Como faz para se manter conectada com o universo jovem aos 46? Escrevo há 21 anos e, por mais que hoje eles tenham o mundo na palma da mão, noto que os dilemas são os mesmos, as espinhas são as mesmas e as insatisfações com o corpo também. Eles podem estar muito mais antenados, mas é só eu fechar os olhos e me lembrar de como eu era aos 14 anos para me sintonizar. A essência dos adolescentes não muda.
Tetê, protagonista de Confissões de uma Garota Excluída, que estreia dia 22 na Netflix, é toda feminista. Mudou a forma de retratar as meninas? Com certeza. A gente acompanha as mudanças e reflete os novos tempos. Na minha época, não havia redes sociais, e agora tem. O bullying tinha outro nome, mas já existia. Há coisas que sempre aconteceram, só que com nomes diferentes. Mas é bacana mostrar a Tetê como uma garota que não se depila, e coisas assim. Eu adoro vê-la bigoduda.
E as garotas se identificam com isso? Acredito que sim. A gente fez pequenas adaptações na história (o livro homônimo é de 2016) para que se encaixe no tempo em que as meninas estão vivendo. Mas não é só por isso que elas se identificam. As meninas se veem refletidas na alma inconformada de uma personagem que se sente excluída.
Você está em seu segundo filme para a Netflix, e um terceiro vem aí. O que o streaming representa para os autores? Nunca me senti tão valorizada como escritora. O streaming veio para mostrar que não tem história sem autor. Antes se falava apenas dos diretores, dos atores, como se a história não saísse da cabeça de um escritor, de um roteirista. Fico feliz de estar viva para ver essa virada, porque até pouco tempo atrás autor bom era autor morto.
Pretende seguir escrevendo para os jovens? Os adolescentes me escolheram. Meu primeiro livro era para jovens adultos, de 18 a 25 anos, mas quem amou foi a galera de 11 a 14. Percebi que eles se identificavam com o que eu escrevia, e que poderia ajudar a transformá-los em novos leitores. Eles me ajudaram a realizar meu sonho de infância, que era ser escritora.
Qual mensagem você quer passar para os jovens? A de que eles não estão sós. Um adolescente passa por coisas que um monte de gente já passou, ou ainda vai passar. Em mais de duas décadas como autora, nunca deixei de receber mensagens de adolescentes falando como foi bom ler sobre alguma situação e se identificar. Quero que eles entendam que seus conflitos são uma fase da vida, e que ela vai passar.
Publicado em VEJA de 8 de setembro de 2021, edição nº 2754