As contas do governo brasileiro sofrem de um desequilíbrio profundo e estrutural, consequência direta do gigantismo do estado. É necessário repensar se a sociedade quer manter e precisa de um setor público que gasta 27,7 milhões de reais por dia para bancar o funcionamento do Congresso, para ficar apenas em um exemplo. A avaliação é do economista Gil Castello Branco, diretor da ONG Contas Abertas, especializada na análise das finanças públicas. Ele diz que a equipe econômica do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, foi obrigada a prever um déficit do Orçamento maior neste ano e em 2018, de 159 bilhões de reais, porque dispõe de pouca margem de manobra para cortar despesas e porque ninguém está disposto a dar a sua cota de sacrifício. “A grande consequência dessa penúria será a obrigação da sociedade de repensar o tamanho do Estado.” Leia abaixo a entrevista a VEJA:
Por que o governo mudou a meta e passou a prever um déficit fiscal maior neste ano? Neste ano, da maneira como tudo estava caminhando, restavam poucas alternativas ao governo. O governo tem pouca margem de manobra. As despesas com pessoal, a Previdência e os benefícios da Lei Orgânica da Assistência Social consomem praticamente 70% da despesa primária. É óbvio que existe algum problema, sobretudo quando a despesa com a Previdência cresce de maneira exponencial. Só isso já seria o bastante para desequilibrar as contas públicas brasileiras.
O Estado brasileiro é grande demais? É possível dar exemplos? Há inúmeros exemplos. Apesar das críticas às privatizações, o fato é que ainda existem 151 empresas estatais. Elas têm mais de 500 000 funcionários. A União tem 28 ministérios. São mais de 20 000 cargos de assessoria. O Congresso tem um custo diário de 27,7 milhões por dia. Um deputado chega a ter 25 assessores. O Poder Judiciário tem pagamentos que são absurdos, como o auxílio-moradia para juízes, algo que depois foi estendido para promotores e para o Tribunal de Contas do Distrito Federal. Esse auxílio chega a ser pago até para quem tem imóvel próprio na cidade. Por fim, o governo ainda concede subsídios financeiros creditícios para a Zona Franca de Manaus, a agricultura, o Sistema S… Em 2016, a conta de subsídios somou 114,7 bilhões de reais. Será que todos esses benefícios estão sendo benéficos ao Estado de uma forma geral?
Não é possível diminuir alguns desses privilégios? O Brasil tem um Estado paquidérmico, ineficiente e corporativo. Ninguém está disposto a entregar um anel. Em uma época de crise fiscal e econômica como a atual, o Tribunal de Contas do Distrito Federal está reivindicando a equiparação do pagamento do auxílio-moradia de forma retroativa. É uma situação muito difícil. A grande consequência positiva dessa penúria será a obrigação da população de repensar o tamanho do Estado.
Quais são os caminhos para sair desse déficit? É preciso passar um pente fino na estrutura do Estado e atacar os grandes grupos de despesas: a Previdência, a folha de pagamento de pessoal, os subsídios e as isenções fiscais. Forçosamente, isso terá que acontecer. Não é só questão da administração pública federal; envolve estados, municípios, os três poderes, as estatais. O país não pode repetir metas deficitárias dessa magnitude, que são financiadas pelo endividamento.
Qual o papel do Executivo e do Congresso nessa lição de casa? Os gastos que não são obrigatórios já foram reduzidos pelo governo. Os investimentos, por exemplo, foram cortados praticamente pela metade. O governo também diminuiu o gasto com a administração dos ministérios. O problema é que esses gastos equivalem a só 10% das contas do governo e ele precisa do Congresso para reduzir as despesas obrigatórias, sobretudo as da Previdência, que representam o maior rombo. Isso significa que, se o Congresso não for solidário – e ele não tem sido –, essa situação pode fazer com que o governo descumpra a meta fiscal. Os problemas podem se agravar se o governo não conseguir as receitas extraordinárias esperadas.