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‘Estamos nos distanciando da dependência de telas’, diz Andrew McLuhan

Em entrevista exclusiva a VEJA, neto de Marshall McLuhan aborda sua visão sobre as tecnologias e o futuro delas em nossa sociedade

Por Luana Zanobia Atualizado em 1 out 2024, 13h54 - Publicado em 1 out 2024, 11h01
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  • Andrew McLuhan
    Andrew McLuhan, neto de Marshall McLuhan (Divulgação/VEJA)

    O “meio é a mensagem” e “aldeia global” são termos amplamente conhecidos entre os estudiosos da comunicação. Embora cunhados em 1958, esses conceitos permanecem extremamente atuais. As tecnologias têm transformado continuamente a maneira como os conteúdos são disseminados: evoluímos da era do rádio, passamos pela televisão e agora nos encontramos diante de várias telas com a internet. Essas inovações nos aproximaram, permitindo que nos comuniquemos instantaneamente com pessoas de diferentes partes do mundo. Como afirma Andrew McLuhan, neto de Marshall McLuhan, renomado teórico da comunicação e criador desses conceitos, “a aldeia agora virou a mesma casa”.

    A internet não só estreitou distâncias, como também ampliou o acesso à informação, disseminando notícias em inúmeros canais e formatos. No entanto, essa era digital também trouxe consigo polarização e fragmentação. “Essa fragmentação permite a criação de bolhas informacionais, onde as pessoas consomem apenas conteúdos que reforçam suas crenças, em vez de serem confrontadas por visões opostas. Não se trata apenas de desinformação, mas de informação seletiva”, observa Andrew. Seguindo os passos de seu avô, que antecipou as transformações tecnológicas na comunicação, Andrew, atualmente à frente do McLuhan Institute, prevê que as telas estão caminhando para um ponto de esgotamento.

    “As tendências indicam que muitos dispositivos estão se afastando das telas. Com a ascensão da IA, o foco está se voltando para a interação auditiva, priorizando a entrada e saída de voz. Estamos nos distanciando da dependência das telas”, ressalta. Andrew, que está no Brasil para participar do lançamento do livro Brand Publishing na Prática, de Paulo Henrique Ferreira, concedeu uma entrevista exclusiva a VEJA. Confira abaixo.

    Como você vê a evolução do conceito de “o meio é a mensagem” hoje em dia? O conceito em si não mudou muito desde que foi introduzido pelo meu avô, Marshall McLuhan em 1958, mas sua relevância cresceu significativamente. O que meu avô dizia é que as mudanças na sociedade geralmente acontecem pelas tecnologias que usamos, em vez de seu conteúdo. Esse princípio continua sendo verdadeiro, e tornou-se ainda mais importante à medida que nos tornamos mais dependentes da tecnologia. O ritmo da mudança é muito rápido agora — novas e mais poderosas tecnologias estão surgindo constantemente. Se não começarmos a descobrir como gerenciar essas mudanças e antecipar seus efeitos, as consequências podem ser graves.

    Seu avô falou sobre a “aldeia global”, prevendo a interconexão que a tecnologia traria para as pessoas. Hoje, no entanto, estamos testemunhando tensões políticas e fragmentação digital. Você acha que essas tecnologias estão  se desintegrando ou evoluindo para algo novo? Eu acredito que está evoluindo. Quando Marshall McLuhan falou pela primeira vez sobre a aldeia global, ele se referia ao telégrafo e ao rádio, que aproximaram as pessoas. À medida que avançamos para a era digital, o mundo encolheu ainda mais. Nós ultrapassamos a ideia de uma aldeia global — é quase como se estivéssemos vivendo em uma casa compartilhada agora, dada a interconexão de tudo. Passamos de um globo para uma “aldeia global” e continuamos a nos aproximar. Estamos tão conectados que a distância física deixou de ser relevante. Isso tem um significado enorme.

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    Com o aumento da desinformação e dos debates polarizados, você acha que a internet e as redes sociais perdeeam seu propósito original? Isso é um progresso natural com qualquer tecnologia. Quando a Internet foi desenvolvida pela primeira vez, ela foi vista como uma utopia para compartilhar e conectar. Mas, com o tempo, à medida que convivemos e nos adaptamos à tecnologia, ela encontra sua própria direção. As redes sociais, por exemplo, começaram como uma maneira de conectar pessoas, mas agora evoluíram para algo muito mais complexo. Provavelmente veremos o mesmo acontecer com a IA — agora estamos focados em como a IA pode melhorar nossas vidas, mas em alguns anos, certamente olharemos para trás e veremos como seu impacto divergiu das nossas expectativas iniciais.

    No Brasil, temos visto casos em que plataformas de mídia social, como o X (antigo Twitter), foram bloqueadas. Você acha que isso representa uma ameaça à liberdade de expressão ou é uma medida necessária para o controle governamental sobre plataformas digitais? É um assunto complicado. Os governos geralmente têm as melhores intenções ao implementar tais medidas, mas é difícil encontrar o equilíbrio certo. Em alguns casos, pode parecer como fechar a porta do celeiro depois que o cavalo já fugiu. Bloquear plataformas é uma abordagem muito brusca, e embora possa ser eficaz a curto prazo, não é uma solução de longo prazo. O desafio é descobrir como gerenciar essas plataformas de uma maneira que equilibre a liberdade de expressão com a necessidade de regulação.

    Falando em tecnologia, como você acha que a IA continuará a influenciar as redes sociais e a comunicação humana? Acho que a IA terá um impacto comparável ao da Internet. Assim como a Internet remodelou todos os aspectos da sociedade — nossos relacionamentos, nosso trabalho, até mesmo nossa espiritualidade — a IA tem o potencial de fazer o mesmo. A questão chave que precisamos nos perguntar é: o que valorizamos? Uma vez que soubermos o que valorizamos, podemos começar a avaliar se essas novas tecnologias apoiarão ou minarão esses valores. É aí que a conversa precisa começar.

    Você acha que a fragmentação das plataformas de mídia está afetando a credibilidade das notícias? A fragmentação das plataformas de mídia está tendo um impacto profundo na credibilidade das notícias, e não se trata apenas de confiança — é também sobre como processamos a informação. No passado, tínhamos um número limitado de fontes de notícias, então a credibilidade era mais fácil de manter. Agora, com tantas plataformas oferecendo notícias, o volume de informações torna difícil discernir o que é confiável e o que não é. Cada plataforma tem sua própria agenda, seus próprios vieses e métodos de curadoria de conteúdo. Essa fragmentação permite a formação de bolhas informacionais, onde as pessoas consomem informações que se alinham com suas crenças já existentes, em vez de serem desafiadas por perspectivas diferentes. Não se trata apenas de desinformação; trata-se de informação seletiva.

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    Você acredita no fim  das revistas e jornais impressos? Não, eu não acredito nisso. Os rumores sobre a morte dos livros são bastante exagerados. Veja os livros: hoje, há mais livros no mundo do que em qualquer outro momento da história. Eles não estão desaparecendo, estão mais fortes do que nunca. O mesmo vale para as revistas. Existe um pensador francês chamado Lamartine que, quando os jornais eram novidade, afirmou que “o livro chega tarde demais”. A ideia dele era que um livro leva anos para ir do conceito à prateleira. Curiosamente, acredito que as revistas continuarão sendo relevantes justamente porque elas ocupam um espaço interessante entre os dois extremos. Uma revista, que pode ser semanal ou mensal, oferece um tempo maior para aprofundar as questões, mas ainda mantém uma certa agilidade. Uma equipe de repórteres pode trabalhar em uma matéria por algumas semanas ou meses, garantindo que haja mais profundidade do que num jornal, na TV ou numa rede social. Por isso, acho que as revistas continuarão desempenhando um papel importante no futuro.

    E sobre as redes sociais, você acredita que estamos atingindo o limite de saturação? Sim, acho que estamos em um momento muito interessante para as redes sociais. Tenho pensado bastante sobre isso porque, quase sem exceção, as redes sociais são baseadas em telas. Isso parece um fato simples, mas se você desligar a tela, o que acontece com as redes sociais? A maior parte delas simplesmente desaparece. Observando as tendências de novos dispositivos, muitos estão se afastando das telas. E com a IA, a tendência está mais voltada para o uso da audição do que da visão, com foco na entrada e saída de voz. Estamos nos distanciando da dependência de telas. As pessoas estão percebendo que essa obsessão com as telas está ficando cansativa e querem estar mais presentes, levantar a cabeça e aproveitar o momento.

    O que isso significa para as redes sociais? Isso pode significar que plataformas como Twitter ou X, se você retirar a tela do smartphone, deixam de existir, o mesmo vale para Instagram, Facebook e outras. As redes sociais podem precisar se reinventar, ou talvez descubramos que não queremos mais gastar tantas horas do nosso dia nelas. De qualquer forma, acredito que estamos em uma encruzilhada quando se trata de redes sociais.

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