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Thomas Traumann

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Thomas Traumann é jornalista e consultor de risco político. Foi ministro de Comunicação Social e autor dos livros 'O Pior Emprego do Mundo' (sobre ministros da Fazenda) e 'Biografia do Abismo' (sobre polarização política, em parceria com Felipe Nunes)
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Pazuello é um bode expiatório

Eventual punição a general por participar de comício esconde omissão do Alto Comando no governo Bolsonaro

Por Thomas Traumann Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 31 Maio 2021, 11h35 - Publicado em 26 Maio 2021, 15h16
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  • O Exército brasileiro abriu uma apuração disciplinar sobre a participação do general e ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello no comício com milhares de motociclistas promovido por Jair Bolsonaro no domingo, no Rio de Janeiro. É um procedimento formal uma vez que, como general da ativa, Pazuello está proibido de participar de atos políticos. Para dois ex-presidentes do Superior Tribunal Militar (STM) houve evidente quebra de disciplina.

    “(O general Pazuello) colocou em xeque a disciplina do Exército”, afirmou à BBC a ministra do STM Maria Elizabeth Rocha. “É evidente que (os militares) estão subordinados ao presidente da República como chefe supremo. Mas ele é o chefe supremo das Forças Armadas sob o ponto de vista funcional, operacional, de defesa da Pátria, e só. A questão política tem que ficar apartada desse discurso”, disse a ministra, primeira mulher a presidir o STM.

    “Se você aceitar isso acabou a disciplina nas Forças Armadas porque o tenente, o sargento e o cabo têm sido punido dentro da lei – e são muitos. Não pode ser diferente com o general”, disse ao Estadão, outro ex-presidente do STM, tenente-brigadeiro Sérgio Xavier Ferolla.  “Muito dos generais que hoje criticam o governo, estiveram com o governo. Claro que eles fizeram bem em sair, mas é muito sério o que se passou. Comparo o presidente ao Dom Quixote, pois ele transforma cada general que está ao lado dele em Sancho Pança”.

    Mas se juridicamente, a sanção a Pazuello é simples, o tempo da política é outro. Na segunda-feira, ao saber pelos jornalistas que o Ministério da Defesa preparava uma nota oficial informando sobre a abertura de inquérito para apurar a ação de Pazuello, o presidente Jair Bolsonaro vetou a divulgação. Pazuello é de uma fidelidade canina ao presidente.  Na semana passada, em depoimento à CPI da Covid, ele assumiu como suas as decisões por negligenciar a compra de vacinas, tirando a possibilidade de os senadores investigarem o presidente.

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    Pazuello cometeu uma indisciplina, não um crime, e por isso não será julgado pelo Supremo Tribunal Militar. Sua sanção deve ser assinada pelo comandante do Exército e muitos generais, da ativa e da reserva, tentam convencer Pazuello a pedir baixa e evitar o vexame. Pazuello resiste, acreditando entre outras coisas que só não recebeu ordem de prisão dos senadores CPI porque ainda é um general da ativa. Mas esta é uma questão menor.

    A questão maior é: o que fez Pazuello sair de casa no domingo, pegar sua moto e participar de um ato bolsonarista sabendo muito bem que está infringindo as regras? A resposta é a conivência dos atuais generais do Alto Comando com o governo do ex-capitão Jair Bolsonaro.

    Desde abril de 2018, quando o então comandante do Exército, general Eduardo Villas-Bôas, postou o tuíte ameaçando o Supremo Tribunal Federal a impedir a candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva, o Exército voltou a ser um ator político. O texto do tuíte, como Villas-Bôas contou posteriormente, circulou no Alto Comando. Com Bolsonaro eleito, a sinergia entre ambos ficou mais evidente.

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    Sob Bolsonaro, o Congresso aprovou uma reforma das pensões militares que incluiu um aumento nos gastos, e não um corte como aconteceu com os civis. Em dois anos, foram criadas três estatais militares e mais de 7 mil oficiais da ativa e da reserva foram nomeados para cargos com gratificação. O governo Bolsonaro tem onze militares como ministros, mais até do que os governos dos presidentes generais de 1964-85.

    Em julho de 2019, o Alto Comandou permitiu que o general Luiz Eduardo Ramos aceitasse o posto de ministro da Secretaria Geral estando na ativa, um passe-livre para a politização dos quartéis. Ainda como general, Ramos não apenas assistiu de perto as manifestações antidemocráticas de Bolsonaro contra o Supremo Tribunal Federal, como convenceu o Alto Comando a autorizar que um segundo general da ativa, Eduardo Pazuello, também virasse ministro. Posteriormente, Ramos ainda cedeu às pressões e foi para a reserva, mas Pazuello nunca foi admoestado a pedir baixa quando ocupava cargo de agente público do governo. O Comando do Exército abriu a brecha para a politização dos quartéis que agora tenta suprimir.

    Duas semanas atrás, o ministro da Defesa, general da reserva Braga Neto, chefe dos comandantes das três Forças, participou e um comício de Bolsonaro, este em Brasília para produtores rurais. Chamado por Bolsonaro, Braga Neto discursou por menos de um minuto: “O agro é a força desse país. As Forças Armadas estão [prontas] para proteger os senhores, para que possam produzir com tranquilidade. A liberdade é o nosso bem maior e fundamental”. O que fazia um general num ato escancaradamente eleitoral como aquele? Nada justifica a não ser a certeza de não existe mais fronteira entre as forças militares reguladas pela Constituição e o “meu Exército” dos discursos do presidente.

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    Eventualmente, Pazuello será punido e a versão oficial será que as Forças Armadas traçaram uma linha intransponível para impedir a transformação dos quartéis em comitês da reeleição de Bolsonaro. Tolice. Pazuello é um bode expiatório. Foram os próprios generais que chocaram os ovos da serpente.

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