Desde o Egito antigo a maquiagem é um manifesto de autoestima e de libertação femininas. É um modo de comunicação que, associado aos avanços dos cuidados com a saúde, ganhou nos últimos anos versões com tecnologia de ponta, afeitas a evitar danos para a tez. Houve saltos extraordinários — à exceção de itens adequados às peles pretas e pardas, deixadas à deriva. Para elas, foi sempre difícil encontrar uma base, pó ou corretivo facial no tom certo, sem diferenças bruscas em relação à tonalidade original do rosto. Há, finalmente, boas mudanças — de 2019 para cá, o mercado atrelado a esse tipo de necessidade cresceu 40%. Deu-se o gatilho com uma coleção de produtos lançados em 2017 pela cantora e empresária Rihanna, com a marca Fenty Beauty, que chegou neste ano ao Brasil. São cinquenta cores de corretivos, metade em versões medianas e escuras, em que há a maior lacuna de oferta. Há menos de um mês, a gigante Avon anunciou que oferecerá, até 2021, 53 novos produtos dedicados aos rostos escuros, entre bases, iluminadores e blushes. Grifes como Dior e Lancôme começam a reagir, e já apostam na diversidade. “A situação era tão ruim que as consumidoras de pele negra desistiam da compra por falta de opção”, diz a vice-presidente de marketing da Avon, Danielle Bibas. Deu-se, agora, uma pequena revolução.
E, como quase tudo no mundo hoje, os primeiros ecos nasceram nas redes sociais. Postagens no Instagram e no YouTube deram um bom empurrão para o avanço no setor, ao escancarar meninas ávidas por novidades em maquiagem reclamando em alto e bom som quando uma nova linha de beleza não atendia às suas demandas. Elas eram obrigadas a misturar vários produtos para chegar a uma tonalidade que não deixasse a pele manchada e artificial. “É preciso ainda haver mudanças em muitos itens, mas conquistamos um relevante espaço”, diz Maria Lima, maquiadora carioca especialista em beleza negra. Pode-se dizer, parafraseando o ruidoso lema de 2020: vidas (e peles) pretas importam.
Publicado em VEJA de 9 de dezembro de 2020, edição nº 2716