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Música anti-lockdown de Clapton desenterra passado racista do músico

Canção negacionista levantou críticas nas redes , trazendo à tona uma fala do músico nos anos 70, quando pediu por uma Inglaterra "para brancos"

Por Amanda Capuano Atualizado em 4 dez 2020, 16h07 - Publicado em 4 dez 2020, 14h30
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  • Chegou às plataformas de streamings nesta sexta-feira, 4, a musica Stand and Deliver, composta por Van Morrison e interpretada por Eric Clapton como uma forma de “protesto” contra as políticas de lockdown e distanciamento social implantadas no Reino Unido para conter a pandemia de coranavírus. Com frases como “você quer ser um homem livre ou um escravo?”, que comparam o respeito aos protocolos de saúde à escravidão, a canção gerou reações negativas nas redes sociais. Além de criticarem o negacionismo da dupla, algumas pessoas usaram a controvérsia para ressuscitar o histórico de declarações de cunho racista de Clapton, que entoou discursos supremacistas na década de 70.

    Uma das críticas foi feita pela atriz Jameela Jamil, famosa pela comédia The Good Place e pelo ativismo em prol de causas sociais. No dia 27 de novembro, logo após o anúncio da parceria de Clapton e Morrison, Jameela, que tem ascendência paquistanesa e indiana, compartilhou no Twitter um discurso de Clapton durante um show em 1976. “Este é o homem que quer que vocês saiam às ruas enquanto ele se senta em segurança em sua mansão com os melhores médicos à disposição”, escreveu ela. No discurso reproduzido pela atriz, Clapton pediu para que os “estrangeiros” da plateia levantassem as mãos, sugerindo, em seguida, que fossem embora não apenas do show, mas também do país. “Vamos impedir o Reino Unido de virar uma colônia negra. Expulsem os estrangeiros, mantenham a Inglaterra branca. Os negros, árabes e jamaicanos não pertencem a este país e nós não os queremos aqui”, gritou ao público sem poupar termos depreciativos. “Precisamos deixar claro que eles não são bem-vindos. A Inglaterra é um país para brancos, o que está acontecendo conosco?” continuou.

    Na época, o discurso racista de Clapton inflamou o cenário musical inglês e inspirou o movimento Rock Against Racism, que se opunha à presença do supremacismo branco no gênero musical. Em 2018, no documentário Life in 12 Bars, o cantor comentou as declarações e disse que costumava ser “uma pessoa nojenta”, influenciado pela “Invasão Árabe”. “Havia essa atmosfera nos anos 70. Eu não estou arranjando desculpas, era algo horrível”, disse ele, antes de afirmar que, apesar disso, considerava a época “divertida”.

    Sobre a nova canção, Stand and Deliver, o roqueiro afirmou em entrevista à Variety que está “profundamente aborrecido” com os shows cancelados na tentativa de barrar o avanço da pandemia, que enfrenta uma segunda onda no continente. “Muitos de nós apoiam Van e seu esforço para salvar a música. Ele é uma inspiração. Precisamos nos posicionar e sermos notados para encontrarmos uma saída dessa bagunça”, disse ele, fazendo referência ao autor da canção, que já lançou outras três músicas contra as restrições do primeiro ministro Boris Johnson – uma delas, No More Lockdown, chamando o governo de fascista por aplicar protocolos que limitariam a liberdade (de espalhar o vírus, ao que parece) da população britânica.

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    Esta, porém, não é a primeira vez que o cantor assume um posicionamento polêmico e perigoso diante da pandemia. Em agosto, Morrison publicou em seu site oficial um comunicado, não mais disponível, em que defende apresentações com capacidade máxima de público, e convoca artistas para rebelarem-se contra a “pseudociência” do confinamento. “Convoco meus colegas cantores, músicos, compositores, produtores, promotores e outros da indústria a lutarem ao meu lado nisso”, diz em um trecho. Em meio ao negacionismo inegável, há ainda um vislumbre de racionalidade no músico: a arrecadação das canções será direcionada para um fundo criado por Morrinson em apoio a artistas afetados pela pandemia. Embora o auxílio seja louvável, e necessário em um momento dramático para as artes, há maneiras mais responsáveis de oferecer suporte do que descredibilizar a ciência perante os fãs.

    Desde meados de outubro, a Europa têm registrado altas no número de infecções e mortes, levando governos a retomarem medidas mais rígidas de segurança, inclusive o lockdown, adotado na Inglaterra durante o mês de novembro. Segundo um relatório divulgado pelo Imperial College de Londres na semana passada, o fechamento rígido reduziu em cerca de 30% os casos de infeção no país: entre 16 de outubro e 2 de novembro, o órgão estima que 130 a cada 10.000 pessoas tenham contraído o vírus no país, número que caiu para 96 durante a vigência do lockdown. Desde a quarta-feira, 2, o Reino Unido evoluiu para uma fase menos restritiva da quarentena – mas para a tristeza de Clapton e Morrison, ainda não há espaço para shows lotados no horizonte.

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