A versão de que a saída do ministro Sergio Moro do governo iria apressar um processo de impeachment do presidente Jair Bolsonaro não durou um fim de semana. Hoje, em sua primeira entrevista pós-queda de Moro, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, única pessoa responsável por aceitar ou recusar os processos de impeachment, foi rápido ao tirar da Câmara o papel de investigadora das denúncias de interferência presidencial na Polícia Federal.
Disse Maia: “Acho que todos esses processos (impeachment e CPIs) precisam ser pensados com muito cuidado. Devemos ter paciência e equilíbrio e não ter açodamento. O doutor Aras (se referindo ao procurador-geral Augusto Aras) abriu uma investigação. Certamente vai chegar a um resultado. Certamente, conduzida pelo ministro Celso de Mello (do STF), a investigação terá resultados”. Ou seja, a Câmara não irá reverberar e manter as denúncias de Moro contra o presidente em destaque, a não ser que as investigações da PGR tragam novos fatos. Diante do que se sabe sobre a boa vontade da PGR com o presidente, essa crise política está enterrada.
Mas por que a Câmara está renunciando à oportunidade de ir na jugular do presidente, no momento de maior fraqueza do governo? O motivo mais venal é a Porta da Esperança aberta pelos ministros da Casa Civil, general Braga Neto, e da Secretaria de Governo, general Luiz Ramos, de ofertar cargos no governo aos congressistas. É a volta do velho toma-lá-dá-cá que Bolsonaro tanto denunciava na campanha. Os partidos vão primeiro ouvir quais cargos o governo está oferecendo para depois se posicionarem. A pressa agora é do Planalto.
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Clique e AssineOutros são motivos históricos. Os impeachments de Fernando Collor e Dilma Rousseff ocorreram na coincidência de (1) escândalos, (2) recessão brutal, (3) manifestações de rua e (4) minoria presidencial no Congresso. O primeiro ponto está dado, o segundo é questão de tempo, o terceiro será impossível em tempos de pandemia e o último Bolsonaro pode evitar se obtiver a adesão do Centrão.
Há, porém, um quinto elemento. Nos dois processos exitosos de impeachment, tanto Itamar Franco quanto Michel Temer eram políticos profissionais, haviam passado décadas no Congresso e sabiam tudo de acordos políticos. O vice de Bolsonaro é o general Hamilton Mourão, que duas vezes foi punido por discursos contra presidentes civis e políticos em geral.
Em 2015, quando era Comandante Militar do Sul, ele defendeu o impeachment de Dilma alegando que “a vantagem da mudança seria o descarte da incompetência, má gestão e corrupção”. Ele disse ainda que “a maioria dos políticos de hoje parecem privados de atributos intelectuais próprios e de ideologias, enquanto dominam a técnica de apresentar grandes ilusões”.
Em 2017, Mourão foi para a reserva depois de declarar que Temer governava “aos trancos e barrancos buscando se equilibrar e mediante o balcão de negócios chegar ao final de seu mandato”. Antes, o general havia defendido uma intervenção militar nos seguintes termos: “Ou as instituições solucionam o problema político, pela ação do Judiciário, retirando da vida pública esses elementos envolvidos em todos os ilícitos, ou então nós (as Forças Armadas) teremos que impor isso”.
Só depois de eleito é que Mourão passou a transparecer um militar mais ponderado e menos ideológico que Bolsonaro.
Entre negociar com um Bolsonaro fraco e um Mourão imprevisível, os deputados preferem o primeiro. Mourão é o seguro-impeachment de Bolsonaro.