Desde seu começo em 2009, a banda BaianaSystem nunca fugiu da inovação (e da ideologia). Além das músicas que misturam variados gêneros musicais, o grupo já se aventurou na produção de uma campanha publicitária às avessas para o single Invisível, mostrando figuras marginais do Carnaval baiano, como cordeiros e ambulantes, e criou o bloco Navio Pirata, que leva um forte tom político para a folia – neste ano, foram homenageados Marielle Franco e o mestre de capoeira Moa do Katendê. Agora, na tentativa de fugir do excesso de “produtização” da indústria musical, o grupo abriu seu selo Máquina de Louco, que até então só lançava os discos do BaianaSystem – o mais recente foi O Futuro Não Demora, de fevereiro –, para outros artistas, na tentativa de apoiar novos nomes da cena musical baiana.
Vocalista e um dos idealizadores da banda, Russo Passapusso explica que o selo nasceu de um grupo de debate que discutia o mercado fonográfico e musical. “Conversávamos para entender como as manifestações artísticas poderiam ser feitas de uma forma protegida (ligada aos direitos autorais e à liberdade artística). Esse debate acabou crescendo – ganhando novos membros – e acarretou nessa coisa de direção e aconselhamento (a outros artistas)”, diz o vocalista a VEJA. As discussões abordavam desde o declínio dos formatos físicos e a preferência do mercado por singles até questões de sonoridade, trazidas por músicos como Curumin e BNegão, que estão sempre ajudando e opinando nas produções do BaianaSystem.
A busca por uma produção independente e com mais liberdade levou à criação do selo. “A Máquina de Louco é um lugar para gerenciarmos essas coisas burocráticas e de produção do Baiana. Seja uma trilha, a produção de alguma festa em Salvador ou a saída do bloco Navio Pirata”, conta Beto Barreto, guitarrista e fundador do grupo. Algumas ideias da Máquina de Louco dialogam com a plataforma Laboratório Fantasma, empresa do rapper Emicida que atua ao mesmo tempo na produção de discos, como selo, e também no agenciamento da carreira de artistas.
A decisão de expandir a atuação da Máquina a outros nomes da música surgiu naturalmente, quando a cantora Livia Nery apresentou seu primeiro disco aos músicos e amigos do grupo baiano, que ela conhece há mais de dez anos. “Livia confia na nossa forma de trabalho. Ela sempre pediu indicações e mostrou o seu trabalho para analisarmos. Por isso, surgimos com a ideia de lançar o álbum dela. Foi algo bem natural”, afirma Filipe Cartaxo, o responsável por pensar a identidade do selo e do BaianaSystem.
“Lá em Salvador, a música alternativa é aquela que não é Axé Music. Por isso, há algum tempo, era um reduto pequeno. Sempre ia esbarrando com eles em shows e eventos”, conta a cantora. “Eu terminei o disco e fui passar um mês em Salvador. Procurei mostrar o trabalho para todos os meus amigos, incluindo eles (BaianaSystem).” Estranha Melodia, de Livia, lançado no começo do mês, é o primeiro álbum da gravadora que não carrega o nome do grupo.
Apesar da consolidação do selo, Cartaxo garante que o grupo “não está abrindo a plataforma para ter uma série de artistas como produto”. Livia Nery e o rapper Vandal, que está produzindo um álbum com a Máquina de Louco, participaram do último álbum do grupo e se fazem presentes nos debates mencionados por Passapusso. “Não é qualquer um que vai lançar seu trabalho pelo selo. É uma coisa meio de doido mesmo. Nós queremos provocar a arte do indivíduo. A Máquina de Louco é feita para quem tem autenticidade. A pessoa também tem que ter um elo com a tradição e um desprendimento com a execução”, diz o vocalista.