Assine VEJA por R$2,00/semana
Continua após publicidade

Conheça Thomas Savage, autor do livro que inspirou ‘Ataque dos Cães’

Escritor foi casado com a também autora Elizabeth Fitzgerald, mas era gay e se debruçou sobre hipocrisias do interior americano no século XX

Por Amanda Capuano Atualizado em 10 dez 2021, 16h19 - Publicado em 9 dez 2021, 17h39
  • Seguir materia Seguindo materia
  • Em um rancho isolado em Montana, no centro-oeste dos Estados Unidos, rebanhos transitam pelo pasto alheios à trama que se desenrola entre os humanos. Ali, os irmãos Phil e George Burbank protagonizam uma tensão crescente na tentativa de gerenciar a fazenda da família. Opostos, Phil é um caubói grosseiro, enquanto George é um homem tímido e educado. Quando George se casa e traz a mulher para viver com eles no rancho, Phil não mede esforços para que ela e seu filho, Peter, se sintam bastante desconfortáveis. A trama de Ataque dos Cães poderia ser um faroeste clássico, mas não era essa a intenção de Thomas Savage (1915-2003), autor do livro homônimo de 1967 que inspirou o filme de Jane Campion.

    Publicidade

    Nascido em 1915 na cidade de Salt Lake City, em Utah, o escritor se casou aos 24 anos com a também autora Elizabeth Fitzgerald. Os dois foram apresentados pelo pai da garota, o professor de literatura Brassil Fitzgerald, que deu aula para Savage na Universidade de Montana. Savage era gay, e, segundo relata o autor O. Alan Weltzien na biografia Savage West, de 2020, manteve casos extraconjugais com homens durante toda a vida. Sua esposa, inclusive, sabia sobre a sexualidade do marido antes mesmo do casamento. A relação entre eles, ao que tudo indica, não era ruim. Os dois tiveram três filhos e mantinham uma cumplicidade que alimentou a carreira de ambos. Elizabeth, não raro, atuava como editora das obras de Savage, e ela própria publicou nove livros ao longo da vida. O autor, no entanto, não deixou de registrar as dificuldades de manter-se no armário em suas histórias que, assim como em Ataque dos Cães, abusam dos estereótipos de masculinidade viril para explicitar a hipocrisia do interior americano no século XX.

    Publicidade

    O ambiente é familiar ao autor, mas não de uma maneira positiva. Quando tinha apenas 2 anos de idade, os pais se divorciaram e ele foi morar com a mãe em um rancho em Idaho. Aos 5, mudaram-se para a fazenda do padrasto, em Montana, mas nunca se sentiu pertencente àquele ambiente. Sua filha, inclusive, revelou que o pai odiava Montana e tentava ficar o mais longe possível de lá desde que foi embora, aos 22 anos. Não à toa, nas narrativas idealizadas por ele, a cidade não é pintada com bons olhos e é cenário recorrente de dinastias disfuncionais com caubóis influentes que esbanjam masculinidade tóxica.

    Publicidade

    Relativamente esquecido pela literatura, o autor não sobreviveu da escrita tão facilmente. Publicou sua primeira história em uma revista local e antes de estrear nos romances com The Pass — uma homenagem à mãe — em 1944, já havia trabalhado como ajudante de fazenda, soldador e funcionário de ferrovia. Assumiu um cargo de professor em Boston, onde ficou até 1947. No ano seguinte, lançou o segundo romance, Lona Hanson, que entregou rendimentos polpudos, incluindo a venda dos direitos à Columbia Pictures, que nunca chegou a fazer o filme, mas a venda garantiu que ele pudesse seguir se dedicando à escrita. Em 1953, publicou A Bargain with God, seu sucesso mais popular, que permitiu que, em 1955, ele deixasse as salas de aula e se dedicasse exclusivamente aos livros.

    Continua após a publicidade

    No total, o autor publicou 13 livros — Ataque aos Cães, lançado em 1967, foi o quinto deles, e é o mais bem avaliada pela crítica, embora na época tenha tido uma vendagem modesta. Ambientado em um rancho em Montana que faz alusão ao local onde ele cresceu, a obra bebe de elementos autobiográficos, mas é difícil apontar com certeza os limites entre realidade e ficção. Em uma coletiva sobre o filme, a diretora Jane Campion falou que o personagem Peter, no longa interpretado por Kodi Smit-McPhee, foi parcialmente inspirado em Savage. “Ele veio para o rancho de maneira semelhante a Peter — sua mãe se casou com Ed Brenner, que na verdade é a inspiração para Phil Burbank”, revelou ela, que também acredita que Savage tinha um tio que o humilhava. Campion ainda teve acesso a uma série de fotos de pessoas reais que inspiraram a história, incluindo um homem que os herdeiros de Savage acreditam ter dado origem a Bronco Henry, o mentor por quem o personagem de Cumberbatch era obcecado. 

    Publicidade

    Diferente de Peter, o autor não era tão distante dos pastos como no filme. “Ele andava a cavalo, e a primeira coisa que escreveu foi sobre domar os mais ferozes”, disse Campion em entrevista à radio neozelandeza RNZ. A vivência do autor na corda bamba do pertencimento deu a ele uma visão original sobre a região, que se traduz em histórias de velho oeste que escancaram hipocrisias geralmente deixadas em segundo plano por autores que glamorizam a figura do caubói machão. Esse personagem estereotipado, aplaudido nos faroestes, é justamente o pesadelo do autor. “Ele deveria ocupar um lugar de destaque no lotado mapa literário de Montana”, disse o biógrafo ao jornal L.A Times. “Savage certamente tinha uma relação mais complexa com a literatura de faroeste do que os outros”, analisa Campion, que, agora, lança luz sobre a obra de um homem deixado às margens dos rebanhos literários. 

    VEJA RECOMENDA | Conheça a lista dos livros mais vendidos da revista e nossas indicações especiais para você.

    Publicidade
    Publicidade
    Publicidade

    Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

    Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

    Domine o fato. Confie na fonte.

    10 grandes marcas em uma única assinatura digital

    MELHOR
    OFERTA

    Digital Completo
    Digital Completo

    Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

    a partir de R$ 2,00/semana*

    ou
    Impressa + Digital
    Impressa + Digital

    Receba Veja impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

    a partir de R$ 39,90/mês

    *Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
    *Pagamento único anual de R$96, equivalente a R$2 por semana.

    PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
    Fechar

    Não vá embora sem ler essa matéria!
    Assista um anúncio e leia grátis
    CLIQUE AQUI.