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Chico Buarque tem outras músicas à beira do cancelamento

Cantor limou de seu repertório a faixa 'Com Açúcar, Com Afeto', acusada de machismo. Seguindo essa linha, outras composições podem cair no mesmo limbo

Por Da Redação Atualizado em 3 fev 2022, 09h40 - Publicado em 28 jan 2022, 16h28

Ao longo de sua carreira, Chico Buarque escreveu dezenas de músicas em que o lírico, ou seja, o narrador, é uma mulher. Por essa razão, inúmeras cantoras no passado afirmaram que ele era o compositor homem que mais entendia a alma feminina. Mas o século XXI não pensa a mesma coisa. Em uma entrevista recente para o documentário O Canto Livre de Nara Leão, exibido pelo Globoplay, o compositor afirmou que excluiu de seu repertório a faixa Com Açúcar, Com Afeto, composta em 1967, a pedido da própria Nara. O motivo é a que a letra da canção, hoje em dia, retrata um amor submisso.

“É justo que haja (uma revisão de sua obra), as feministas têm razão, vou sempre dar razão às feministas, mas elas precisam compreender que naquela época não existia, não passava pela cabeça da gente que isso era uma opressão, que uma mulher não precisa ser tratada assim”, disse no documentário.

Na letra, uma mulher fica em casa esperando o marido voltar da gandaia e, mesmo sabendo disso, ela o perdoa e o recebe de braços abertos. “Quando a noite enfim lhe cansa / Você vem feito criança / Pra chorar o meu perdão / Qual o quê / Diz pra eu não ficar sentida / Diz que vai mudar de vida / Pra agradar meu coração”, diz uma das estrofes da canção.

A onda revisionista não é exclusividade de Chico Buarque. Diversos astros internacionais anunciaram recentemente que estão reavaliando suas canções de teor machista e racista, como Elvis Costello, que não vai mais cantar Oliver’s Army (1979) e os Rolling Stones, que pararam de cantar Brown Sugar (1971). Até nomes de bandas foram mudados. Caso da banda  feminina de country The Dixie Chicks, que agora se chama só The Chicks, porque o termo Dixie é associado ao exército confederado, que defendia a escravidão nos Estados Unidos.

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Se as críticas contra as letras de Chico Buarque fossem levadas a ferro e fogo, as canções Mulheres de Atenas e Geni e o Zepelim seriam as primeiras vítimas. Ambas, porém, carregam ironias e críticas aos costumes da época em que foram escritas e à ditadura militar. Em Mulheres de Atenas, Chico canta – de maneira irônica – que elas foram educadas para serem submissas aos maridos e reservadas ao lar, fazendo uma crítica quase subliminar ao mundo no qual as mulheres não tinham direitos iguais. Já em Geni e o Zepelim, a ideia da letra é retratar a objetificação da mulher e a maneira como ela é condenada pela sociedade, apresentando Geni, uma travesti, como um pedaço de carne que pode ser usado por quem quiser.

Pode parecer exagero, mas se Chico Buarque usasse o mesmo critério para excluir canções de seu repertório, além de Com Açúcar, Com Afeto, músicas como Madalena Foi Pro Mar, Cotidiano, Logo, Eu? e Tua Cantiga também poderiam cair na malha fina do cancelamento — ou seria autocensura?

Madalena Foi Pro Mar (1966)

Na letra dessa canção, uma mulher foi embora e o homem que ficou em casa não aceita a situação. Boa parte da letra é o marido pedindo para ela voltar para cuidar dos filhos. “E eu fiquei a ver navios / Madalena foi pro mar / E eu fiquei a ver navios / Quem com ela se encontrar / Diga lá no alto-mar / Que é preciso voltar já / Pra cuidar dos nossos filhos”. A ideia da canção seria uma mulher independente que partiu e foi à luta, porém, sem deixar a crítica explícita, a composição pode ser usada por outro viés, emulando o machismo que encarrega a mulher do cuidado da casa e dos filhos.

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Cotidiano (1971)

Um dos maiores clássicos de Chico Buarque, a canção Cotidiano, conta a rotina de um casal e faz um retrato do tempo em que a mulher costumeiramente era dona de casa e ainda deveria estar bonita e disposta para o marido — o que parece inofensivo, mas perpetua um estereótipo que ainda hoje se mantém sobre o lugar da mulher. Na letra, o homem chega depois do trabalho e quer encontrar uma mulher dócil e submissa. “Seis da tarde como era de se esperar / Ela pega e me espera no portão / Diz que está muito louca pra beijar / E me beija com a boca de paixão”, diz a letra.

Tua Cantiga (2017)

O último álbum de Chico Buarque, Caravanas, se viu envolvido em uma polêmica por causa da canção Tua Cantiga. Na letra, ele canta: “Quando teu coração suplicar / Ou quando teu capricho exigir / Largo mulher e filhos e de joelhos vou te seguir”. A crítica surgiu porque a letra sugere que um homem abandone a sua família para seguir a amante. Chico Buarque, porém, postou em suas redes sociais que a letra é o contrário de machismo. “Machismo é ficar com a família e a amante”, escreveu o compositor.

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