A eleição do próximo ano deve gerar muita polarização, ainda mais com os nomes que já são dados como certos na disputa presidencial e com uma terceira via ainda indefinida. O ex-ministro da Justiça Sérgio Moro (Podemos) tem se vendido como o candidato da terceira via, mas o mercado parece não ter comprado a viabilidade dessa ideia. Para os economistas e estrategistas entrevistados por VEJA, os três principais candidatos que disputam o Executivo no próximo ano – Bolsonaro, Lula e Moro – contribuem para o aumento do risco Brasil.
Segundo Erminio Lucci, CEO da BGC Liquidez, a subsidiária brasileira da corretora BGC Partners, de Nova York, ainda não existe um nome de consenso entre os investidores. Para os analistas, o mercado deve continuar bastante volátil até conhecer as equipes econômicas e as propostas de cada candidato. Até lá, o mercado deve ser manter “nervoso e estressado”. As incertezas quanto ao futuro do Brasil nos próximos anos deterioram ainda mais o cenário econômico já bastante desfavorável e desgastado pelos riscos fiscais. O risco Brasil medido pelo EMBI+ (Emerging Markets Bond Index Plus) aumentou 28,7%, saindo de 261 pontos no início do ano para 336 pontos nesta terça-feira, 16, e as expectativas não são de melhoria com a aproximação das eleições. O índice funciona como uma espécie de termômetro para medir o grau de percepção dos investidores sobre o país e quanto maior o número, maior é a insegurança. A bolsa brasileira, B3, tem sido um reflexo dessa percepção. O Ibovespa, principal índice de ações da B3, registra queda de 6,74% em outubro e de 13% no ano. Na semana passada, em apenas um dia os investidores estrangeiros retiraram 509,718 milhões da B3 com a piora do cenário inflacionário, que acumula alta de 10,67% em doze meses deve continuar fora da meta em 2022, em 5% ao ano. “O estrangeiro tem várias opções de investimento no mundo. Para ele apostar ou realocar portfólio para o Brasil, é preciso que haja uma melhora na visibilidade da política econômica e no crescimento do país”, diz.
De um lado, a desastrosa atuação econômica do atual governo amedronta o mercado com uma possível reeleição de Bolsonaro. Antes visto como bons olhos devido à sua equipe econômica de cunho liberal liderada por Paulo Guedes, economista renomado e apreciado pelos investidores, hoje o nome de Bolsonaro passa longe de ser considerada uma boa opção entre os principais agentes econômicos. “Nas eleições de 2018, o mercado precificava bem os candidatos mais liberais. Bolsonaro se apresentou como um político liberal, mas isso ficou apenas no discurso, na prática ele não foi nada liberal”, diz Davi Lelis, chefe de renda variável da Valor Investimentos.
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva também tem sua reputação prejudicada. Além do envolvimento no escândalo da Lava Jato, que culminou na sua prisão em 2018, o petista é visto como um defensor de uma política intervencionista, o que não agrada o mercado. Na outra ponta, para polarizar ainda mais a disputa, o ex-ministro da Justiça, Sérgio Moro, grande figura responsável pela operação Lava Jato e pela condenação de Lula, confirmou sua candidatura na disputa presidencial. Ao contrário de Bolsonaro e Lula que já são conhecidos por suas posturas políticas e econômicas, ele ainda é uma incógnita no campo econômico. “Moro não transparece segurança, ele começa a aparecer como um candidato da terceira via, mas ainda sem o apoio do mercado”, avalia Lelis.
Crescimento
Além do cenário eleitoral, o mercado se preocupa com as perspectivas de crescimento econômico nada animadoras. O Boletim Focus e os principais bancos já projetam um PIB abaixo de 1% ou até mesmo de zero no próximo ano. O próprio Ministério da Economia baixou as expectativas para o PIB para o próximo ano, mas destoa do resto das previsões pelo maior otimismo em comparação aos principais bancos. Segundo o Boletim Macrofiscal, divulgado nesta quarta-feira, 17, o governo projeta um crescimento de 2,1% no próximo ano, menor que a estimativa anterior de 2,5%.
O mercado já temia que novas medidas populistas de Bolsonaro pudessem deteriorar ainda mais o cenário econômico, na busca pela sua reeleição. O presidente prometeu nesta terça-feira, 16, reajustar o salário de todos os servidores públicos caso a PEC dos Precatórios venha a ser aprovada. O texto, que abre espaço de 91,6 bilhões de reais no orçamento, foi aprovado na Câmara dos Deputados na semana passada e agora depende de aprovação do Senado, votação que está agendada para a próxima semana.
A fala traz ainda mais instabilidade para o cenário fiscal. Segundo especialistas, a PEC não abre espaço para este reajuste, pois a maior parte desses recursos serão destinados para o Auxílio Brasil (novo Bolsa Família), que tem um custo estimado de 51,1 bilhões para 2022, sendo 20% deste valor devido ao reajuste da parcela de 189 reais para 400 reais. O Auxílio Brasil começou a ser pago nesta quarta-feira, 17, para as 14,5 milhões de famílias que recebem o Bolsa Família — por enquanto, no valor de 217,18 reais.
Segundo os analistas, as falas políticas de cunho populistas têm azedado o ânimo dos investidores. Na terça-feira, 16, a bolsa repercutiu a promessa de Bolsonaro e fechou em queda de 1,82%, alcançando os 104,4 mil pontos. A fala continuou mal digerida nesta quarta-feira, 17, com a bolsa fechando em queda de 1,39%, a 102,9 mil pontos. “A PEC nem foi aprovada e já está em discussão outros gastos. Tudo isso coloca em risco não só teto dos gastos, mas também a relação dívida/PIB do Brasil, e obviamente este alinhamento de problemas não ajuda os investimentos no mercado acionário brasileiro”, diz Mauro Morelli, estrategista-chefe da Davos Investimentos.
Bolsonaro tem criado imensos desafios nas contas públicas para o próximo presidente, inclusive para ele mesmo, caso venha a ser reeleito. Para o Brasil voltar a crescer e ganhar a confiança dos investidores, precisa colocar em ordem a política fiscal. “Quem ganhar a eleição vai precisar focar em uma política de redução do tamanho da dívida do Brasil e vai ter de voltar a discutir algumas reformas, principalmente a administrativa e tributária”, diz Lucci. Mas ajustar a política fiscal será um desafio cada vez maior com as medidas populistas praticadas pelo atual governo aliadas ao aumento de pressões inflacionárias.