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Espalhafato social

A biografia A Vida É uma Festa, do jornalista de VEJA Bruno Meier, conta como Amaury Jr. levou para a TV a boa vida de celebridades, socialites e novos-ricos

Por Mario Mendes
1 nov 2015, 10h36

Uma cena: na edição 2008 do Baile do Copacabana Palace – tradicional evento do Carnaval carioca -, a socialite Narcisa Tamborindeguy revela, em close-up para uma câmera de TV, o seu maior desejo para aquele ano. “Eu quero um namorado bom de cama”, ela dispara, no auge de sua animação 220 volts, e, de quebra, vai dançando e descendo até o chão. Como? Baile do Copa? Noite black-tie de ostentação explícita? Narcisa Tamborindeguy? Ai, que loucura! Isso só pode ser coisa do Programa Amaury Jr., atração notívaga da Rede TV! comandada por Amaury Jr., primeiro e único. Sim, realmente único, porque o distintivo da originalidade cabe bem ao jornalista de 65 anos, há três décadas no ar com o formato televisivo que ele mesmo inventou: o colunismo social eletrônico. Esse momento funk hilariante é apenas um dos muitos casos relatados em A Vida É uma Festa (224 páginas; 26,90 reais), biografia escrita por Bruno Meier, jornalista de VEJA, e o primeiro lançamento nacional da HarperCollins Brasil, selo nascido da associação entre o gigante internacional HarperCollins e o grupo editorial brasileiro Ediouro. Com base em cinquenta encontros com o próprio Amaury, mais entrevistas com familiares, amigos, colaboradores e colegas de métier, além de uma farta pesquisa de arquivo, o autor construiu uma narrativa episódica – que lembra uma imensa reportagem -, acompanhando o biografado desde os tempos de garotão farrista na cidade de São José do Rio Preto, no interior de São Paulo, até o presente do homem rico, famoso e amigo de todo mundo – ou quase. É uma biografia autorizada, embora o biografado não tenha tido a oportunidade de palpitar sobre o texto final.

Nascido em Catanduva, filho de pai filólogo e professor de português e de mãe também professora – falecida recentemente, aos 91 anos -, Amaury Jr. desenvolveu desde muito cedo o gosto pela notícia e um apurado tino comercial. Sempre gostou de aparecer. No colégio foi apresentador de show de talentos e, mais tarde, comandou um programa na TV local nos moldes da gincana Cidade contra Cidade – atração popularíssima do Programa Silvio Santos nos anos 70 -, no qual dividia o palco com uma descoberta sua, uma beldade loura de olhos cor de amêndoa e abdome sarado que atendia pelo nome de Ana Maria Braga. Segundo relata Meier, a hoje apresentadora das manhãs da Globo cancelou na última hora a entrevista que concederia para o livro – talvez pela indiscrição de Amaury em falar sobre um namorico que os dois teriam engatado naqueles tempos.

Sempre agitador da cena social de Rio Preto e empreendedor em sua área profissional – chegou a se aventurar como proprietário de um jornal diário na região, que fez barulho mas se revelou financeiramente inviável -, Amaury sabia que o seu destino era São Paulo, aonde chegou na virada da década de 70 para a de 80 disposto a deixar sua marca. Ele conta que foi nesse período que nasceu seu estilo como apresentador, como repórter na extinta Tupi, por sugestão de seu amigo e mentor, o jornalista José Hamilton Ribeiro, que o aconselhou a “olhar para a câmera e ir andando e falando”. Mas o Amaury Jr. de fato, o homem que acumularia 50 000 entrevistas no currículo, nasceu mesmo em 1985, quando foi ao ar a primeira edição do Flash, na TV Gazeta. Depois, o programa passaria também por Band e Record, e o apresentador teria recusado uma tentadora proposta da Globo antes de se fixar na Rede TV!.

Não há como esquecer que o Brasil já foi uma monarquia e, como tal, mantém resquícios de hábitos e costumes da vida em palácio. A intensa e sempre borbulhante troca de informações sobre os acontecimentos na corte – tanto episódios públicos quanto a movimentação nos bastidores – alimentou o gosto popular pela crônica mundana praticada desde sempre pela imprensa nativa, sobretudo no Rio de Janeiro. A antiga capital federal revelou-se terreno fértil para a chamada coluna social que floresceu a partir dos anos 50. Maneco Müller, um jornalista sofisticado que utilizava como nom de plume Jacinto de Thormes, foi o pioneiro desse expediente de acompanhar a vida dos muito ricos – naquele tempo a alta sociedade ainda não havia absorvido o showbiz -, mesclando notícias de recepções e festas com informações leves sobre moda, arte, cultura e, vez ou outra, política. Müller/Thormes foi ofuscado pela chegada de Ibrahim Sued, que levou o colunismo social a um sucesso sem precedentes. Foi esse êxito que, mais tarde, possibilitou o surgimento do charmoso Zózimo Barrozo do Amaral, de quem Amaury Jr. se declara fã absoluto.

Sued também praticou o colunismo social na TV – fazia aparições no Jornal da Globo e tinha um quadro de entrevistas no Fantástico -, mas Amaury Jr. foi além, ao penetrar nas festas onde todo mundo queria estar, ligando luzes e câmeras sobre as celebridades presentes para entrevistá-las, de microfone em punho e sempre com aquele ar de amigo de infância que acabou de aparecer em casa. Simpático, bem-humorado e um tanto espalhafatoso, Amaury era o colunista sob medida para os tempos da exibida era yuppie, com seus novos-ricos à la Donald Trump e socialites coruscantes, como a ex-primeira-dama Dulce Figueiredo, que costumava comandar uma mesa animada no Gallery, o nightclub daquele momento em São Paulo. Não à toa, ele ficou tão famoso que virou adjetivo, nome genérico para o colunismo social: várias cidades brasileiras gabam-se de ter o seu próprio Amaury Jr. Sem falar de antigos seguidores que adotaram o seu estilo, continuam na mesma batida – como Otávio Mesquita – ou partiram para outros formatos – como Luciano Huck. Até os pândegos do Pânico têm a sua versão, o Amaury Dumbo.

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A Vida É uma Festa pode ser visto como um Amaury Jr. de bolso. Estão lá as peraltices de juventude, como um ainda inexplicado caso de gravidez indesejada (uma prostituta de Rio Preto insistia em que Amaury era o pai, mas nunca se comprovou nem se ela teve mesmo um filho), dicas para dar uma boa festa, as manias do apresentador hipocondríaco (adora vitaminas), o faturamento mensal (200 000 reais de salário na Rede TV!, que, acrescidos de ganhos publicitários, poderiam chegar, em tempos de vacas mais gordas que os atuais dias de crise, a 1,5 milhão mensais) e o casamento de quatro décadas com a onipresente companheira Celina. A única nota dramática é o período em que Amaury sofreu de depressão. De resto, o livro é pura celebração – Hebe Camargo, João Gilberto, Boni e o ator americano Charles Bronson são algumas das estrelas convidadas.

Também está lá o segredo das despesas quase inexistentes com roupas e restaurantes. Há quem considere Amaury Jr. o “rei da permuta” – prática na qual anúncios no programa são pagos em serviços ou mercadorias, o que permite ao apresentador incrementar o guarda-­roupa e frequentar restaurantes sem sacar a carteira -, e ele não nega. Declara que a tal permuta é “malvista por muitos, mas válida para todos”. Avisa, porém, que é o Amaury, pessoa física, quem paga todas as passagens de classe executiva. “Acha que eu vou viajar no bandejão?”, crava. Diante de tanta franqueza, só resta pedir para subir o som quando entra o refrão que faz “Ôôô, ôôô”. Sim, esse é o tema do Flash, o sucesso disco Nice and Slow, do cantor Jesse Green, que festeiros por todo o Brasil costumam pedir aos DJs: “Toca a música do Amaury Jr.”.

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