‘Salve Jorge’: Russo é malvado, mas nem tanto

“Eu tento inserir humanidade no vilão. Russo é precário emocionalmente e o teatro de homem forte funciona só com as meninas traficadas” *** “A novela da Gloria é muito grande, tem uma coisa meio tântrica, as tramas começam devagar, as ligações entre os personagens vão se entrelaçando aos poucos e depois a novela engrena”

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Antes de interpretar o violento Russo em Salve Jorge, o ator Adriano Garib, de 47 anos, viveu outras personalidades igualmente truculentas no cinema e no teatro. Suas feições de malvado já serviram a um deputado corrupto em Tropa de Elite 2 e ao invejoso Edmundo, em Rei Lear, de William Shakespeare. Em sua galeria de vilões, porém, nenhum é páreo para o terrível capanga da traficante de pessoas Lívia (Claudia Raia), de Gloria Perez. Ele já foi capaz de espancar mocinhas indefesas e até estuprou uma delas em cena que nem foi ao ar devido ao alto teor de violência. Com uma carreira quase inteiramente dedicada ao teatro e às aulas de interpretação, com algumas participações em novelas e seriados, Garib comemora seu primeiro personagem na TV com forte repercussão. “Acho engraçado as pessoas me pararem na rua e dizerem que eu sou normal, é claro que eu sou normal.”

O faz-tudo do bordel onde a mocinha Morena (Nanda Costa) é presa se destaca à medida que o núcleo ganha visibilidade. A explicação para o sucesso do personagem dentro de uma novela que demora a engrenar na audiência está na interpretação cheia de nuances que Garib dá a Russo. Ao mesmo tempo em que o vilão é capaz das maiores atrocidades, ele trata com o maior carinho o gato abandonado que adotou e batizou de Iuri. “No momento em que esse personagem multifacetado aparece na TV, onde proliferam atuações que mostram um só lado, é natural que isso chame atenção.”

Até ser escalado para Salve Jorge, o ator havia feito poucas novelas, em papéis coadjuvantes. A última foi na TV Record, Vidas em Jogo (2011), em que viveu um marido submisso às vontades da mulher e da filha, papel que comprova a multiplicidade de tipos já vividos por ele, nem sempre malvados. Garib também fez parte do elenco de Salsa e Merengue (1996) e de Duas Caras (2007). Na novela de Aguinaldo Silva, ele era Silvano, o gerente do supermercado onde o personagem de Marjorie Estiano trabalhava.

Leia a seguir a entrevista concedida por Adriano Garib ao site de VEJA.

Por que é chamado para papéis truculentos? Coincidência, a minha imagem favorece esse tipo de personagem. Mas a maior parte da minha carreira é feita de papéis variados, é tanta coisa que eu não sei nem dizer. Alguns foram vilões. No filme Tropa de Elite 2, por exemplo, fiz um deputado corrupto. Meu primeiro grande papel no teatro, uma montagem da peça Toda Nudez Será Castigada, de 1985, interpretei Patrício, um canalha, assim como fiz o vilão Edmundo, com Paulo Autran, em Rei Lear, de Shakespeare. Eu me dou bem com esses tipos, tenho uma dinâmica de atuação que favorece isso.

Russo é o pior de todos? Ele é hediondo. Antes de começar a fazer, estava muito receoso, fiz workshops com pais que perderam filhas para o tráfico de pessoas, foi barra pesada. O Russo encara o trabalho como outra pessoa qualquer, ele não é um psicopata, é um ser humano, que é covarde, medroso.

Por que Russo tem se destacado na novela? Eu tento inserir humanidade no vilão. Russo é precário emocionalmente e o teatro de homem forte funciona só com as meninas traficadas. O fato de ele ter adotado um gato abandonado corrobora com a ideia de que Russo é um cara como outro qualquer. No momento em que esse personagem cheio de nuances aparece na TV, onde proliferam muitas atuações que mostram um só lado, é natural que chame atenção.

A violência das suas cenas destoa da linguagem das novelas? As cenas do estupro de Jéssica (Carolina Dieckmann) e do espancamento foram tão fortes que nem foram ao ar. O horário tem classificação indicativa de 14 anos e emissora negocia com o Ministério da Justiça para poder tratar o tráfico de pessoas na TV aberta, porque é um assunto pesado.

Vão ter outras cenas com alto teor de violência? Russo já atirou em um e matou outro, além dos eventuais tabefes que sempre rolam, isso já virou carne de vaca.

Como acessa essas emoções primitivas? O foco é fazer o trabalho com muito amor. Eu encaro como qualquer outro papel. Acho engraçado as pessoas me pararem na rua e dizerem que eu sou normal, é claro que eu sou normal, queriam que eu ficasse batendo nas pessoas por aí?

Como foi o convite para integrar o elenco de Salve Jorge? Fui chamado na metade do ano, logo que terminou meu contrato com a Record. O convite veio do diretor Marcos Schechtman, que já conhecia meu trabalho. Ele me dirigiu em um episódio de Você Decide que foi sua primeira direção. Fiquei surpreso, não esperava o convite. As coisas demoram a acontecer e, quando acontecem, são na hora certa. Eu me dediquei durante muito tempo ao teatro e à pedagogia. Nunca tinha pensado em fazer TV, comecei a cogitar isso em 2010, quando eu me senti mais maduro para isso.

É importante estar maduro para trabalhar em TV? A arte em geral precisa de maturidade. Em Salsa e Merengue, por exemplo, eu não entendia a linguagem da televisão, que é muito específica, faltava estrada, por isso me voltei para o teatro.

O núcleo do tráfico humano está tendo mais visibilidade para aumentar a audiência? Isso estava previsto desde o começo. A novela da Gloria é muito grande, tem uma coisa meio tântrica, as tramas começam devagar, as ligações entre os personagens vão se entrelaçando aos poucos e depois a novela engrena. A gente acredita que a audiência vai vir quando ganhar esse embalo. A estrada que a Avenida Brasil nos deixou é larga, aberta, nos deixa bem feliz.

Sente a pressão pela baixa audiência? Não. O tempo é curto, gravamos nesta semana para ir ao ar na outra. A frente está apertada, mas é normal, a novela tem seis núcleos, é gente para caramba. Não podemos falhar, por outro lado é bom, nos dá dinâmica de trabalho.

Como encaixa a rotina de professor entre as gravações? Por enquanto, estou de licença. Eu sou professor desde 1998 e já dei aulas para talentos como Paulo Gustavo, Cacau Protásio, Fabio Porchat, Rodrigo Sant’Anna e vê-los fazendo sucesso me deixa emocionado, é um oficio que eu nunca vou deixar. Encontrei o Leandro Hassum e ele diz ter curtido o Russo. Esse comentário vindo de um comediante é sinal de que quer dizer que o personagem está solto.

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