No dia 24 de fevereiro de 2022 o mundo acompanhava atônito a invasão da Rússia à Ucrânia, desencadeando um conflito militar que persiste até hoje, sem sinais de paz à vista. Na época, as previsões para a economia eram bastante pessimistas após a Rússia sofrer sanções rigorosas do Ocidente. Consequentemente, o rublo atingiu uma baixa recorde em relação ao dólar americano, o banco central russo aumentou significativamente as taxas de juros e a bolsa de valores de Moscou foi fechada por vários dias. Os economistas calculavam uma contração acima de 10% no PIB do país, mas a realidade é diferente das projeções.
De acordo com a Economic Expert Group, agência oficial de estatísticas da Rússia, a economia contraiu 2,1% em 2022, contrariando a previsão de queda de 12%. Na estimativa do banco central russo, a queda no PIB deve ser menor em 2023, de 1,5%. Se essa projeção se concretizar, o tombo seria de 3,6% no biênio, um número relevante, mas pequeno comparado a contrações registradas em outros países fora do contexto de guerra, como o Brasil, que chegou a cair mais de 6% entre 2015 e 2016. Segundo especialistas, existem várias razões pelas quais a economia russa superou as expectativas, mas a principal é o petróleo e o gás.
Apesar de a União Europeia ter sancionado as importações russas, o bloco continuou a comprar petróleo e gás russos durante grande parte do ano de 2022 devido à alta dependência energética. Além disso, os russos encontraram novos parceiros comerciais na China, Índia e Turquia, aumentando exportações para esses aliados e também se beneficiando com as chamadas importações paralelas, nas quais os produtos ocidentais chegam ao país por meio desses parceiros.
O banco central russo registrou um superávit comercial recorde de 227 bilhões de dólares em 2022, impulsionado em grande parte pelas exportações de energia do país. Segundo o Wilson Center, think tank de pesquisa independente, as receitas de petróleo e gás da Rússia em 2022 foram excepcionalmente altas, alcançando 164,2 bilhões de dólares de janeiro a novembro, um aumento de quase 30% em relação ao ano anterior. O número é relevante, mas ainda está abaixo da média de 60% registrado com receita de exportação antes da guerra. Mesmo com perda na exportação em volume, os altos preços do barril estão beneficiando o país.
A experiência russa em lidar com sanções há quase dez anos, desde a anexação da Crimeia em 2014, também tornou a economia resiliente. O banco central russo, que possui conhecimento em gerenciamento de crises, agiu rapidamente com elevação na taxa de juros para evitar fuga de capitais dos bancos e controlar a inflação. A inflação passou de 8,4% para 11,9% em 2022, enquanto a taxa de juros subiu de 9,5% para 20% assim que a guerra estourou. Atualmente, a taxa está em 7,5% com uma projeção de inflação de 6% para 2023, acima, porém, não muito distante, da meta estabelecida pelo banco central de 4%.
Em entrevista para a o jornal alemão Deutsche Welle, Christopher Weafer, sócio-fundador da Macro-Advisory Ltd Weafer, consultoria independente para investidores alocados na Rússia, diz que a década de sanções que o país enfrentou testou fortemente seus bancos, e o país se tornou relativamente autossuficiente em indústrias cruciais, especialmente na produção de alimentos.
Mas especialistas da Wilson Center calculam que, se o preço da mistura dos Urais, o principal tipo de petróleo exportado pela Rússia, se mantiver em 50 dólares ao longo de 2023, o orçamento russo terá uma perda de cerca de 7,7% de suas receitas. Com o mundo se encaminhando para uma recessão, a demanda por petróleo deve frear e a Rússia pode começar a sentir o declínio na sua economia.