O dito popular afirma que a única certeza que temos na vida é a morte. Lamentamos quando ela chega para artistas talentosos que partiram jovens, restando-nos apenas imaginar o que eles teriam feito se tivessem vivido em sua plenitude. Uma nova tecnologia de inteligência artificial, no entanto, assombrou recentemente os fãs de Kurt Cobain, do Nirvana, Amy Winehouse, Jimi Hendrix e Jim Morrison, do The Doors, todos mortos aos 27 anos de idade. O sistema analisou dezenas de músicas desses artistas e, a partir de vários elementos delas, compôs uma canção inédita para cada um. O resultado é impressionante – e também assustador – e levanta o debate: até onde vale a pena “ressuscitar” os mortos para atender a ânsia dos fãs por material inédito? Temos esse direito? Isso faz sentido?
Em fevereiro deste ano, na Coreia do Sul, outro caso chocante: o cantor Kim Kwang-seok, morto há 25 anos e que fez muito sucesso no país asiático na década de 1990, teve sua voz recriada também por um software de inteligência artificial. A voz foi reproduzida numa canção nunca gravada por Kwang-seok. Em 2012, outro exemplo de vida pós-morte foi a utilização de um holograma do cantor Tupac Shakur, morto em 1996, que se “apresentou” no palco do festival Coachella, nos Estados Unidos.
Cobain, Amy, Hendrix e Morrison têm em comum com o cantor coreano Kwang-seok o fato de que todos tiraram a própria vida, de propósito ou de forma acidental. Essas novas composições “póstumas” (exceto a do coreano), fazem parte do projeto Lost Tapes of The 27 Club (As Fitas Perdidas do Clube dos 27), criado para alertar as pessoas sobre a importância da saúde mental e prevenir o suicídio.
No caso de Kurt Cobain, a música “nova” se chama Drowned in the Sun. Embora “inédita”, seus acordes e solos de guitarra rementem a hits de Come As You Are e das canções do álbum Bleach. A exceção da música foi a voz. Ao contrário do caso sul-coreano, a música foi gravada pelo cantor Eric Hogan, líder de uma banda cover do Nirvana.
A justificativa de que a composição dessas canções foi feita para dar destaque a uma campanha sobre a saúde mental é totalmente válida. A pressão pela fama e pelo sucesso levou esses artistas ao extremo e, por não suportarem tudo isso, infelizmente, sucumbiram. O resultado, no entanto, serve também como uma alerta: nada pode substituir o talento de cada um. As músicas são boas, um fã vai reconhecer ali o DNA da banda, mas, definitivamente, falta nelas algo de humano. Todas emulam uma espécie de cópia barata ou, no máximo, uma faixa lado B dos artistas homenageados. Enfim, falta a vida.