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Para antropóloga, punições como a de Daniel Alves ajudam a frear sexismo

85% da população têm a crença que homens são superiores às mulheres. Condenação mostra que vítimas podem e devem reagir perante abusos

Por Valéria França Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 7 Maio 2024, 17h02 - Publicado em 23 fev 2024, 11h57

Condenado a 4 anos e meio de cadeia por estupro na última quinta-feira 22, o jogador Daniel Alves não é apenas mais um caso que aumenta as estatísticas da violência contra a mulher, mas um recado à sociedade de que a punição vale para todos. Vai além: sinaliza que as vítimas podem e devem reagir perante os abusos, sem medo ou vergonha, estabelecendo assim novos valores. No mundo do futebol, há várias estrelas que acreditaram ter o direito de satisfazer seus desejos a qualquer preço. O ex-jogador do Milan, o atacante Robinho, de 39 anos, por exemplo, foi um deles. Em 2013, ele participou do estupro coletivo de uma mulher albanesa em uma casa noturna de Milão. No ano passado, a Justiça italiana o condenou a 9 anos de prisão e pediu a extradição do brasileiro, que mora atualmente na cidade litorânea de Santos, onde começou a carreira. Apesar de o Superior Tribunal de Justiça ainda não ter se manifestado sobre o caso, ele terá de acertar as contas com a sociedade, seja aqui ou na Itália.

Fora do futebol também não faltam maus exemplos, que mostram que o discurso de liberdade e igualdade difundido mundo afora ainda não está acompanhado de mudanças do comportamento. Símbolo da masculinidade tóxica, o produtor hollywoodiano Harvey Weinstein, de 70 anos, foi condenado a 23 anos por agressão sexual em 2020. Ele se beneficiava da posição de influência para pressionar e abusar das vítimas – a maioria delas atrizes famosas, como Ashley Judd e Rose McGowan. “A cultura do poder masculino está associada ao status, que confere a falsa sensação de superioridade em relação às mulheres e extravasam em violência de gênero”, diz Mirian Goldenberg, antropóloga especializada da diferença de gêneros.

O machismo é um desafio de saúde, econômico e de segurança pública. Pesquisa realizada pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, em oitenta países, mostra que o sexismo abrange 85% da população e tem graves consequências – as piores se referem à integridade física. Foram avaliadas também os preconceitos contra a mulher na área da educação, política e economia. De acordo com o relatório apenas 15% dos brasileiros estão livres desses preconceitos, que fazem parte do universo feminino e masculino – sim, as mulheres também compartilham da mesma crença que os homens são superiores e que podem tudo. “Casos exemplares, como o de Daniel Alves, fazem com que pensem nas próprias vidas, no que aceitam e o que é inadmissível”, diz Mirian. “Elas percebem que podem reagir à violência, ao abuso e à traição, sem medo e vergonha.”

Especialistas apontam a necessidade do reforço da rede de apoio nesses casos, para que as mulheres sejam acolhidas e protegidas, e não estigmatizadas socialmente. “Apesar de existir uma infraestrutura, no Brasil, ela é ainda de difícil acesso. Faltam canais de denúncias”, diz Mirian. Mesmo assim o país já evoluiu, principalmente nas instâncias jurídicas. Um desses marcos foi estabelecido em 2023, quando o Supremo Tribunal Federal declarou inconstitucional o uso da tese de legítima defesa da honra em crimes de feminicídio ou de agressão contra a mulher, que quer apenas ser dona da própria vida e de suas escolhas.

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