Se as eleições de 2018 foram marcadas pela pauta anticorrupção, sob a influência da Operação Lava-Jato, a expectativa para 2022 é que a economia assumirá o centro das discussões. Estudo elaborado pela empresa de pesquisas Quaest para a Genial Investimentos mostra que mais de 40% da população considera a situação econômica o principal problema do país, à frente de tópicos como saúde e até mesmo corrupção. Essa preocupação cresceu especialmente no segundo semestre de 2021 — em julho, a gestão econômica era a maior fonte de aflição para 28% dos brasileiros. E mesmo que o desemprego, a taxa de juros e a inflação deem uma aliviada, ainda prometem permanecer num nível alto no próximo ano, segundo os analistas.
São perspectivas que incomodam Jair Bolsonaro, em busca da reeleição. Em contrapartida, oferecem um norte claro de ação aos postulantes interessados em ocupar a cadeira presidencial. Antecipando-se a isso, o candidato do PSDB à Presidência e atual governador de São Paulo, João Doria, largou na frente dos adversários. Ele apresentou publicamente um grupo de economistas respeitados, dotados de experiência nos setores público e privado, para mostrar a atenção que dedicará ao tema. São eles: Henrique Meirelles, secretário de Fazenda de São Paulo; Ana Carla Abrão, ex-secretária de Fazenda de Goiás; Vanessa Canado, ex-assessora especial do ministro da Economia Paulo Guedes para assuntos tributários; Zeina Latif, ex-economista-chefe da XP; e Patricia Ellen, secretária de Desenvolvimento Econômico de São Paulo e coordenadora da campanha. Segundo pessoas próximas, dois outros nomes de peso devem ser incluídos no time nas próximas semanas.
Mesmo antes de ter sua equipe completa, o anúncio de Doria resulta em um tiro certeiro. Se o governador patina na preferência do eleitorado e tem taxa de rejeição alta nas pesquisas, não é por causa da gestão da economia em seu estado. Em 2020, quando o país amargou queda de mais de 4% do produto interno bruto (PIB), São Paulo encerrou o ano com estabilidade. Para 2021, as projeções para o crescimento giram entre 7% e 8% — o dobro do previsto para o Brasil.
Com suas escolhas, Doria também estabeleceu uma hierarquia clara de temas em sua luta pelo Palácio do Planalto. Meirelles foi presidente do Banco Central durante o governo Lula e ministro da Fazenda de Michel Temer (MDB), quando iniciou um programa de controle fiscal, depois dos erros na gestão das contas públicas no governo anterior, e buscou a retomada dos investimentos privados. Foi ele que acelerou o processo que levou à aprovação da reforma da Previdência, que acabou acontecendo em 2019. Como o mais experiente, o ex-ministro será o porta-voz do time de Doria, mesmo que siga com seus antigos planos de concorrer ao Senado por Goiás. A economista Ana Carla tem seus trabalhos e pesquisas voltados para uma reforma administrativa ampla e é defensora da racionalização dos custos do funcionalismo público. Vanessa Canado foi uma das autoras do texto que serviu de base para a PEC 45, o projeto de reforma tributária que tramitou na Câmara, mas que foi enterrado pelo governo ao priorizar outras propostas — que não vingaram. Por sua vez, Zeina é uma respeitada economista, com ampla experiência no setor privado em bancos como HSBC e Banco Real e grande conexão com o mercado financeiro. “A preocupação é com a economia e o lado social”, afirma Meirelles. “No programa, estarão contempladas as reformas administrativa e tributária, o aumento da produtividade e uma agenda de privatizações, concessões e investimentos em infraestrutura.”
Na atual situação do país, seria importante que outros candidatos seguissem o exemplo de Doria. Apesar de anunciar o experiente Affonso Celso Pastore, um respeitado ex-presidente do BC, como seu “Posto Ipiranga”, Sergio Moro ainda não avançou além do esboço de suas diretrizes econômicas. O presidente Bolsonaro, salvo drástica mudança de rumo, aposta em um projeto de cunho populista que flerta perigosamente com a irresponsabilidade fiscal. Lula, em posição confortável nas pesquisas, parece estar calculando o momento certo de acenar qual será sua orientação — o flerte com o ex-governador Geraldo Alckmin para a Vice-Presidência sinaliza um caminho mais centrista, como o que seguiu após sua primeira eleição, em 2002. Vinte anos depois, a economia volta ao centro da disputa.
Publicado em VEJA de 29 de dezembro de 2021, edição nº 2770