Desde o ano passado, o monitoramento das entregas e a operação dos guindastes do Brasil Terminal Portuário (BTP), o maior da América do Sul no despacho de contêineres, com 430 000 metros quadrados na cidade de Santos (SP), são feitos a partir de uma central de comando remota. Os equipamentos são guiados por sistemas de comunicação capazes de “conversar” entre si e que podem ser ajustados mesmo a distância. A tecnologia trouxe grandes ganhos. Com os novos recursos, a atividade portuária ficou mais ágil, equiparando as práticas do BTP às mais sofisticadas do mundo. Inédita nos portos brasileiros, a operação só se tornou possível após o advento da internet 5G. Com ela, a capacidade de conexão da rede local saltou de 30 megabytes para 1 gigabyte, e a velocidade de comunicação entre os equipamentos disparou — a latência, tempo necessário para transferir informações de um aparelho a outro, caiu 99%.
O caso descrito acima mostra como a chegada do 5G, a quinta geração da internet móvel, está provocando grandes mudanças em diversos setores econômicos — em especial naqueles em que as máquinas precisam trocar informações e trabalhar em conjunto. O 5G é até 100 vezes mais veloz do que o 4G e suporta até um milhão de dispositivos conectados simultaneamente por quilômetro quadrado — ou 900% mais do que a versão anterior. Não à toa, é na indústria que a tecnologia deverá provocar os maiores impactos. De fato, a internet 5G levará à maior automação de máquinas, permitirá o uso irrestrito da inteligência artificial e fará o conceito de internet das coisas (IoT, na sigla em inglês), que consiste na conexão de vários equipamentos ao mesmo tempo, se expandir pelas áreas de manufatura.
Projetos baseados no uso da nova tecnologia começam a aparecer no Brasil. Em 2021, o grupo ítalo-franco-americano Stellantis, em parceria com a empresa de telecomunicações TIM e a consultoria Accenture, inaugurou o que alega ser a primeira operação 5G da indústria automobilística no país. Em sua fábrica em Goiana (PE), sistemas conectados ajudam a assegurar a qualidade do processo de montagem. Funciona assim: as traseiras dos veículos recebem etiquetas que os identificam, enquanto uma câmera captura imagens de sua movimentação na linha de produção. Os dados são enviados em tempo real para um sistema em nuvem, e um software de inteligência artificial informa aos operadores de inspeção de qualidade se todo o processo de montagem ocorreu como o planejado.
As fábricas inteligentes, contudo, são raridade no Brasil. Um levantamento feito pela consultoria Teleco indica que, entre 2020 e 2023, apenas onze indústrias instalaram redes privativas de 5G. “A modalidade engatinha no país”, diz Eduardo Tude, presidente da Teleco. Segundo Juarez Quadros, ex-presidente da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), a maior barreira para a adoção do 5G na indústria é o alto custo de instalação. “Quem não precisa de conectividade mais rápida vai demorar para trocar”, diz Quadros. Esperar muito, porém, pode custar caro — há o risco de a empresa ficar para trás e perder o bonde da competitividade.
Fora do Brasil, o 5G e a IoT caminham a passos largos. Em países como Estados Unidos, China e Austrália, caminhões autônomos realizam o trabalho pesado na mineração — e isso devido à rede de internet mais veloz. Com capacidade de se movimentar sozinhos, os veículos têm como maior apelo o aumento na segurança das minas, já que boa parte dos acidentes está associada a deslizamentos de terra. Segundo uma pesquisa do instituto Allied Market, o mercado de caminhões autônomos de mineração deverá ser avaliado em 1,6 bilhão de dólares em 2025 e alcançar 12,5 bilhões de dólares até 2035. Trata-se de um exemplo de como inovações tecnológicas podem trazer ganhos extraordinários para todas as atividades econômicas. E o avanço é rápido: estima-se que as redes 5G estarão disponíveis para um terço da população mundial já em 2025. O Brasil precisa acelerar projetos na área, para não perder mais uma oportunidade.
Publicado em VEJA de 31 de maio de 2024, edição nº 2895