Nenhum economista se preparou tanto para comandar a economia do Brasil quanto Paulo Guedes. Recém-doutor pela prestigiada Universidade de Chicago, Guedes voltou ao País nos anos 80 e conseguiu se desentender com as panelas das escolas de economia da PUC e da FGV. Ganhou dinheiro, perdeu dinheiro, abriu bancos e uma escola de negócios, mas nunca superou o desprezo por não ter sido chamado por governo algum para dar seus conselhos. Por anos, Guedes guardou os ressentimentos em barris de carvalho para finalmente achar um candidato que lhe desse autonomia total. Conseguiu tudo isso e um pouco mais com Jair Bolsonaro. E quando aparece a maior crise do governo, tudo o que Guedes diz não faz mais sentido.
Em março, quando a Organização Mundial da Saúde declarou o estado de pandemia pelo coronavírus, Guedes ainda insistia que era o momento de aprovar reformas e que os gastos extras com a doença tomariam “uns R$ 5 bilhões”. Agora, pelas contas do próprio Guedes o pacote já está em R$ 1 trilhão, mas o ministro corre o risco entrar na história como o sujeito que listou o fim do monopólio estatal na impressão de papel moeda como uma das medidas prioritárias para combater a pandemia.
Nesta quarta-feira, 22, o jornal O Globo noticia que o governo prepara um Plano Marshall para reativar a economia pós-pandemia. O Plano, ao que se indica, é uma reedição do PAC dos governos Lula e Dilma, uma ação coordenada do Estado para concluir obras e planejar infraestrutura. É tudo o que Guedes sempre desprezou. O plano está com o general Braga Neto, na Casa Civil, e Guedes sequer foi consultado. Noutra ponta, o governo negocia a recriação do Ministério do Trabalho para dar cargos ao PTB, tirando um naco do ministério de Guedes, novamente sem que o ministro seja ouvido.
Isolado no governo, Guedes perdeu interlocução no Congresso. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, não fala mais com Guedes. Eles formaram uma parceria até o início do ano, mas hoje o contato é feito através do secretário do Tesouro, Mansueto Almeida. Guedes ainda rompeu com todos os governadores ao atrasar a votação da ajuda federal dos Estados. Depois de passar uma campanha inteira falando em “menos Brasília e mais Brasil”, o ministro quer centralizar os recursos que serão passados aos Estados, atrasando a ajuda necessária para manter hospitais públicos que atendem os pacientes de coronavírus.
Depois de desaparecer por duas semanas no início da crise por medo de ser contaminado pelo vírus, Guedes se tornou um ministro fragilizado. Parou de dar entrevistas e só fala através de lives para bancos de investimentos, como se não se fosse sua obrigação prestar esclarecimentos aos distintos contribuintes que pagam seu salário. Aliás, as palestras de Guedes ao mercado financeiro foram dispersivas e autoelogiosas, contrariando a antiga capacidade do ministro de ser um palestrante focado e racional.
Guedes precisa se adaptar ao novo momento e precisa aprender rápido. Se não pela sua biografia, já manchada nessas últimas semanas, pelo fato de que ele ainda comanda a economia de um País que enfrentará uma recessão global. Nos próximos meses, milhões de pessoas devem perder seus empregos e milhares de empresas devem fechar. O ministro que se preparou por anos para transformar a economia, não pode se encolher quando a economia precisa de comando.