Bolsa Família e outras promessas de campanha.
Além disso, a rigidez orçamentária é um problema no Brasil, com grande parte dos gastos destinados a custeio básico, sobrando pouco para investimentos. “O histórico ruim de inflação e moratórias, combinado com um Estado que gasta muito e gasta mal, leva a uma fragilidade fiscal e a necessidade de mais financiamento”, diz Correa. Assim, quanto mais dívida o Estado brasileiro toma, mais endividado ele fica e as taxas de empréstimos futuros aumentam, devido ao risco de crédito maior em relação à capacidade de pagamento.
Os juros subsidiados oferecidos pelos bancos públicos (Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil e BNDES) também contribuem para esse a manutenção da Selic alta. Essa modalidade de empréstimo é concedida a juros abaixo do praticado no mercado, criando distorções no mercado de crédito. Os bancos estatais emprestam principalmente para empresas com menor risco, deixando as outras para o sistema bancário privado, o que aumenta a desigualdade no sistema financeiro. Essa modalidade de empréstimo é financiada pelo Tesouro, e também agrava o déficit fiscal, pressionando os juros, como explicado anteriormente.
Além disso, a retomada do BNDES pelo governo Lula aumenta as incertezas no mercado ao reviver memórias do desastre do governo petista no passado que desencadearam uma das maiores crises econômicas e institucionais do país.
A concentração bancária é outro elemento que precisa ser considerado nessa manutenção histórica de taxas de juros elevadas no país. “No Brasil cinco grandes bancos – Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Bradesco, Itaú e Santander – são detentoras de, aproximadamente, 80% das operações de crédito. Esse oligopólio de ‘peixes grandes’ do mercado bancário dá poder de barganha frente às empresas e pessoas físicas que precisam de crédito”, explica Alex Kim, sócio da A7 Capital. A pouca concorrência permite que os bancos cobrem juros mais altos, e isso cria outro problema: a inadimplência. Clientes com empréstimos e financiamentos podem ter mais dificuldade para pagar as parcelas mais caras em dia. Por fim, a própria cultura brasileira favorece os altos juros. Como muitos brasileiros não têm o hábito de poupar dinheiro, acabam recorrendo ao crédito com mais frequência, o que faz com que a demanda por empréstimos seja alta e, consequentemente, os juros também.
A própria dinâmica do BC para controlar a oferta de crédito via juros compulsórios, aumentando ou diminuindo a taxa que os bancos são obrigados a recolher sobre os depósitos que mantêm no BC, alimenta esse patamar altista. “Se for comparado as alíquotas dos depósitos compulsórios do Brasil com os de países desenvolvidos, as do Brasil são muito mais elevadas. Um dos fatores é a inflação, que historicamente é bem alta”, diz. Em alguns países desenvolvidos, como Hong Kong, Reino Unido, Suécia, Austrália e Nova Zelândia, os compulsórios são ausentes. Atualmente, as taxas atuais são de 25% para depósitos a vista (até recentemente eram de 40%; em 2014 chegou a 45%), 20% para depósitos em poupança e 34% para os depósitos a prazo. “As elevadas alíquotas dos depósitos compulsórios gera uma menor oferta de recursos aos tomadores. E como consequência, o custo do dinheiro se eleva”, explica Kim.
Essa medida é usada para conter a inflação e estimular a economia. No entanto, os juros compulsórios têm um efeito colateral indesejado, que é o encarecimento do custo do crédito, já que os bancos precisam deixar mais dinheiro no BC e, consequentemente, têm menos recursos disponíveis para emprestar a pessoas e empresas. Com menos dinheiro em circulação, os bancos aumentam as taxas de juros para manter a lucratividade.