Embora a produção de vinhos já desponte em outras regiões do Brasil, é no Rio Grande do Sul que a maior parte dos rótulos que abastecem as prateleiras de adegas e supermercados do país é produzida. Na safra de 2023, 90% de todo o vinho nacional veio do Estado. E as chuvas que vem atingindo a região também causaram grandes estragos nos vinhedos. Vídeos e fotos que circulam nas redes sociais mostram que, em alguns casos, trechos inteiros das propriedades foram perdidos com a força das águas.
A vinícola Valparaíso, que faz um trabalho muito sério de sustentabilidade e de agricultura regenerativa na produção de seus vinhos naturais desde 2006, teve parte da produção devastada. “Ano passado tivemos uma enchente bem séria, mas nada como a que aconteceu agora. A vinícola fica ao lado de um pequeno riacho que encheu muito e transbordou”, conta Naiana Argenta, filha de Arnaldo Argenta, responsável pela vinícola. A propriedade conta com sete hectares de vinhedos, todos cobertos para proteger as vinhas do excesso de umidade da região. As chuvas derrubaram as coberturas. Videiras ficaram deitadas e muitas passaram bastante tempo no meio da água. Por enquanto, a família só conseguiu ver o impacto em parte dos vinhedos onde estão a maior parte das uvas de mesas. As variedades viníferas ficam em outra parte da propriedade, mais elevada, mas não foi possível acessá-la ainda. “Estamos sem eletricidade e não conseguimos nem verificar o estado das máquinas da cantina”, diz Naiana. Segundo ela, as técnicas agrícolas ajudaram a evitar um prejuízo ainda maior. “Tudo que meu pai faz na terra, como a preservação da vegetação, evitou maiores deslizamentos”.
Outros produtores da região foram ainda mais afetados, como a destilaria artesanal Casa Bucco. Um vídeo mostra que a estrutura do restaurante foi completamente destruída. Dois sócios, Rodrigo Cagol, de 32 anos, e a namorada, Elisa Bucco Tomasi, de 22 anos, morreram, de acordo com informações da imprensa local.
A Cooperativa Vinícola Aurora, uma das maiores produtoras do país, divulgou apenas um comunicado em que diz que o foco atual é no atendimento às famílias atingidas para que estejam em segurança e com suas necessidades básicas atendidas. “Superado este primeiro momento, haverá a avaliação dos impactos materiais e seus reflexos nas questões produtivas e logísticas”, diz a nota.
Ainda é cedo para avaliar todos os danos. Em alguns casos, os produtores não conseguem nem chegar às áreas mais afetadas das propriedades. Em outras, só será possível saber como os vinhedos vão se comportar, se continuarão produzindo, e de que forma, daqui a alguns meses. “Vinhedos de mais de 10, 20 anos foram severamente prejudicados, alguns totalmente destruídos”, relata a jornalista Lucia Porto, que está acompanhando a situação desde o início e reportando a tragédia na plataforma Brasil de Vinhos. “Depois da limpeza, não virá apenas o replantio, mas sim a reconstrução de muitas propriedades”.
Mesmo quem não teve os vinhedos afetados também foi prejudicado de outras formas, principalmente porque deslizamentos e enchentes fecharam vias de escoamento da produção. Há um desafio logístico em levar os vinhos para os consumidores. Embora menos afetada que outras regiões do Estado, a Serra Gaúcha ficou isolada. Portanto, quem comprar agora precisa ter paciência. As encomendas vão demorar, mas vão chegar.
E quem deseja apoiar os produtores deve fazer justamente isso: comprar os vinhos brasileiros, de preferência direto nos sites das vinícolas. A Valparaíso, por exemplo, fez uma campanha para doar 30% de todo o valor arrecadado em vendas até sexta, 10, para campanhas de ajuda aos afetados na região do Vale do Caí. “Eu vou pessoalmente comprar e entregar os itens que conseguirmos com essa campanha. Não sei quando vou conseguir entregar os vinhos, porque ainda precisamos limpar a cantina e ver se algo foi perdido, mas a prioridade agora é ajudar as pessoas”, diz Naiana Argenta. Há outras que também precisam de apoio, e as compras feitas agora vão ajudar os produtores a se reerguer.