É comum dizer que timing é tudo. O novo governo foi eleito com uma chance de ouro nas mãos: promover reformas que colocariam o Brasil de volta ao trilho do crescimento. No começo do ano, Fernando Haddad assumiu o Ministério da Fazenda e, comprometido com essa agenda, prometeu um novo arcabouço fiscal, em substituição ao antigo teto de gastos. Com a proposta arrojada de zerar o déficit — ou seja, não gastar mais do que arrecada —, o texto foi aprovado, o que fez parecer que o país, enfim, ingressaria em uma nova era. Bom… vamos ter de aguardar 2024.
O equilíbrio fiscal, um dos pressupostos para o arcabouço funcionar, não apenas não foi cumprido como deteriorou-se no primeiro ano do governo Lula (e o presidente tem grande parcela dessa responsabilidade). No acumulado dos dez primeiros meses do ano, as contas públicas registraram déficit de 114 bilhões de reais. Agora, a projeção do rombo para 2023 é de nada desprezíveis 177 bilhões de reais, sendo que, no início do mandato, o ministro Haddad havia prometido limitar o déficit do ano em 100 bilhões de reais. Assim fica difícil imaginar a execução de déficit zero em 2024, uma promessa da atual gestão.
Houve vitórias, é verdade. Ao menos, o país conseguiu promulgar uma reforma tributária que aliviasse o emaranhado de impostos e a carga que sufocam a sociedade brasileira. O texto, ressalve-se, tem qualidades e, em diversos sentidos, simplifica o nó tributário. Mas embute algumas imperfeições, sendo a mais visível delas as exceções que deverão elevar o novo imposto sobre valor agregado (IVA) para aqueles que não serão alcançados por privilégios. Cálculos indicam que os regimes especiais concedidos a setores — que são muitos — resultarão numa alíquota-base de 27%, ante 22% inicialmente esperados. Isso deixa o Brasil com o IVA mais alto entre os países que adotam o imposto único.
Na lista de deveres a fazer, ainda não conseguimos desatar também outra reforma importante, mas sempre negligenciada: a administrativa. Essa é necessária para modernizar a máquina pública, acabar com “supersalários” e extinguir cargos em duplicidade, entre outros avanços. Ou seja: ainda há muito trabalho pela frente.
Publicado em VEJA de 22 de dezembro de 2023, edição nº 2873