Ainda é cedo para comemorar, mas surgiu um motivo para ter, vá lá, alguma esperança no desempenho da economia brasileira em 2019. Desde que assumiu a Presidência, Jair Bolsonaro amarga um sem-número de notícias negativas nessa seara — justamente a que mais prometia boas-novas a quem torcia o nariz para o seu conservadorismo durante a fase de campanha. Contudo, a dificuldade de engrenar um crescimento do PIB num cenário de desemprego e desalento recordes teimou em amargurar o primeiro semestre do presidente, de seu ministro da Economia, Paulo Guedes, e da população brasileira em geral. Na segunda-feira 15, finalmente surgiu um alento. Naquele dia, o Banco Central divulgou o resultado do IBC-Br — índice que mede o nível da atividade econômica mensalmente e é considerado um termômetro do PIB —, que registrou alta de 0,54% em maio. Foi o primeiro resultado positivo desde janeiro, o que pode ser um ponto de inflexão para o país. O salvador da lavoura, como tem sido hábito, foi o agronegócio. “É o setor que impulsiona o PIB nacional”, afirma José Luiz Pagnussat, ex-presidente do Conselho Federal de Economia.
O lado ruim da história é que a indústria segue decepcionando, enquanto o setor de serviços andou de lado. Desse modo, foi mesmo da terra que vieram, digamos assim, os frutos do crescimento da economia. Em maio, o Brasil exportou mais de 9 bilhões de dólares em produtos do campo, turbinado por uma produção de insumos agrícolas 15% maior do que a verificada em abril. “A chuva ajudou, a área colhida aumentou e a produção de grãos garantiu os bons resultados”, explica o pesquisador do Centro de Estudos do Agronegócio da FGV Felippe Serigati. Um surto de peste suína na China, a maior exportadora desse tipo de proteína animal do mundo, acabou por aumentar a demanda global pelas carnes de boi, vaca e frango brasileiras. Verdade seja dita, se o Brasil dependesse só do agronegócio, os problemas do país seriam bem menores: o PIB agrícola expandiu-se 3,4% no primeiro trimestre — enquanto a indústria recuou 1,1% —, e a expectativa do governo é que o montante movimentado pelo setor cresça mais 0,6% até dezembro.
O varejo, vale destacar, também apresenta sinais de que pode engatar: teve um avanço de 0,2% em maio em relação ao mês anterior. Paulo Guedes pretende agora dar um empurrãozinho no consumo com uma série de medidas — entre elas a liberação de saques de parte dos recursos do FGTS no mês do aniversário dos correntistas. A ideia é injetar cerca de 30 bilhões de reais na economia. Outros 21 bilhões reais ficariam à disposição dos trabalhadores pelo fundo PIS/Pasep — desse montante, o governo admite que, na prática, só 2 bilhões de reais devem ser retirados pelos brasileiros. “Estávamos caindo, porém já saímos do fundo do poço”, comemorou o ministro Guedes ao chegar à Argentina para a reunião de cúpula do Mercosul.
O índice divulgado pelo Banco Central é um bom indicador de que os ventos vêm mudando por aqui, entretanto os dados ainda não são suficientes para que o governo e a equipe econômica se gabem de que voltamos a crescer. Desde o início do ano, o boletim Focus, uma pesquisa com representantes do mercado quanto às expectativas de crescimento do PIB, foi reajustado para baixo vinte vezes consecutivas — em janeiro, esperançosos na agenda de reformas e privatizações, investidores previam que em 2019 a economia brasileira avançaria 2,57%, número que foi revisado para 0,81% no último levantamento. O próprio Ministério da Economia rendeu-se às evidências e cortou pela metade as expectativas oficiais, que estavam em 1,6%, e chegou a um número similar ao da estimativa do setor privado.
Como o primeiro trimestre foi ruim, uma nova retração entre abril e junho traria de volta às manchetes uma palavra maldita: recessão. O dado oficial só será divulgado pelo IBGE no fim de agosto, no entanto já há quem tema pelo pior. O Instituto Fiscal Independente (IFI), órgão ligado ao Senado, alerta para essa possibilidade, calcando-se na fraca reação da indústria e nos baixos índices de confiança de consumidores e empresários. Para entender melhor o cenário de estagnação, é necessário também olhar para fora. “A desaceleração no crescimento é global, o que acaba derrubando o preço das commodities, tais como o petróleo e o minério de ferro”, diz Luka Barbosa, economista do Itaú BBA. A esperança, de novo, está no agronegócio, que coleciona bons sinais para o futuro. A assinatura do acordo entre o Mercosul e a União Europeia deve favorecer o Brasil nos próximos anos: há a possibilidade de um adendo de 87,5 bilhões de dólares à economia nacional em quinze anos, com o agronegócio representando boa parte dos produtos comercializados sem taxas com o outro lado do Oceano Atlântico. E, se o desaquecimento da China causa preocupação (leia), a guerra comercial entre a potência asiática e os Estados Unidos provocou maior demanda por carne, soja e outros itens agrícolas brasileiros. Ao que parece, a salvação vem, e continuará vindo, do campo.
Com reportagem de Lucas Cunha
Publicado em VEJA de 24 de julho de 2019, edição nº 2644