Apesar de abrigar uma das sete maravilhas do mundo moderno — o Cristo Redentor —, ser berço de grande parte da Floresta Amazônica, ter praias deslumbrantes e dispor de capitais cosmopolitas como São Paulo, o Brasil nunca conseguiu se consolidar na rota do turismo mundial, recebendo menos de 1% dos viajantes internacionais do planeta. Até hoje, o país não alcançou a marca de 7 milhões de turistas estrangeiros em um ano, número que é apenas uma fração dos 100 milhões que visitam a França e dos 85 milhões que vão à Espanha anualmente — e abaixo de destinos tropicais semelhantes, como o México, que recebe 42 milhões de visitantes anuais, e a Tailândia, com 28 milhões. A boa notícia é que, aos poucos, o interesse pelo Brasil dá sinais de melhora.
De janeiro a agosto de 2024, os turistas internacionais desembolsaram o valor recorde de 4,8 bilhões de dólares no Brasil, o equivalente a 26 bilhões de reais, de acordo com dados do Banco Central. O montante alcança até o observado em 2014, ano em que o país sediou a Copa do Mundo de futebol. O fluxo de visitantes também tem aumentado, e, se as projeções do Plano Nacional de Turismo se confirmarem, o país alcançará uma nova marca máxima de 6,6 milhões de viajantes vindos do exterior em 2024.
Os avanços fazem parte de uma tendência global de crescimento do turismo, que registrou um aumento de 11% nos primeiros sete meses de 2024 na comparação com o mesmo período de 2023, confirmando a retomada verificada no pós-pandemia. Acompanhando essa recuperação, o Brasil tem conseguido restaurar a oferta de voos para os níveis anteriores à crise da covid-19, com um crescimento neste ano de quase 15% em relação a 2023. Outro fator que afeta positivamente a demanda turística, segundo pesquisadores, é a melhora na percepção geral sobre o Brasil, depois da crise de reputação atribuída à má gestão da pandemia e ao descuido com a pauta ambiental. “A imagem do país no exterior influencia a decisão do turista de realizar a viagem, e notícias negativas prejudicam essa avaliação”, diz Glauber Santos, professor de economia e administração do turismo da Universidade de São Paulo.
Apesar do momento favorável, há muito a fazer. “A comunicação do Brasil no exterior ainda não é boa”, afirma Mariana Aldrigui, ex-chefe de pesquisa da Embratur e pesquisadora da USP. “A maioria das informações em inglês sobre o país carrega uma conotação negativa.” Especialmente para potenciais visitantes de países desenvolvidos, a dificuldade de encontrar quem se comunique em inglês e a percepção de insegurança nas cidades são fatores de preocupação que, por vezes, afastam os turistas. Em setembro, jogadores do Philadelphia Eagles declararam publicamente que não gostariam de viajar para a partida da NFL, a liga de futebol americano, em São Paulo, por considerar a cidade perigosa demais.
Uma pesquisa da Embratur mostrou que apenas 57% de potenciais viajantes, de diversas regiões do mundo, consideram que o país oferece sensação de segurança — ante 74% na Austrália e 66% nas ilhas caribenhas, destinos concorrentes do Brasil. “Nós temos um dos maiores potenciais de turismo do planeta, mas precisamos de mais promoção positiva no exterior”, diz Vinicius Lummertz, presidente do conselho do grupo hoteleiro Wish e ex-ministro do Turismo.
Outro desafio relevante para colocar o país na rota do turismo é a logística aérea, já que a malha de voos é má distribuída. Atualmente, 54% dos viajantes internacionais chegam ao país pelo Aeroporto de Guarulhos, na Grande São Paulo, e a baixa oferta de conexões encarece e torna mais demorada a viagem para destinos no Norte e no Nordeste. Não à toa, o fluxo de turistas domésticos no Brasil continua sendo três vezes maior que o de viajantes internacionais, e mesmo destinos pensados para receber estrangeiros, como a Costa do Sauípe, complexo de resorts no litoral norte da Bahia, seguem impulsionados pela demanda local. “Nosso grande desafio é fazer uma conexão aérea mais robusta com o Nordeste e, principalmente, com o Norte”, diz Marcelo Freixo, presidente da Embratur.
A expectativa é que a COP30, conferência da ONU sobre as mudanças climáticas que será sediada em Belém em 2025, funcione como a próxima mola do turismo no país — tanto em termos de avanço na infraestrutura quanto do fortalecimento da imagem positiva. “Será decisivo para colocar a Amazônia na rota mundial”, afirma Freixo. Para que isso se consume e o país se firme como um destino pronto para receber o mundo, será preciso resolver problemas e acertar a entrega de uma boa COP em Belém.
Publicado em VEJA de 18 de outubro de 2024, edição nº 2915